Uma viagem ao CER, o novo rali de asfalto que atravessa fronteiras na Europa Central.
Por Duarte Mesquita
Com a saída do Rali da Catalunha do calendário do WRC, esta nova prova disputada na Chéquia, Áustria e Alemanha completa o atual trio de provas de asfalto europeias a par do Monte-Carlo e da Croácia. Com o atrativo de podermos visitar 3 países diferentes e perspetivando o campeonato mundial mais disputado dos últimos anos, além do aliciante de ver os melhores do mundo ao vivo a puxarem pelos limites num rali disputado em asfalto no Outono, o CER seduziu este grupo de amigos para a compra dos bilhetes de avião ainda por altura do Monte-Carlo.
O CER ou Rali da Europa Central é um rali à antiga, com um itinerário longo, com a edição deste ano a iniciar-se numa quinta-feira pela hora do almoço em Praga (Chéquia) e o pódio final a ser celebrado ao início da tarde de domingo em Passau (Alemanha), a 220kms de distância. O nosso voo levou-nos até ao aeroporto de Memmingen, 115 km a oeste de Munique, o que nos mentalizava para uma longa ligação inicial até Klatovy (a 340kms), o prato escolhido para o primeiro aperitivo do fim-de-semana.
Pelas Autobahns alemãs o percurso até se faz bem, entre estórias de ralis passados e a antevisão sobre a ansiada luta Ogier VS Neuville, além das eternas comparações com Tanak, Rovanpera e Loeb sobre quem é o melhor dos melhores. A partir da fronteira checa, a autoestrada passa a “nacional”, fica mais sinuosa, mas em bom piso e começamos a vislumbrar vales e florestas encantados, atravessando vilas e aldeias com um toque “soviético” a fazer lembrar outras épocas.
Antes de nos dirigirmos para a especial noturna, tempo para fazermos o Check-In no Hotel de Klatovy, uma pequena cidade na região de Plzeň com pouco mais de 20.000 habitantes. Chegados à receção, o primeiro sinal que encontramos “que ia haver um rali por ali”: Juho Hanninen estava a fazer o Check-In para as duplas dos Toyota oficiais que iriam pernoitar precisamente ali, uma coincidência do acaso. O finlandês, atualmente inserido na estrutura da Toyota Gazoo Racing com vários cargos, sendo um deles o de coach dos jovens pilotos japoneses que competem no WRC-2, Yuki Yamamoto e Hikaru Kogure, acedeu a uma fotografia, simpático, e com quem ainda trocamos duas ou três impressões sobre o Rali de Portugal e sobre os tempos em que participou com Armindo Araújo no PWRC em 2007 e 2008.
Era hora agora de nos pormos a caminho da Zona-Espetáculo escolhida, com antecedência, na expectativa que houvesse uma enchente de público. Estávamos bem enganados. Depois de passarmos um duplo controlo onde tivemos de mostrar tanto os Rally-Pass como o Rally-Pass-Parking que nos permitia estacionar num parque mais próximo do troço, chegamos facilmente e com mais do que antecedência à Zona-espetáculo. Esta iria permitir-nos visualizar os carros por cerca de 30s, numa longa sinuosa reta que terminava numa esquerda artificialmente lenta pela colocação de uma chicane em feno e que dava depois lugar a uma outra reta, onde nos iria impressionar a capacidade de aceleração dos 0-100 dos atuais Rally1.
Pouca gente, quase todos checos, conversámos com alguns que trabalhavam na Skoda Motorsport e todos ficavam surpresos por saberem que tínhamos vindo de tão longe ver aquele rali. Com o cair da noite, a magia aparece: as luzes das calandras a aproximarem-se a uma velocidade vertiginosa, o incandescente dos discos de travões em brasa, a fusão de azuis com laranjas a saírem dos escapes, as sequências de flashes em cima da curva, um cocktail explosivo que fez esquecer o frio que por ali já se sentia.
