Renault 5 Turbo: O ícone rebelde

Por a 14 Dezembro 2024 17:17

Pela primeira vez na história, a Renault utilizou um documentário para revelar um novo automóvel de produção. Os telespectadores seguem Luca de Meo, Diretor-Geral do Grupo Renault, numa visita ao Departamento de Design, para ver o futuro Renault 5 Turbo 3E.

Quarenta e seis anos após o lançamento do primeiro Renault 5 Turbo, a Renault vai surpreender os entusiastas com o renascimento deste ícone desportivo.

A este documentário seguem-se, em 2025, uma série de ativações exclusivas que vão levantar ainda mais a cortina sobre o Renault 5 Turbo 3E, que nasce após um sucesso incrível do Renault 5 Turbo, automóvel que bem poderia ser aquilo em que a FIA estava a pensar quando criou o Grupo B.

Nascido como Grupo 4, era um carro pequeno, da carroçaria de duas portas tipo “hatchback”, com motor central, em vez de dianteiro. Podia passar de forma automática para o Grupo B, mas neste foi um falhanço, pois não tinha potência para igualar as restantes ‘bestas’. A solução foi criar uma variante mais potente, designada Renault 5 Maxi Turbo.

O carro apareceu na Primavera de 1985 e o seu motor de 1.527 cc não era mais que uma evolução do original do R5 Turbo, com 1.397 cc. Na conversão, a como se tivesse um motor com mais de 2 litros de cilindrada, fator tanto mais positivo quanto o carro era pequeno e muito leve. No limite mínimo de peso, permitia rodas mais largas e acrescentar enormes “spoilers”. As suspensões foram alteradas, em especial a dianteira, com uma geometria feita “ad hoc” e braços mais rígidos.

O princípio da saga

Tudo começou em Abril de 1977, mesmo antes do R5 Alpine ter feito a sua estreia em competição. O projeto tinha a designação/número 822.01 e a base de operações era em Dieppe, onde estavam as instalações da Alpine. A ideia era construírem-se pelo menos 1.000 exemplares do R5 Turbo e tentar homologá-los em Grupo 3. O futuro carro deveria ter a carroçaria inteira do R5, com motor central e tração às rodas traseiras.

O primeiro motor em que se pensou foi o V6 usado tanto pela Peugeot, como pela Renault e até pela Volvo, então em parceria técnica com a marca do losango. Na Renault, esse motor estava o R20 e no Alpine 310, mas depressa foi abandonado, pois era demasiado pesado. O mesmo sucedeu com o motor Douvrin de 2 litros.

Então, começou a olhar-se para aquilo que o próprio R5 usava. E descobriu-se que havia uma versão turbo do motor de 1.397 cc, que a Renault tinha no R5 Alpine Turbo de estrada. Na verdade, o R5 Alpine Turbo já tinha mesmo uma curta carreira nos ralis, no final dos anos 80. Com Alain Oreille ao volante, ganhou duas vezes seguidas a Taça FIA de Grupo N, com o fabuloso feito de ter ganho à geral o difícil Rali da Costa do Marfim, em 1989, que então fazia parte d calendário do WRC e tornando-se o primeiro (e único) carro de Grupo N a conseguir semelhante proeza.

A decisão foi tomada quando se percebeu que, com o fator de conversão (a cilindrada do motor multiplicada pelo coeficiente do turbo), a cilindrada passava dos 1.397 cc para 1955 cc. O carro de estrada tinha 160 cv de potência, mas esperava-se que o caro de ralis começasse por ter 210 cv e, com os primeiros desenvolvimentos, esse valor subisse para os 260 cv. Foi escolhido um turbo Garrett e a injeção foi desenvolvida pela Bosch. O motor acabou por ser montado longitudinalmente, na frente do eixo traseiro.

Correr mesmo antes de “existir”

O primeiro protótipo do R5 Turbo fez os primeiros testes nas instalações da Alpine em Dieppe, com Gérard Larrousse ao volante, em Março de 1978. A meio do ano, Guy Fréquelin e Jean Ragnotti levaram para a pista de Ledenon, procedendo aí a pequenas diversas alterações. A maneabilidade foi melhorada e procurou-se diminuir aquilo que se chamava “turbo-lag”, tempo que o turbo demorava a entrar em ação, depois de “esmagado” o acelerador. Num carro com motor pequeno e turbo de grandes dimensões, como era o caso do R5 turbo, a reação era brutal. O R5 Turbo foi apresentado oficialmente no Salão Automóvel de Paris, em Outubro, pelo CEO da Renault, Bernard Vernier.

Em Novembro, Fréquelin pilotou o R5 Turbo no Giro d’italia. O carro era para ser inscrito como Grupo 4, mas teve que correr como Grupo 5, porque ainda não estava homologado. Na verdade, apenas começou a ser produzido em Dieppe, no início de 1980 e foi aceite para homologação em Setembro desse ano.

