Rali de Portugal 1998 foi inesquecível: McRae bateu Sainz por 2.1s,
Não resistimos a recuperar o título da reportagem sobre o TAP/Rali de Portugal, publicada no AutoSport de 26 de Março de 1998. Porque espelha na perfeição o que se passou nas estradas mais recônditas do país, nos dias anteriores.
“Uma edição histórica” referiu ainda o articulista Fernando Petronilho. Adiantando que se tratou “da mais curta vantagem de um vencedor de uma prova do Mundial.” Uma vitória que foi “encontrada apenas na última classificativa.”
Petronilho recorda ainda os maiores duelos travados nos anos anteriores na prova portuguesa: “Sainz e Auriol em 1991, Sainz e Kankkunen em 1995, McRae e Sainz em 1998” – salientando o fato de, em todos eles, “o piloto espanhol esteve sempre envolvido. Ganhou os dois primeiros, perdeu agora.”
Mas o triunfo do “escocês voador” não foi fácil. Mesmo nada: “mais uma classificativa e poderia ter sido o fim das [suas] esperanças, que chegou à assistência final na Senhora da Hora sem uma pinga de óleo no motor do Subaru. Na verdade, o grande dominador desta edição da prova andou sempre com o ‘coração nas mãos’, dado o elevado consumo de óleo que o motor do [Subaru] Impreza [sempre] registou (…) e que nunca deu a segurança absoluta a McRae.”
Valeu-lhe, então, “a vantagem que alcançou ao longo da 1ª etapa, para depois se defender (…) nos dois restantes dias dos ataques dos seus adversários.” De fato, McRae arriscou “tudo por tudo e cedo estabeleceu uma cadência que mais nenhum piloto conseguiu acompanhar e ao chegar a Viseu com 44s de vantagem (…) dava uma imagem de esmagadora supremacia face aos seus concorrentes, vergados perante a [sua] superioridade.”
Porém, “bastou um simples furo, em que o sistema de ‘mousse’ não funcionou, para que McRae ficasse à mercê dos seus perseguidores que pareceram ganhar novo ânimo.”
E, com apenas 11s de avanço na derradeira fase do rali, McRae “defendeu-se como pode dos ataques de Sainz”, evidenciando “uma imagem de maturidade e resistindo da melhor forma ao ‘forcing’ do piloto espanhol, com um carro que se encontrava longe das condições ideais.”
Colin McRae satisfeito com o triunfo: “Foi um excelente rali”
A primeira das duas vitórias consecutivas de Colin McRae no TAP Rali de Portugal foi muito suado e o escocês da Subaru teve em Carlos Sainz um adversário constante e plenamente à altura das exigências. Por isso, no final, McRae confessou que foi “uma prova muito disputada e o resultado está precisamente de acordo com os objetivos que estabelecemos.”
O principal problema que McRae terá encontrado foi quando o motor do Subaru começou a ter alguns problemas cm o óleo. Todavia, o escocês subestimou essa situação, garantindo que “apesar de sabermos que nem tudo estava bem com o motor, sentimos que o carro não estava menos competitivo e, por isso, nunca deixamos de atacar.” Até porque “o Carlos Sainz não estava longe e, por isso, a estratégia só podia mesmo ser continuar a atacar. As cosias acabaram por não se complicar, apesar de acharmos que este foi um rali algo duro.”
Os 100 ralis de Carlos Sainz
No final do TAP/Rali de Portugal, Carlos Sainz manifestava a sua desilusão por não ter conseguido vencer. Batido “in extremis” por Colin McRae, após uma luta titânica, que durou toda a prova, o madrileno tinha, porém, outros motivos para festejar: é que acabara de realizar aquele que era o seu 100º rali no WRC.
Na verdade, Sainz tinha-se estreado no Mundial precisamente 11 anos antes – e no Rali de Portugal. Ao AutoSport, com emoção, recordou esse momento, enquanto descansava de um puxado “jogging” pelos arredores de Guimarães: “Lembro-me perfeitamente dos treinos, das verificações no Autódromo do Estoril, com todos os pilotos que participavam no Mundial e, como não podia deixar de ser, da primeira classificativa.”
Que… venceu, ao volante do Ford Sierra RS Cosworth do Marlboro Rally Team. O AutoSport escreveu que esse triunfo “não poderia ser um começo melhor”, o que Sainz corroborou com entusiasmo: “(…) dispunha de um carro que era muto eficaz em troços de asfalto. Penso que ainda ganhei outro troço e, quando desisti, estava em terceiro ou quarto, o que me deu bastante confiança em termos pessoais.”
O suficiente para, nos anos (e 99 provas) seguintes, a começar pela entrada na equipa oficial da Toyota [Team Europe], logo em 1989, vencer por duas vezes o Campeonato (1990 e 1992) e um total de 21 ralis, o último deles o Monte Carlo, dois meses antes da prova portuguesa.
Hyundai: uma estreia para aprender
Este ano, a Hyundai estreou-se no WRC com um projeto ambicioso, para ganhar no mais curto espaço de tempo. Mas, no TAP/Rali de Portugal de 1998, a marca coreana fez também uma estreia… para aprender. Então, “por uma questão de mentalidade, ou agarram os desafios ou nem sequer pensam neles”, a Hyundai decidiu estrear-se “na alta competição, participando diretamente nas provas, ao invés de se remeterem a uma fase prévia de testes.”
Em Portugal, a Hyundai decidiu participar com um Coupé preparado pelos australianos da MSD, com quem a marca tinha um contrato de três anos, entregue a Kenneth Eriksson e Wayne Bell. A decisão [de correr no campeonato] tinha sido tomada apenas em Janeiro anterior e, em dois meses, não houve tempo de preparar convenientemente o carro, que surgiu em Portugal “muito pouco competitivo.”
