Aeroscreen: a maior sauna do automobilismo
Dois anos depois da Fórmula 1, a IndyCar finalmente introduziu este ano uma proteção para a cabeça dos pilotos. Se por agora, o ‘aeroscreen’, uma criação da Red Bull Advanced Technologies e inicialmente pensado para a Fórmula 1, tem sido bem recebido, na prova de circuito da Indianapolis Motor Speedway, os pilotos puderam experimentar a sauna que é conduzir um fórmula com um cockpit semi-aberto.
Não consta que alguém tenha sido tratado por desidratação no final das duas horas de corrida e oitenta voltas ao circuito de ‘estrada’ (não a oval) da pista mais famosa dos EUA. Contudo, dentro dos cockpits, as temperaturas atingiram os 120 graus centígrados e quase todos os pilotos consideraram que esta foi das provas mais difíceis das suas carreiras. ‘Brutal’ foi uma palavra bastante ouvida no paddock. “Foi a corrida mais quente da minha carreira”, disse Scott Dixon, o vencedor, numa vídeo conferência realizada através do Zoom. Devido às velocidades mais baixas e à maior cadência de travagem, comparando ao que acontece nas ovais, não há muito ar a circular no cockpit.
No final da corrida, Simon Pagenaud, o terceiro classificado, disse aos jornalistas que a sua equipa, o Team Penske, necessitava urgentemente de encontrar uma solução para ventilar o seu carro. “Estava extremamente quente e estou exausto. O ar não circula bem no cockpit. É um cockpit tão pequeno que dá a sensação que o ar não sai. Não há vento. Podia conduzir com a tua viseira aberta só para receberes algum ar”, explicou o vencedor da Indy 500 do ano passado que não sentiu o mesmo problema na primeira corrida na oval do Texas e nos testes de pré-temporada.
Com o sistema Halo, que a FIA obriga agora em todas as disciplinas de monolugares, este não seria um problema. Porém, esta foi uma solução rejeitada em terras do Tio Sam pelo receio que a barra superior do Halo prejudicasse a visibilidade nas ovais e não protegesse suficientemente os pilotos quando atingidos por destroços. Por outro lado, não seria fácil a Dallara incorporar um sistema nos actuais chassis – lançados no campeonato em 2012 e que só serão substituídos quando chegarem os sistemas híbridos talvez em 2022 – e certamente obrigaria à produção de novos chassis, o que acarretaria um custo pesado e muito pouco bem-vindo para as equipas.
Como o “aeroscreen” foi desenhado inicialmente para a Fórmula 1, e testado pela primeira vez publicamente por Daniel Ricciardo nos treinos-livres de Sochi em 2016, o conceito tem sofrido bastantes desenvolvimentos nesta sua adaptação ao campeonato norte-americano de monolugares. O sistema tem passado todos os testes, desde a resistência dos materiais, como da inclusão no carro sem prejudicar a extracção do piloto. Esta questão das elevadas temperaturas dentro do cockpit era esperada, mas a primeira verdadeira experiência a doer ficou a porta aberta para mais evoluções.
A água!
Uma das formas de manter o corpo dos pilotos hidratado durante as corridas é através da bebida. Já não se utiliza o termo de água por baixo do banco do piloto como em outros tempos, mas a base continua a mesma, apenas o conceito tem sido aperfeiçoado em mais de cem anos de história do automobilismo. “Acho que precisamos de uma garrafa maior. Tal como aquelas que tínhamos no passado”, sugeriu Pagenaud que ao fim de trinta e duas voltas, das oitenta que teve de completar, viu o seu depósito de água chegar ao fim.
Contudo, uma garrafa só por si maior, pode não ser a solução para este problema, como relembrou e bem Graham Rahal. “As garrafas de água estão nos ‘sidepods’, com todo os escapes. A água é mais quente que o meu café”, agudizou o segundo classificado na prova. A solução poderá passar por uma melhor preparação antes das corridas. Colin Herta foi outro dos pilotos que sofreu a bom sofrer, por ter ficado sem água a vinte voltas do fim, e explica como conseguiu chegar ao fim: “Eu hidratei-me bastante no início da corrida e penso que foi isso que me salvou. A minha cabeça começou a rodopiar e estive quase a colapsar quando saí do carro. Sem água, aquelas últimas vinte voltas foram um enorme esforço para mim”.
A IndyCar tinha inicialmente pensado em manter a boca do piloto fresca, mas nas últimas versões do “aeroscreen”, isso mudou ligeiramente. O resultado dos testes ditou que o ideal seria ter um sistema que refrescasse o capacete, o que agora é comum nos sport-protótipos: um tubo passa pela traseira da tela do “aeroscreen” e conecta com o capacete do piloto, mantendo refrescada toda a cabeça. “Era algo definitivamente necessário para as pistas citadinas e convencionais, portanto passou a ser obrigatório”, justificou Toni Belli, o responsável pela aerodinâmica do campeonato.
Esta solução permite que as entradas de ar façam um trabalho diferente. As primeiras versões da “aeroscreen” apresentavam entradas de ar que simplesmente deixavam circular o ar no cockpit, mas nas últimas versões, as condutas de ar do nariz foram estendidas pelo painel de instrumentos até mesmo atrás do volante, o que dá menos hipóteses ao ar se dispersar, permitindo às equipas refrescar as pernas ou o torso dos pilotos. Para os dias mais quentes, em circuitos citadinos ou convencionais, visto que nas ovais não há este problema, dois tubos podem ser aplicados nas entradas de ar do nariz direccionados para as pernas dos pilotos.
A IndyCar deverá ser uma das disciplinas do automobilismo mais exigente fisicamente, dado que os monologares não têm direcção assistida. O calor será uma dificuldade extra, e agora que chegamos ao pico do verão será um factor cada vez mais a ter em conta. enquanto não existir uma solução cem por cento eficiente, como diz Herta, “temos que nos adaptar e vamo-nos adaptar a isto”.
120° Celsius?!? Impossível alguém sobreviver a essa temperatura quanto mais conduzir…
Devem ser graus Fahrenheit, que é o que os americanos usam.