Os responsáveis da Renault tinha sérios receios de que o R5 Turbo não fosse bem acolhido, porque não acreditavam que conseguisse alguma vez atingir 400 cv de potência, o que poderia demover potenciais interessados. Mas enganaram-se e a procura foi tanta que os custos de produção ficaram cobertos mesmo antes desta ter início.

Para acelerar as entregas, a Renault decidiu, em 1982, lançar uma versão, chamada R5 Turbo 2 – o que obrigou a renomear a versão original como R5 Turbo 1. Esta segunda versão, mais fácil e rápida de produzir, tinha portas em aço, um depósito mais pequeno e componentes da produção em série na suspensão.

O vitorioso R5 Turbo

A estreia oficial do R5 Turbo no WRC foi na Tour de Corse de 1980, com Jean Ragnotti e Bruno Saby. Ragnotti liderou a maior parte do rali, até ter um furo e desistir com problemas de alternador. Saby foi quarto, mas teve também alguns problemas.

Apenas regressou no Rali de Monte Carlo de 1981, aquele em que a Audi estreou o Quattro, que tinha tração total. Ragnotti e Saby voltaram a ser os pilotos de serviço. A Renault decidiu diminuir a capacidade dos tubos, para tornar mais fáceis de pilotar na neve e no gelo os R5 Turbo. Mas, afinal, quase não houve neve ou gelo. Assim, a Renault tomou a decisão de tornar mais potente o turbo do R5 Turbo de Ragnotti, quando viu que este estava em luta pela vitória com o Porsche 911 de Jean-Luc Thérier este acabou por sair de estrada e Ragnotti venceu a prova, em que os Audi tiveram problemas de juventude, depois de deixarem toda a gente estupefata. Os dois 5 Turbo desistiram na Córsega, mas Ragnotti demonstrou que, também na terra, o R5 Turbo era competitivo, ao terminar em quinto o Rali RAC.

A segunda vitória do R5 Turbo foi na Córsega em 1982. Ragnotti passou o Lancia 037 de Attilio Bettega ao fim de três troços e assuou o comando duas classificativas mais tarde, ao passar o Ferrari 308 GTB de Jean-Claude Andruet. Nesse ano de 1982, Saby foi quarto na Costa do Marfim, onde Ragnotti desistiu ao partir um dedo num salto mais violento.

O R5 turbo passou de Grupo 4 a Grupo B no Monte Carlo de 1983, tendo que usar jantes mais pequenas, de apenas 10”. Isso condicionou a prova de Ragnotti, que errou nas escolhas de pneus e foi apenas sétimo. Jean-Luc Thérier, o novo piloto da Renault, desistiu cedo com problemas de caixa de velocidades.

Para a Córsega, o R5 Turbo tinha cerca de 275 cv. Thérier e Ragnotti desistiram cedo, mas Saby conseguiu terminar a prova, em quinto lugar, atrás de quatro Lancia 037. Ragnotti pilotou o único R5 Turbo que foi à Acrópole, mas desistiu. Nessa altura, a Renault quase abandonou o projeto do WRC, dedicando-se mais à F1, que estava a exigir custos exorbitantes à maca francesa que era preciso rentabilizar com resultados.

Em paralelo com a sua campanha no WRC, o R5 Turbo esteve em simultâneo ativo e com várias vitórias nos campeonatos de França, Espanha e Portugal.

Em França, Ragnotti foi campeão em 1982 e 1984 e Saby vice-campeão em 1983. Em Espanha, Eugenio Ortiz foi campeão em 1983 e, também cm o R5 turbo, um estreante chamado Carlos Sainz foi vice-campeão. Em Portugal, Joaquim Moutinho foi campeão em 1984 e 1985. Em 1986, venceu o Rali de Portugal, marcado pelo acidente de Joaquim Santos na Lagoa Azul e o abandono das equipas de fábrica.

Renault R5 Maxi Turbo: O ‘monstro’ condenado à nascença

Em 1984, a Renault começou a trabalhar em qualquer coisa mais forte, tendo em vista o WRC e as mais exigentes regras que estavam a ser ‘cozinhadas’ e viriam a resultar nos ‘Super’-Grupo B. Era preciso dar mais potência ao R5 Turbo. Não podia ser uma simples evolução, mas a Renault também não podia fazer 200 carros especiais totalmente novos e pô-los à venda. A solução, tomada para reduzir os custos de produção, foi fazer uma nova versão do R5 Turbo original e dar-lhe um motor maior. O resultado foi o carro que, de série, ficou conhecido como R5 Turbo 1430, com o número e referir-se à capacidade cilíndrica do motor.

O R5 Maxi Turbo foi uma evolução deste exemplar único de produção. Tinha sobre o tejadilho um “spoiler” de maiores dimensões, em alumínio, material de que o próprio tejadilho era feito. As cavas das rodas eram mais largas, para alojarem as agora maiores jantes de 11”. O “capot” tinha uma enorme entrada de ar, que conduzia o ar para arrefecimento dos radiadores de água transversais. O “spoiler” dianteiro foi também aumentado em altura e largura. A suspensão da frente recebeu também alterações, para melhor aderência do eixo dianteiro.

