WEC: A nuvem cinzenta que paira sobre os hipercarros
Por Sérgio Fonseca
FOTOS Sean Bull Design (concepts)
A FIA aprovou os princípios gerais da Convergência entre o WEC e o IMSA, que começarão a ser aplicados a partir de 2021, e com isso as marcas continuam indecisas entre optar pela regulamentação LMH (hipercarros) do Automobile Club L’Ouest (ACO) ou da LMDh (Daytona Prototype 2.0) da IMSA.
Após dois anos de discussões e troca de argumentos, o sucesso ou não da nova regulamentação da classe rainha do Campeonato do Mundo FIA de Endurance (WEC) poderá muito bem depender de uma só decisão da Peugeot. A marca do leão, que só prevê regressar aos grandes palcos em 2022, isto se a recessão que se avizinha não causar estragos antes, ainda não decidiu se o seu carro será construído com base na regulamentação LMH (hipercarros) do Automobile Club L’Ouest (ACO) ou na LMDh (Daytona Prototype 2.0) da IMSA.
As delegações de técnicos do ACO e da IMSA iriam reunir-se durante a semana que antecedia as 12 Horas de Sebring (IMSA) e as 1000 milhas de Sebring (WEC) para discutir a fórmula de equipar os LMH e LMDh. Depois, seria uma dada uma conferência de imprensa para apresentar os resultados. Como o evento foi adiado, meio mundo ficou às escuras e em “stand-by”.
O adiamento por tempo indeterminado do programa da Aston Martin Valkyrie foi um balde de água fria para o ACO. A marca britânica alegou que os preços muito mais baixos dos LMDh, a introduzir em 2022, comparativamente com os dos LMH, tornaram o seu projecto inicial comercialmente inviável. Obviamente que os responsáveis da marca britânica, que agora tem novos donos, foram apupados pelos fãs. Não era para menos, a desilusão foi tremenda, acrescida pelo facto de Lance Stroll e seus pares decidirem apostar forte na Fórmula 1. Contudo, a Aston Martin Racing tem razão quando diz que o seu conceito partia de um hipercarro, que nunca custaria menos de um milhão de euros, quando os futuros LMDh não custarão incrivelmente mais que um LMP2, cujo “cost-cap” é actualmente de 483,000 euros.
A pandemia o novo coronavírus (COVID-19) também provocou o adiamento das 24 Horas de Le Mans de Junho para o mês de Setembro, uma calamidade que não acontecia desde o “Maio de 1968”, quando as sucessivas greves gerais paralisaram França. Esta decisão não só terá impacto no calendário da temporada 2019/2020, como no calendário provas de 2020/2021 e na estreia do novo regulamento que contemplará os novos hipercarros.
Ora bem, como ninguém acredita que haja quem apareça para o arranque da temporada de 2019/2020 com um LMP1, pois a Rebellion Racing está de malas feitas e a Ginetta terá certamente outras prioridades quando a vida voltar à normalidade, contam-se apenas os dois hipercarros baseados no GR Super Sports Concept que a Toyota Motorsport GmbH prometeu estarem à partida na primeira prova, seja esta quando for. Por seu lado, o novo hipercarro Scuderia Cameron Glickenhaus nunca estará pronto antes das 6 Horas de Kyalami, isto é, em Fevereiro de 2020. O projecto da ByKolles, se é que já passou do papel, é um mistério que ninguém se arrisca a especular.
Pascal Vasselon, o influente director técnico da Toyota, andava a pedir para que a nova temporada não começasse antes de Setembro. E por começar, o director técnico da Toyota não se referia às corridas, mas sim ao Prólogo, essencial para testar todos os sistemas da FIA e o próprio equipamento das equipas. Com as 24 Horas de Le Mans da temporada de 2018/2019 marcadas para Setembro deste ano, Silverstone não será de certeza nesse mês. Um alívio para Colónia.
A marca nipónica tem estado a trabalhar no limite para ter o seu protótipo pronto a testar no início de Julho, depois de vários atrasos provocados pelas alterações do próprio regulamento. Em meados de Janeiro, os homens da Toyota ainda estavam a desenhar a monocoque e a suspensão, áreas que não sofreram muitas alterações desde o primeiro rascunho apresentado no Conselho Mundial da FIA de Dezembro de 2018. Várias outras áreas têm ganho forma nas últimas semanas, mas a Toyota está a ter alguns problemas com os fornecedores italianos, como a Brembo e a Magnetti Marelli, assim como alguns provedores de fibra de carbono, que encerraram provisoriamente devido ao surto.
Mas se eram vários os construtores que se sentaram à mesa parar criar esta fórmula e mostraram interesse na categoria, ao ponto de o regulamento ter sofrido uma pesada alteração em Fevereiro de 2019, por que motivo a Toyota está sozinha? “Os regulamentos dos LMH não são muito complexos, nem muito caros, em termos absolutos. A LMH é a única opção disponível para um construtor que queira desenvolver e provas uma tecnologia nas corridas de endurance. Realmente depende que tipo de imagem uma marca quer construir”, explicou Vasselon ao AutoSport.
Com apenas quatro construtores autorizados a construir LMDh – Dallara, Onroak Automotive (Ligier), Oreca e Riley/Multimatic – quem quiser usar o WEC e as 24 Horas de Le Mans como uma montra tecnológica, ou construir o seu próprio carro sem ter de recorrer a uma base pré-definido de terceiros, terá mesmo de seguir a via dos LMH.
Enquanto a Peugeot pensa qual o melhor caminho a seguir, Vasselon espera “que não demore muito que outros construtores compreendam que a LMH permite mostrar uma tecnologia de uma forma muito acessível”. Porém, depois de muito optimismo, ninguém espera que a próxima temporada do WEC será muito melhor, em números na categoria principal do campeonato, que a anterior. “De certeza que não estamos num momento alto, mas as corridas de resistência já passaram por tempo difíceis com poucos participantes, mas até agora nunca morreram…”
Se a Peugeot optar pela avenida americana, então há sérias dúvidas sobre a viabilidade deste conceito em que o ACO tem colocado tanta energia e esforço. Nesta altura em que todo o planeta vive dias de incertezas e indefinição, diz Jim Glickenhaus e muito bem, “ninguém tem uma ideia de como será o futuro até isto passar…”