WRC, Andreas Mikkelsen: a história de como tudo começou, do esqui aos ralis…
Andreas Mikkelsen voltou a ser Campeão do WRC2, numa altura em que luta para voltar ao pináculo do WRC, agora os Rally1. Numa longa entrevista ao WRC Backstories, com a Becs Williams, o norueguês ‘rebobinou’ todo o seu passado numa conversa longa que reproduzimos aqui em várias partes.
A carreira de Andreas Mikkelsen remonta a 2006 e incorpora alguns eventos e fases tão incríveis quanto diferentes. O piloto norueguês, atualmente, compete no WRC2 pela Toksport World Rally Team, no passado conduziu para as equipas de fábrica da Volkswagen, Citroën e Hyundai no Campeonato Mundial de Ralis, terminando em terceiro lugar na classificação dos pilotos em 2014, 2015 e 2016.
Venceu duas vezes o Intercontinental Rally Challenge, tendo terminado em primeiro lugar em 2011 e 2012. Em 2021, Mikkelsen tornou-se campeão de pilotos no WRC2 e no Campeonato Europeu de Ralis.
Becs Williams: O facto de teres guiado para vários fabricantes ao longo da tua carreira faz com que tenhas ainda mais histórias para contar, e ainda tens muita carreira pela frente. Mas todos os meus convidados que se juntam a mim no WRC Backstories têm que passar pelo pequeno teste no início, uma tentativa de vos conhecer um pouco melhor e quão bem, vocês se conhecem e se descreveriam quanto à sua personalidade? Em apenas três palavras…
Andreas Mikkelsen: “Acho que sou uma pessoa positiva. Eu sou um pensador positivo mesmo quando os outros apresentam problemas. Eu acho que sou bastante positivo e sim, mas para outros, sou mais difícil. Acho que sou bastante dedicado e direcionado ao meu objetivo. Não desisto facilmente. A minha carreira tem sido de muitos altos e baixos, mas ainda procuro o alvo. Eu diria que sou apaixonado pelos ralis…”
BW: Quase 20 anos de carreira nos ralis porque foi em 2006 que entraste em cena. Mas até aí, Andreas, enquanto crescias na Noruega, estavas na escola. Quando estavas na escola o automobilismo já fazia parte da tua esfera?
AM: Não, absolutamente não. Venho do lado oeste de Oslo, onde ninguém praticava automobilismo. Quero dizer, ou esquiava ou jogava golfe. Automobilismo não era nada que meus amigos fizessem ou o meu pai. O meu objetivo, quando menino, era tornar-me um esquiador. Então, eu passava todo o meu tempo depois da escola e desde os seis, sete anos tentando ser o melhor no esqui alpino e todos estavam realmente à procura disso e eu estava a ir bem no esqui, fazendo o campeonato. Tive três pódios e tudo parecia certo.
Mas tive problemas num joelho e não pude continuar no esqui, o que foi muito triste na época, mas foi isso que me fez pensar em correr noutro lado. Então, olhando para trás. Agora estou muito feliz por ter tido problemas nos joelhos, mas naquela altura foi um período bastante difícil para mim. Defini toda a minha vida de adolescente numa direção, fazia isso quase diariamente, semanalmente, por um período longo, para que isso fosse retirado. Foi um grande golpe num uma idade jovem. Comecei com uma bolsa de esqui,, numa escola nas montanhas da Noruega. Estava lá toda a gente nas aulas das sete oito da manhã até as 12h00 e eles esquiavam o resto do dia e eu não podia esquiar.
E ao lado desta escola havia um grande lago congelado onde se fazem pistas para carros de ralis no inverno…
Então, como não tinha nada para fazer, fui até lá. Juntei-me a alguns amigos, deslizando em carros normais, completamente normais. Desde um BMW com tração traseira até um Nissan, Almera, apenas coisas super básicas e simplesmente adorei. Foi muito divertido e depois de ir até lá, algumas semanas, acabei a ir para lá todos os dias, enquanto os outros iam esquiar, eu fui lá para guiar. Era só andar ao redor do lago de gelo. E só guiava há uma ou duas semanas. Então pensei, talvez eu pudesse ser bom neste desporto se eu tentasse um pouco mais. Então, sim, isso me fez, a partir daquele dia, focar apenas em correr…”
BW: Sim, posso imaginar que deves ter tido uma verdadeira ‘revelação’, e ainda por cima, quando o Petter Solberg se tornou campeão em 2003, tornou-se uma estrela na Noruega….
AM: “nessa altura, eu ou qualquer outro, a minha atenção aumentou muito quando ele se tornou campeão mundial. Então, eu tentei pela primeira vez em 2005….”
BW: Então conta-me sobre isso, sobre essa experiência. Como isso aconteceu? Que carro era?