Mas a maior diferença estava no motor. Tinha agora 1.527 cc, o que queria dizer que, com o fator de conversão, aumentava a cilindrada real para os 2138 cc. Tinha também um muito maior turbo Garrett. O resultado foi uma potência de 350 cv, segundo a Renault, mas que, na verdade, deveria ser muito mais, pis o binário anunciado era de 44 kg/m, o que o colocava ao mesmo nível dos Lancia Delta S4 e Audi Sport Quattro S1, que tinham motores de muito maiores dimensões.

O R5 Maxi Turbo pesava cerca de 900 kg, apenas 20 acima do limite permitido nos Grupo B, 880 quilos, que daria uma relação peso/potência de 0,39 bhp/kg.

Estreia e final a vencer

A estreia do R5 Maxi Turbo no WRC foi na Córsega, após um par de participações do carro em eventos nacionais. Foram inscritos três R5 Maxi Tubo: um, pela Renault Sport, com as cores da Elf e da Philips, para Jean Ragnotti – era o carro oficial; outro, apoiado pela Diac, para François Chatriot; e outro, privado, para um jovem chamado Didier Auriol, quase desconhecido nessa altura. Estes dois desistiram cedo com problemas de motor, mas Ragnotti surpreendeu.

Jean Ragnotti tomou a dianteira logo na primeira classificativa e aí ficou até ao final. Em segundo lugar ficou o seu antigo colega de equipa a Renault, Bruno Saby, a uns longínquos 12,5 minutos (!).

Esta foi a primeira e única participação do R5 Maxi Turbo numa prova do WRC. Em 1986, a Renault abandonou o Grupo B enquanto equipa oficial, voltando as suas atenções para o recém-nascido R11 Turbo de Grupo A, então o futuro dos ralis. Mesmo assim, a Renault foi sexta no Campeonato do Mundo de Construtores, juntando aos pontos da vitória de Ragnotti na Córsega os de Dany Snobeck, que foi sexto no Monte Carlo com um R5 Turbo privado e os de Ernesto Soto, que foi quinto na Argentina com um R18 GTX de Grupo A.

Com Ragnotti ao volante, o R5 Maxi Turbo ganhou as 24 Horas de Ypres e a Volta à França, em 1985, então duas das mais importantes provas do Europeu de Ralis.

O R5 Maxi Turbo manteve-se ativo também fora de França. Em Espanha, Carlos Sainz comprou um e, apesar de vencer seis das 11 provas do campeonato, voltou a sagrar-se vice-Campeão. Na Suécia, durante três temporadas seguidas, os irmãos Per-Inge e Lars-Erik Walfridsson utilizaram dois R5 Maxi Turbo, vencendo mesmo algumas provas em pisos com neve e gelo, algo onde o carro, que ficou conhecido por ser “horrível de pilotar”, em nada se sentia à-vontade!

O R5 Maxi Turno, apesar do seu aspeto impressionante, era um carro condenado à nascença. Numa era em que era normal num carro de ralis ao mais alto nível ter um motor cm dias árvores de cames à cabeça e quatro válvulas por cilindro, o R5 Max Turbo não tinha nada disso. Apesar de tudo, é preciso dizer que o seu pequeno motor era um verdadeiro prodígio de tecnologia.

A Renault nos ralis

A Renault iniciou-se nos ralis nos anos 50, com o Dauphine 1093 que, apesar de ter um motor de somente 850cc, era um formidável carro de ralis. Posteriormente, deixou de se envolver diretamente, mas aceitou que a Alpine, que passou a preparar os motores, utilizasse o seu nome de forma consistente nas provas de estrada (e de pista), durante os anos 60.

Nos anos 70, bons resultados com o R12 e R17 Gordini encorajaram a Renault a regressar aos ralis de forma oficial. E fizeram-no com diversos modelos do R5.

No início, o R5 de ralis era um simples carro de apenas duas rodas motrizes, mas depois metamorfoseou-se num “monstro” com motor central, turbocompressor e quatro rodas motrizes. Estes carros ficaram obsoletos perante a chegada do Grupo B, onde a Renault não entrou. Depois do final do Grupo B, em 1986, a Renault manteve-se nos ralis com os R11 Turbo de tração dianteira (Grupo A). Mais tarde, desenvolveram o Clio Maxi e o Mégane Maxi, para a categoria F2 do WRC. Depois, correram no JWRC com o Clio 1600 S e, hoje, utilizam o Clio R3 e R2 em provas europeias e nacionais.

CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS

Motor: Central, longitudinal, 4 cilindros em linha, 2 válvulas por cilindro, 1 árvore de cames à cabeça, 1.527 cc, turbo Garrett, injeção de gasolina; Potência (cv/rpm): 350/6.500; Binário Máx. (Kg/m): 44; Diâmetro x Curso (mm): 77 x 82; Transmissão: Traseira, caixa manual de 5 vel.; Suspensão: Por triângulos (dianteira e traseira); Carroçaria: 2 portas, “saloon”; Comprimento/Largura/Distância entre eixos (mm): 3.664/1.752/2.430; Peso (kg): 905

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