24H Le Mans em setembro: O que pode mudar…

Por a 9 Setembro 2020 10:01

Desde 1968 que as 24 Horas de Le Mans não se disputavam no mês de Setembro. Ao contrário do que aparentemente possa parecer, correr em Setembro, em vez de Junho, traz uma série de novas incógnitas para a equação da corrida rainha de endurance do automobilismo mundial.

Só o facto da prova se correr três meses depois do primeiro solstício de verão, quer dizer que iremos ter este ano mais duas horas e meia de noite e, obviamente, são esperadas temperaturas mais baixas do que é habitual. Aliás, espera-se que esta seja a edição mais rápida de sempre da prova, visto que as temperaturas mais baixas vão ter um impacto directo no tempo por volta. Phil Hanson, o companheiro de equipa de Filipe Albuquerque no Oreca 07 Gibson LMP2 nº22 da United Autosport, vê com alguma expectativa o facto de “este ano termos uma noite mais longa” e porque o efeito que isso terá no pelotão de 60 viaturas “é por agora uma incógnita”. Interroga-se o piloto inglês: “Será que os pilotos amadores vão sofrer mais? Será que irá causar mais confusão para os LMPs ultrapassarem?”.

A verdade é que o factor temperatura sempre teve influência nas 24 Horas de Le Mans. Nas ediçõesde 1939, 1949 (a primeira pós-Guerra) e 1975, o termómetro chegou aos 27°C, enquanto que em 1979 a temperatura atingiu os 32°C na tarde de sábado. Dentro dos cockpit, as temperaturas dobravam ou triplicavam. Em 2005, ao volante de um Aston Martin DBR9 GT1,David Brabham viu a bandeira de xadrez completamente desidratado e com queimaduras nos pés causados pelos pedais que ferviam. Como resposta a este incidente, no ano seguinte, o ACO recomendou a instalação de sistemas de ventilação ou ar-condicionado, para os tornar obrigatórios em 2007. Hoje, a regulamentação técnica obriga a que a temperatura ambiente dentro dos carros seja 32ºC caso a temperatura ambiente é igual ou menor que 25ºC. Acima dos 25ºC, existe a obrigatoriedade para que estes sistemas mantenham o cubículo onde está o piloto a uma temperatura inferior ou igual à temperatura ambiente mais 7ºC. Todos os carros, independente da classe, estão equipados com sensores de temperatura ao nível da cabeça do piloto para evitar incidentes.

Este ano, um cenário de sobreaquecimento no cockpit é bastante imprevisível, como explicou Kevin Estre, piloto da Porsche GT, num “live chat” organizado pelo ASO na rede social Instagram: “As temperaturas serão mais baixas e até há a hipótese de chuva. Haverá mais noite também. Esperamos que não esteja muito frio à noite, para mantermos os pneus nas temperaturas certas. Se descer a baixo dos 10ºC, será difícil. É um desafio e teremos que encontrar as soluções correctas para sermos rápidos”.

No campo dos homens dos LMP1, a mudança de data não foi vista negativamente, até porque não há engenheiro ou piloto que não queira andar mais depressa. Segundo Pascal Vasselon, o responsável técnico da Toyota Gazoo Racing Europe, o “aspecto positivo das temperaturas mais baixas em Setembro é que motor deve funcionar mais eficientemente com a entrada de ar mais fresco”. Contudo, o técnico francês da marca favorita à vitória final levanta também outras questões, pois “há factores desconhecidos, como a janela de funcionamento dos pneus, que é sempre diferente, especialmente à noite, com as longas rectas de Le Mans. As 24 Horas também serão diferentes este ano porque não teremos o Test Day (essencial para trabalhar nas afinações dos carros)”.

Quando as temperaturas da pista são mais baixas, há uma tendência geral para usar especificações de pneus mais moles. Na teoria, “com temperaturas mais baixas existe um maior potencial para que a performance máxima dos pneus com paragens nas boxes mais curtas e em menor número”, afirma Ben Crawley, o responsável pela Goodyear, a marca que equipará cinco viaturas da categoria LMP2 num universo de 55 carros calçados pela Michelin. Como os LMP2 este ano são mais eficientes em termos aerodinâmicos e de motor, temos assistido a tempo por volta mais baixos. Tanto os técnicos da marca norte-americana, como os da rival francesa esperam conseguir que os seus compostos tenham um comportamento consistente desde o momento que os carros saem para a pista cheios de gasolina até à paragem nas boxes em que regressarem com o tanque vazio. Mas nem a temperatura é o factor que preocupa mais os engenheiros dos pneus, mas sim o estado do asfalto do Circuit de la Sarthe que “poderá ser determinante” na escolha do composto a utilizar e a sua respectiva maximização.

Os fornecedores de motores não esperam um grande problema com temperaturas mais moderadas a noroeste do rio Sarthe, até porque estas unidades de competição foram construídas para durar 5,500 quilómetros em ritmo de corrida e foram testadas em temperaturas extremas. “Do nosso ponto de vista, a data de Setembro não terá um grande impacto. As temperaturas mais amenas terão talvez efeito nos tempos por volta, mas não terão qualquer impacto nos motores. Talvez haja mais vácuo, e tenhamos que correr com um refringente e temperaturas do óleo diferentes, mas nada mais que isso”, explica John Manchester, o Director de Operações da Gibson Technology, a empresa que disponibiliza todos motores Gibson GK428 da grelha de partida da classe LMP2 e ainda os blocos que motorizam os dois Rebellion R-13 LMP1.

A Total é a fornecedora exclusiva de combustíveis da prova. Quando a marca francesa enche os tanques por baixo do pitlane, tira sempre uma amostra e vai testando, para comparar, ao longo da semana e perceber se há ou não variações. O facto da “clássica” ser mais tarde no ano, permite que haja menos variações de temperatura entre o dia e a noite, o que tornará todo o processo muito mais simples, reduzindo as margens para variações. Fora isso, “o comportamento e a condição da gasolina é sempre a mesma, estejam 0ºC ou 40ºC”, Diz Romain Aubry, o responsável técnico do automobilismo da Total. “Alguns graus de diferença na temperaturas de Junho ou Setembro não terá um impacto na performance”.

Numa 88ª edição da prova marcada em antemão pelas restrições causadas pela pandemia COVID-19 e pela total ausência de público nas bancadas, pequenos factores como estes supracitados podem apimentar uma corrida que a maioria de nós terá que assistir a partir do sofá de casa e cuja competitividade à partida, no que à luta pela vitória à geral diz respeito,é bastante questionável.

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