AM: “era uma boa sensação estar ao volante de um radical. Já tinha guiado durante muitas semanas lá em cima no lago gelado, e coisas assim, e estava a progredir muito rapidamente. E tive muita sorte. Tive um pai que estava numa posição que me poderia ajudar no início, parte da minha carreira. Então acabamos por comprar um Mitsubishi Lancer de Grupo N, para que eu pudesse praticar mais como uma especificação adequada de um carro de ralis. Ao final de ano e meio, eu estava num carro de ralis. Foi inacreditável…”
BW: Como disseste o teu pai tinha algum dinheiro, compram um carro de ralis, notas quete estás a tornar bom naquilo, e depois de onde saiu o plano? Deve ter havido, certo? Ok, ele é muito bom, queremos pô-lo a correr para chegar ao WRC. Porquê o Reino Unido? Como acabaste no Norte de Gales? Isso é o que queremos saber…
AM: Estive no Norte de Gales. Sim. Nessa idade, quando se tem uns 15, 16, 17, 18 anos, aprendemos muito rápido. Por exemplo, se você tentar aprender qualquer coisa quando estiver nessa idade, em comparação com, digamos, uma pessoa de 30 anos, você usará metade do tempo para aprender, sem problemas. Porque não já que temos a oportunidade, por que não um carro de ralis. Posso aprender isso rapidamente antes de ficar com medo. Esse foi a razão por trás disso. Tentei aprender a andar depressa imediatamente. E como não podia guiar na Noruega naquela época porque era preciso ter 18 anos para pilotar em ralis e nós queríamos seguir em frente, então descobrimos que no Reino Unido podia fazê-lo com 17 anos. Então decidimos nos mudar para Rithon, eu tirei minha carta de condução. Eu estava a morar junto da equipa. Guiava pela Rams, Ford e a morar com o Rob Atkinson e foi um ótimo ano. Lembro-me de ter ido lá tirar a carta de condução para fazer o meu primeiro rali e foi uma grande pressão porque tudo o que queríamos fazer era terminar.
Acho que foram cinco eventos para que eu pudesse ter a licença do País de Gales. Tive que tirar a carta na primeira tentativa, consegui, mas foi muita pressão, porque vim para o Reino Unido, guiar do outro lado da estrada, no outro lado do carro, tirar a carta não foi fácil, e eram estradas bastante complexas. Estradas estranhas. Talvez especialmente na área onde estava. E acho que foi muita pressão. Mas eu podia guiar um carro de rali naquela altura, guiava bem, mas todas essas coisas do trânsito eram completamente novas para mim. E sim, não foi fácil vir para um novo país. Estou no lado oposto da estrada e tiro a carta de condução em apenas algumas semanas. Agora é história, mas olhando para trás foram horas loucas.
BW: É uma história incrível porque é uma história meio incomum. Não tiveste um início de carreira comum. Como foi para ti, um jovem, sair de casa e vir para o País de Gales naquele ano, não apenas guiar e aprender, mas também ainda estavas a crescer. Como foi isso para ti, mentalmente, os teus amigos ficaram na Noruega, como era a tua vida?
AM: “Estive lá por um longo período de tempo. Ainda tinha a minha escola na Noruega porque frequentei uma escola de atletas de ponta, e também foi muito importante eu terminar a escola de uma maneira boa. Estive fora o verão inteiro e, ocasionalmente, voltei para casa e, na época, tudo era novo, havia muito para aprender. Mas o tempo passou tão rápido. Na verdade, não senti muita falta de casa porque estava muito ocupado a descobrir tudo…”
BW: Fizeste muitos ralis naquele ano e com sucesso porque tiveste um grande número de vitórias no teu currículo. Como foi isso? Surpreendente para ti?
AM: “Quero dizer, quando entrámos no nosso primeiro rali em Quinton, sim, eu não tinha ideia de como poderia correr. Mas tudo bem, estávamos em um carro de ralis, e ganhamos com uma margem bastante grande, pelo que foi um período muito promissor e não muito tempo depois, fizemos uma parceria com o Marcus Gronholm com testes e então ele poderia ser uma espécie de mentor para mim. E então estávamos a fazer testes juntos.
Quando eu tinha 18 anos, eu já era rápido e percebi que em termos de velocidade, isso parecia muito, muito bom para mim, mas naquela época estava longe a ideia do WRC.
Além disso, não tínhamos coisas que pudessem ajudar-nos a aprender os troços como acontece agora. Nessa época era preciso passar muitos anos na diversidade das provas para aprender. Eu sabia que tinha velocidade desde muito cedo, mas a questão de aprender tudo o resto levava tempo, pelo menos naquela época…
BW: E depois como encontraste um co-piloto? Como foi? Sentar ao lado de alguém que basicamente te diz para onde ir? Como processaste isso?
AM: Eu e o Ola Floene começámos a viajar muito pela Noruega para praticar o fazer notas, apenas em estradas normais. Colocamos muito esforço nisso. Foi sempre difícil aprender antes de entrar no campeonato, foi um problema no começo, muito para aprender, mas com todo esse conhecimento a experiência ajudou-me a progredir muito rapidamente…”
BW: E quão influente dirias que foi Marcus Gronholm? Foi como um mentor, uma espécie de guia, dizia-te o que fazer?
AM: O Ole (Floene) tinha um grande palpite, então ele disse ao Marcus que era bom ver as diferenças de pilotagem entre Marcus e eu, e isso foi uma grande ajuda. Vê-lo conduzir, vimos uma direção, e acho que isso é crucial. É como um jovem piloto a crescer ter alguém que é capaz de ir mostrando o caminho. O tipo de conhecimento do Marcus, é muito bom ter essa experiência perto de ti e tive sorte tê-lo lá…
Esta é a primeira parte de uma longa entrevista com Andreas Mikkelsen, nos próximos dias as outras fases da sua carreira, para já, até aqui, foi interessante perceber como um jovem muda a agulha do esqui para os ralis por causa de uma lesão. O simples facto de ali perto haver um lago gelado onde se ia para lá fazer derrapagem artística foi crucial. O resto é história…