Audi diz adeus ao DTM: E agora, o que se segue? WRC?
A Audi anunciou a sua saída do DTM no final de 2020, deixando a competição em risco de sobrevivência. Num contexto em que se sabe que a marca alemã procura outros caminhos, porque não o WRC, onde deixou uma marca inigualável.
A Audi anunciou uma saída abrupta do DTM após a época de 2020, naquele que foi o seu ‘porto seguro’ e onde foi muito bem sucedida, durante muito tempo, o que deixará a BMW sozinha numa competição que ficou de repente “às portas da morte”. Oficialmente, a razão da saída da Audi do DTM é o desejo de se concentrar no projeto da Fórmula E, mas a maioria dos observadores apontam também para o facto de que o Grupo Volkswagen precisa de melhorar a sua imagem depois do enorme escândalo do “dieselgate”. Depois de se retirar dos ralis, o Grupo Volkswagen foi fechando sucessivamente os seus programas desportivos em que competiam automóveis com motorização convencional: A Audi despediu-se do TCR e do rallycross, enquanto a Skoda, apesar das grandes tradições e do sucesso a longo prazo, retirou a sua equipa de fábrica dos ralis.
Uma saída do DTM, uma competição que a Audi ajudou a moldar, é uma decisão muito significativa, pois do mesmo modo que a Audi ajudou em muito a fazer crescer o DTM, o crescimento da competição também devolveu tudo “com juros” à Audi, pois como se sabe o desporto motorizado tem uma forte componente tecnológica e emocional nos adeptos das corridas e ralis.
Para a Audi, a Fórmula E é um passo lógico, na sua tentativa de se transformar num construtor desportivo de eletromobilidade sustentável, mas é natural que o Grupo em geral e a Audi em particular procurem explorar outras competições no futuro.
O que se segue?
Assim que foi conhecido o anúncio da saída do DTM, depressa começaram o rumores quanto a um possível regresso ao WRC, onde a marca já não está a nível oficial há 33 anos, mas para já não passa mesmo de ‘wishful thinking’, pois sendo provável que a marca se ligue a outras competições num futuro próximo, os ralis não são nem mais nem menos prováveis que quaisquer outras. Por muitos argumentos a favor que se possam arranjar. A saída do DTM compreende-se porque num grupo que anunciou há muito só competir em séries ‘eletrificadas’, e com as suas previsões a apontar para 40% de vendas até 2025 de modelos elétricos ou híbridos, não fazia sentido nenhum permanecer num campeonato com motores de combustão. Na Ásia e nos EUA o desporto automóvel é mais visto como um espetáculo que se oferece às pessoas e menos como montra tecnológica e de Marketing como sucede na Europa (embora nos EUA também se olhe para essa questão, claro), por isso a saída, não sendo esperada num momento destes, em que se vive uma crise muito grande devido à pandemia, compreende-se.
Neste contexto, podíamos dar aqui como exemplo várias razões para a Audi ir para o WRC, competição que como se sabe será híbrida em 2022.
Não resta a mais pequena dúvida que a Audi deixou um legado muito forte nos ralis e hoje em dia não há adepto que não conheça a importância do facto da Audi ter sido a pioneira das quatro rodas motrizes nos ralis, tendo deixado uma marca muito forte na competição, com dois títulos de Construtores em 1982 e 1984, e dois de pilotos em 1983 e 1984. Não tanto pelos números, mas mais pela perceção que deixou nos adeptos, que ainda hoje sonham com o regresso da Audi ao WRC.
É verdade que a Audi está na Fórmula E desde o seu início em 2014, mas apesar do forte crescimento, o Mundial de Ralis continua a ser muito mais forte na ligação emocional aos adeptos. Ninguém compra um carro de estrada duma marca pela ligação emocional que passa a Fórmula E, mas sim pela tecnológica, enquanto nos ralis aplicam-se as duas. O mercado de carros híbridos e elétricos vai continuar a crescer, mas todos sabem que não será numa questão de poucos anos que a transição se dará, até porque não há condições para isso, e nesse contexto, as marcas vão ter que continuar a vender híbridos durante muitos anos e o WRC passará essa mensagem a partir de 2022. Um argumento a favor. Mas há mais.
Vai haver no WRC uma transição dos atuais World Rally Car para os Rally1, que já serão híbridos. Será uma nova era e para uma marca entrar, é a altura certa, começa quase tudo do zero e em maior pé de igualdade com os que já lá estão, Ford, Hyundai e Toyota.