Mesmo assim, David Whitehead, o responsável pela MSD, revelou que o Coupé iria sofrer algumas evoluções imediatas, antes de ser homologado em Junho seguinte: desde a carroçaria, “que está a ser estudada por um técnico inglês que esteve ligado ao projeto do McLaren de estrada, (…) a uma nova caixa de velocidades X-TRAC e um motor mais desenvolvido em termos de potência.”
Rui Madeira foi o melhor piloto português
Rui Madeira – que este ano regressa ao Vodafone Rali de Portugal, em jeito de comemoração dos seus 25 anos de carreira – terminou o TAP/Rali de Portugal de 1998 em 9º da classificação geral, cotando-se também como o melhor piloto português a subir ao pódio de chegada. Nessa altura, o piloto de Almada classificou a prova como “o rali mais duro que já fiz”, tendo em conta a forte concorrência com se deparou ao volante do Toyota Celica: “Só posso estar satisfeito por ter chegado ao final (…). (…) O Toyota não é fácil de guiar em condições normais, agora imagine-se nestes pisos. Comparativamente ao Subaru e ao Mitsubishi, o Celica é muito pior. (…) Mas o resultado (…) enquadra-se perfeitamente dentro das perspetivas, (…) porque garantimos o primeiro lugar ara a Grifone, o que é importante na competição reservada às equipas.”
Na mesma ocasião, Madeira mostrava-se “mais ansioso que nunca” por se sentar “no novíssimo [Toyota] Corolla, para disputar a segunda prova do Mundial, o Rali da Catalunha, um mês depois.
Os Renault não arrancaram para a 2ª Etapa
“Azar bateu à porta” (…) “enquanto toda a gente saía de Viseu para dar início à 2ª Etapa, os dois Mègane Maxi da equipa Renault Gest GALP ficavam.” Ou seja, uma vez mais, naquela que é a principal prova do calendário nacional de Ralis, os carros da marca do losango não tiveram a sorte pelo seu lado, desistindo ambos ao mesmo tempo:
“Temos que ir à bruxa!” – desabafou, então, Moisés Martins, o responsável pela equipa, antes de confessar que “não valia a pena sairmos para a estrada, porque o carro do Pedro [Azeredo] não iria pegar e o do [José Carlos] Macedo dificilmente conseguiria andar em condições.”
A razão por trás deste descalabro era idêntica em ambos os carros e tinha a ver com o fato de os motores terem revelado “um sobreaquecimento inesperado” na etapa da véspera. Moisés Martins, a este propósito, explicou: “Ainda não abrimos os motores (…) mas todos os indícios apontam para alguma incompatibilidade com o pó [das classificativas] ou com a gasolina utilizada.”
Um problema que foi logo detetado na 1ª Etapa, no carro de Pedro Azeredo, que começou a aquecer “quando trabalhava ao ralenti. O filtro do ar impedia a entrada de ar corretamente e, através da sonda aí existente, a gestão eletrónica do motor dava informações erradas à injeção de gasolina.” A hipótese de tentar corrigir o problema era alterar a cartografia do motor, mas isso acabou por não suceder pois o motor do carro de Azeredo aqueceu em demasia subitamente e, quando isso sucedeu também com o de José Carlos Macedo, os técnicos da Renault nem tentaram debelar o problema, pois não conheciam a sua causa.
CLASSIFICAÇÃO
1º 555 Subaru World Rally Team/Colin McRae/Nicky Grist (Subaru Impreza WRC), 4h21m00,2s; 2º Toyota Castrol Team/Carlos Sainz/Luis Mota (Toyota Corolla WRC), a 2,1s; 3º Toyota Castrol Team/Freddy Loix/Sven Smeets (Toyota Corolla WRC), a 45,8s; 4º Team Mitsubishi Ralliart/Richard Burns/Robert Reid (Mitsubishi Carisma GT), a 53,1s; 5º Ford Motor Company/Ari Vatanen/Fred Gallagher (Ford Escort WRC), a 3m20,2s; 6º 555 Subaru World Rally Team/Piero Liatti/Fabrizia Pons (Subaru Impreza WRC), a 3m24,2s; 7º Ford Motor Company/Juha Kankkunen/Juha Repo (Ford Escort WRC), a 3m36,9s; 8º Belgacom Turbo Team/Grégoire de Mévius/Jean Fortin (Subaru Impreza WRC), a 6m59s; 9º HF Grifone/Rui Madeira/Nuno Rodrigues da Silva (Toyota Celica GT-Four), a 10m24,1s; 10º Stomil Mobil 1 Rally Team/Krzysztof Holowczyc/Maciej Wislawski (Subaru Impreza WRC), a 11m58,1s; 11º Procar/Jean-Pierre Richelmi/Thierry Barjou (Subaru Impreza 555), a 18m15,2s; 12º Gazprom Rally Team/Alexander Nikonenko/Viktor Timkovsky (Ford Escort WRC), a 18m49s; 13º Telecel Team Castrol/Pedro Chaves/Sérgio Paiva (Toyota Corolla WRC), a 18m56,4s; 14º Peugeot ESSO Silver Team SG/Adruzilo Lopes/Luís Lisboa (Peugeot 306 Maxi), a 19m51,2s (1º F2); 15º Toyota Mobil 1 Team Turkey/Volkan Isik/Ilham Dökümcü (Toyota Celica GT-Four), a 23m23,6s; 16º Uruguay En Carrera/Gustavo Trelles/Martin Christie (Mitsubishi Lancer EVO IV), a 26m43,4s (1º Gr.N). Classificadas 47 equipas.