Depois de ouvirmos já ao longe o primeiro dos “acidentes” de Yohan Rossel com o Citroen C3 Rally2, regressamos a Klatovy para jantar e ansiosos pelo ambiente que poderíamos encontrar no centro da cidade, onde ficava organizado o parque fechado. Poucos eram os restaurantes a trabalhar, o horário já era “abusivo” face ao normal de uma quinta-feira checa, mas acabamos por nos deliciar com a popular “Svíčková”, uma carne estufada com um molho de legumes e geleia de frutos vermelhos a acompanhar.
Estávamos situados no centro histórico de Klatovy, numa zona sem trânsito e onde se destaca a praça principal que era precisamente o local que recebia o parque fechado ao final daquele dia. Chegados ali por volta das 22h00m, eram mais os seguranças que se viam do que propriamente publico, não havendo qualquer animação ali à volta, tendo sido até difícil encontrar o único bar que estava aberto àquela hora, mas praticamente às moscas…. Seria possível um rali do WRC com a luta pelo título ao rubro passar por uma cidade do centro da Europa praticamente anónimo?
Na grande maioria dos ralis dos nossos Campeonatos Norte, Centro e Sul vê- se mais público numa situação similar de parque fechado do que vimos naquele dia, foi estranho. Não nos alongamos muito no bar, era hora de ir dormir e não fazer barulho nas escadas para não acordar Ogier, Evans e companhia…
A pedido de Hanninen, o pequeno-almoço do Hotel iria excecionalmente ser servido às 05h45m da manhã, mas para nós começou um pouco mais tarde, dado que a nossa ligação de sexta-feira nos iria levar até ao último troço da ronda da manhã, denominado Šumavské Hoštice”.
Aqui sim, já vimos mais público, já sentimos mais ambiente “de rali”, com muitos checos pelas 09h30m da manhã já a aquecerem com uma sopa “Goulash” e a carregarem energia com umas salsichas “Bratwurst” bem grelhadas. A zona em si prometia e não desiludiu, víamos ao longe um salto em asfalto seguido de duas secções de reta e curvas de 90 graus, num alcatrão molhado e algo sujo pelas folhas e vegetação solta, seguindo-se uma longa reta a descer até uma esquerda manhosa onde a negociação era feita com antecedência e pezinhos de lã. Neuville arriscou e quase ficou por lá, Katsuta foi outro que se atravessou em demasia e corrigia a trajetória in extremis, enquanto Tanak e Ogier se revelavam mais eficientes, mas com estilos diferentes, o primeiro a travar mais cedo com o pé esquerdo, o segundo a travar mais forte no último momento exato.
Estávamos a ficar cada vez mais entusiasmados e antecipávamos ali boas passagens de Solberg e dos mais rápidos pilotos do WRC-2, até que o violento acidente no início da especial por parte de Andreas Mikkelsen neutralizava o troço para os restantes concorrentes. Foi um barrete! Para nós e certamente para os que pagaram bilhete só para ver aquele troço, que valia 25 EUR. Mas nós tínhamos Rally-Pass completo e de tarde rumamos mais a norte até Strašín, numa zona que nos impressionou pela precisão com que os pilotos dos Rally1 abordavam uma sequência de longas curvas rápidas a descer em serpentina.
Ali havia até direito a uma bancada artificial com cadeirinhas, não faltando food trucks de comes e bebes e os necessários toi-tois. Nalgumas das ZEs em que estivemos, até nos deparamos com speaker e ecrã gigante. Em termos de conforto das Zonas Espetáculo, o rali surpreendeu-nos muito pela positiva, com parques amplos onde marshalls organizavam de forma eficiente o estacionamento, acessos fáceis dos parques para o troço, um rali amigo do espectador. E polícia? Não se vêm nos troços, sendo presença atenta na patrulha do transito nas estradas nacionais e regionais circundantes ao rali, sendo todo o comando de segurança e controlo do publico nas ZEs assegurado por marshalls e por alguns seguranças privados, com o público no geral a respeitar as ordens de ambos e a colocar-se onde deve em segurança. Só vimos uma situação fora do normal, já na Alemanha, onde nos pareceu que a própria idade dos marshalls e a sua experiência (pareciam adolescentes) não seria a mais adequada.