Uma marca que entre leva sempre algum tempo até chegar a um nível de competitividade semelhante aos seus rivais, mas numa nova era, se tomar decisões a tempo, esse período esbate-se muito. Mais um argumento a favor.
A empresa alemã Compact Dynamics foi a escolhida para fornecer o kit híbrido ao WRC em 2022. Curiosamente, é uma subsidiária do Grupo Schaeffler, um gigante tecnológico que tem como parceiro no motorsport… a Audi. Neste caso, não podemos dizer que é um argumento a favor, mas é uma coincidência interessante.
Há muito know how
No seio do Grupo Volkswagen há experiência mais do que suficiente para criar uma equipa de ralis num curto espaço de tempo. Há muito know how na Volkswagen Motorsport, que dominou o WRC de 2013 a 2016 ganhando tudo o que havia para ganhar, despedindo-se da competiçã no final de 2016, criando depois o VW Polo GTI R5 que tem tido bom sucesso nos ralis.
A Skoda é outra marca do Grupo volkswagen muito ligada ao WRC e com grande história na modalidade, super-ganhadora nas categorias secundárias, com o Skoda Fabia R5 a ser, de longe o carro mais vitorioso entre os R5.
Know how de ralis não falta no grupo, por isso pode parecer lógico que a Audi pudesse rumar ao WRC paroveitando esse know how. Mas porquê a Audi, se existem a Volkswagen e a Skoda que tão bem representaram e estar a representar o Grupo nos ralis. Só porque sim, quando a Audi não quis saber dos ralis durante 33 anos? Aqui, o argumento nem é a favor, nem contra. Ao fim ao cabo podemos ter simplesmente… uma opção. Como se percebe, no Grupo VW não falta ligação aos ralis, por isso ‘meter’ lá ainda a Audi parece forçado quando se sabe que a marca criou também uma grande tradição nas pistas.
Há no entanto um ponto importante a favor dos ralis. É que a nova regulamentação prevê ‘silhuetas’. Ao contrário do que sucedeu até aqui em que o WRC se baseava num carro do segmento B dos subcompactos ou ‘supermini’, na próxima mudança de regras isso vai terminar, já que o WRC se vai abrir aos fabricantes de automóveis de maiores dimensões familiares do segmento C (4.5 metros de comprimento). E como? Com projetos ‘silhueta’ baseados no estilo dos carros de produção atuais, mas reduzidos às dimensões permitidas para os carros de ralis, que passam a poder utilizar um chassis tubular.
Isso vai permitir às marcas ‘comunicar’ o carro que lhes der mais ‘jeito’ ao invés se se cingirem a um modelo específico. E facilitará também muito a eventual decisão de construtores poderem rumar ao WRC. Já que só precisam da mecânica, o chassis pode ser tubular e a carroçaria a escolhida. Isto não é um argumento específico para a Audi mas sim para todas as marcas que possam olhar para o WRC.
Até a Porsche poderia meter um carro no Wrc, mas como bem sabemos, a Porsche está a olhar novamente para a endurance, pois a nova regulamentação está a gerar novo interesse numa disciplina que tem andado ‘tremida’ nos últimos anos.
Portanto, há argumentos favoráveis à ida da Audi para o WRC, mas também há contra. Como bem sabemos, a Audi Sport tem um enorme conjunto de bons carros para as pistas, o Audi RS3 LMS TCR, Audi R8 LMS GT4, Audi R8 LMS GT3, o novo Audi R8 LMS GT2. Modelos não faltam.
A saída do DTM mostra preocupação com o que pode ser a crise que aí vem, mas também pode ser uma mudança de paradigma.
O WRC precisa de novas marcas. No início do Séc. XXI o WRC chegou a ter sete marcas oficiais a correr ao mesmo tempo, a crise de 2008, levou a que ficassem apenas duas em 2009, foram quatro nos últimos anos, a Citroën, a marca mais vencedora da história dos ralis, saiu no fim de 2019, pelo que o WRC precisa de marcas. A Audi seria uma ‘bomba’ mediática, mas as administrações das marcas da indústria automóvel não são tão emotivas quanto os adeptos. São racionais.
O que não invalida que a Audi possa ir para os ralis, mas termino o texto da mesma maneira que o comecei. Para já acho que é simplesmente’ wishful thinking’.