O sábado foi o nosso dia mais longo do rali, o objetivo era desfrutar da prova tranquilamente durante o dia e ir ainda jantar a Munique. O primeiro troço localizava-se na Áustria, mesmo na fronteira com a Alemanha, muito pertinho da cidade de Passau, uma cidade universitária conhecida por ter dois rios a juntarem-se ali ao Danúbio, os rios Ilz e Inn. Nós estivemos no troço que ficou conhecido pelas “asneiras” de Neuville, Na nossa zona passou bem, sem abusar. O pior foi mais à frente onde algum otimismo a mais nas notas quase que o colocava fora de prova.
O rali estava ao rubro e era difícil adivinhar o vencedor final: à hora do almoço Ogier, Tanak e Evans por esta ordem passavam para a frente do belga e estavam separados por apenas 8s. O ambiente no troço também era diferente, mais gente, mais belgas a agitar bandeiras e a acender pirotecnia à passagem do Hyundai com o número 33 e mais equilíbrio que se via no público na sua distribuição por género e idades.
Na Chéquia o rali parecia ser um desporto só para homens de meia-idade! Também grande era a diferença no parque de estacionamento, com Audi, Mercedes, BMW e muitos Porsche a dominarem mais de 75% dos lugares. Já não havia Dacias e praticamente nenhum Skoda. De tarde acabamos por escolher o troço de Granit und Wald, uma especial a fazer lembrar as imagens que temos do antigo Rali da Alemanha, com vários prados verdes a ladearem um asfalto estreito, mas regular.
A nossa zona era pouco sinuosa e tinha o atrativo de podermos ver os carros a passar em quinta a fundo, quase quase no corte, um tipo de zona diferente do que estamos habituados a ver em Portugal e que também impressiona. Ali encontramos um simpático grupo de galegos, que partilhava uma opinião similar à nossa: se Dani Sordo tivesse vontade de fazer mais ralis, que bem que sabia à Hyundai e que bom que fazia ao próprio campeonato.
Tivemos ainda a oportunidade de ver outro tipo de carros a passar, com nota muito positiva para o Renault Clio Rally3 de Mattéo Chatillon e ainda para o Alpine A110 Rally GT de Armand Fumal, carros mais baratos que os Rally2 e que proporcionam bons andamentos, se bem guiados. O rali estava a terminar para nós, tínhamos ainda no nosso road book uma passagem pela capital da Baviera para provar o tradicional joelho de porco assado e continuar as tertúlias sobre o presente, o passado e os próximos ralis que hão de vir.
Em suma, um rali com um grande potencial, mas que pelas circunstâncias atuais de promoção do Mundial nos pareceu ter menor protagonismo e afluência que o esperado, especialmente se compararmos com os fenómenos populares do Rallylegend (que tinha sido disputado no fim de semana anterior) ou do próprio Rali do Barum, cujo itinerário decorre por ali perto. Até breve!
WRC / Rali da Europa Central / Gastos por pessoa
- Voos 153 EUR
- Alojamento 121 EUR
- Refeições 151 EUR
- Aluguer Furgão 106 EUR
- Gasóleo 24 EUR
- Rally Pass 96 EUR
TOTAL 651 EUR
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Eu também segui o rallye, mas fui de carro desde Portugal.
Está bem organizado mas comparando com o de Portugal ou da catalunha não é nada espectacular
Aliás tem muito pouco público.
Muito interessante! Parabéns e quem me dera ter a disponibilidade de ir tão longe!