Martin Holmes: «Gostava de começar tudo de novo»
Acompanhando o Mundial de Ralis praticamente desde o início, primeiro como navegador e só depois como jornalista, Martin Holmes recorda na primeira pessoa as 420 provas onde este presente ao longo da sua carreira, isto numa altura em que o AutoSport vai passar a dar à estampa uma nova rubrica com o “cunho” do decano jornalista inglês, colaborardor do Semanário dos Campeões no Mundial de Ralis.
Os aniversários são a pior maneira de lembrar que o tempo está a passar por nós. O Rali da Grã-bretanha de 2007 marcou a minha 400º presença numa prova do Campeonato do Mundo e, sinceramente, deixou-me seriamente preocupado…Preocupado porque cada vez que comemoramos uma data importante é normal “bebermos” para festejar!
Cada golo de álcool significa que um importante facto se perderá e que mais uma explicação será negligenciada. Pior, só mesmo a ideia de celebrar quando se chega a casa. Numa situação como a minha, é estranho querer festejar um facto que, quer se queira, quer não, acabou por influenciar a vida de outras pessoas e nem sempre da melhor forma. Mas, mais do que nunca, e talvez mais importante, seja o facto dos aniversários ameaçarem seriamente a nossa credibilidade.
A idade é assumidamente um obstáculo ao justo julgamento, ao progresso e à manutenção de uma postura coerente com o que se passa no presente. No nosso trabalho, passamos todo o tempo a tentar fugir da velhice. Tentamos esquecer que o primeiro Rali do RAC que cobrimos foi já há 40 anos; tentamos perceber como funcionam as últimas tecnologias em transmissões para enviarmos os textos, como se da coisa mais normal do mundo se tratasse; e passamos o tempo a convencermo-nos que dissemos a frase “eu disse-te
que era má ideia!” muito menos vezes do que as que realmente dissemos.
O verdadeiro problema é que, para mim, os ralis continuam a ser tão excitantes como no início. As constantes mudanças no formato do Mundial criam cenários fascinantes, da mesma forma que ver a determinação de cada piloto também constitui sempre um novo estímulo. E não se pode negar que ter uma credencial de jornalista permanente da FIA, com acesso a todas as provas do calendário, ter livre acesso às classificativas, falar e entrevistar os pilotos em áreas restritas e, mais importante, encontrá-los preparados para falar connosco, em qualquer altura, e poder esperar que, por vezes, sejam eles a vir falar connosco, não é um privilégio desta profissão.
Dizem que as memórias são a única coisa boa que os mais velhos têm para se divertir! Olhando para um passado com 420 ralis, tenho alguns momentos importantes para recordar, nomeadamente os sítios por onde passei, numa perspectiva positiva, e os horrores por que passei para lá chegar, numa
visão negativa. Inesquecível foi também o facto de ter tido a oportunidade de acompanhar o trabalho de pessoas que realmente são o melhor que há na profissão que escolheram.
«Todas as semanas há novas histórias para contar
Mas depois de 420 ralis, o gozo continua. Todas as semanas, há sempre uma nova história para iluminar o dia. Basta recordar-me, por exemplo, do nascimento de novos valores e dos erros que cometem. Como o de Andreas Mikkelsen, um piloto com de apenas 17 anos que foi correr para Inglaterra
para se poder iniciar nos ralis (porque era demasiado novo para guiar em estrada na Noruega). Dois dias depois de tirar a carta de condução, já estava ao volante de um Ford Focus WRC, num rali em Gales que acabou por vencer.
Mas, no dia seguinte, rumou à Escócia e quando estava em segundo noutra prova acabou por ser desclassificado, por receber assistência fora do parque. É por isso que esta profissão me diverte. Porque muita da acção se passa por detrás das cenas principais. Recuar no tempo Hoje a disciplina sofre de imediatismo. As coisas acontecem agora e é isso que faz também desta profissão um regalo em termos de trabalho.
Por isso as perguntas sobre a idade são irritantes. Quem quer ficar velho quando parece que tudo falta ainda acontecer e quando todos os outros são ainda novos? Cada vez que falo com Timo Rautiainen, Phil Mills, Daniel Elena e vejo o “escritório” ambulante onde trabalham, desejo ser 30 anos mais novo e sentar-me onde estão eles agora. Lembro-me bem da altura em que os “tripmaster” falhavam, os escapes caíam dos carros e se ficavam horas a fio no meio da montanha, depois de um acidente ou duma falha mecânica, sem que ninguém nos pudesse resgatar por falta de comunicações.
Aidade faz-nos mais experientes, mas também nos traz mais preocupações com a actualidade. Confesso que não queria celebrar o meu 420º rali no Mundial. Talvez preferisse recomeçar tudo de novo e ir para onde os novos
estão agora!
Interesses próprios minam modalidade
A visão de quem vive por dentro O Mundial de Ralis atravessa hoje uma das suas fases mais críticas desde que nasceu há 34 anos. O público e, mais importante, a credibilidade comercial da disciplina está na mó de baixo. Num mundo onde parece viver-se cada vez mais depressa, a pressão para tomar decisões importantes é maior do que nunca e nem sempre com o melhor discernimento. Não é só a minha opinião, pois há uma importante corrente de opiniões dentro deste desporto, feita por pessoas credíveis, que defende que muitas das mudanças operadas são feitas de acordo com os interesses próprios dos agentes que controlam a disciplina e nunca são reflectidas, como deviam, em prol do progresso dos ralis.
Um olhar para o actual panorama do Mundial pode explicar porquê: em pouco tempo o número de construtores oficiais presentes foi reduzido de seis para dois, agora, três, e o campeonato de Marcas passou a ser disputado por equipas privadas. Na verdade, cada director de equipa parece ter a sua própria agenda para mudar as regras, enquanto a FIA tem a sua própria agenda para o negar. A calendarização das provas é, nesta altura, o principal problema. Durante anos, a política da FIA foi incluir tantos países quanto os
possíveis no Mundial, mostrando ter uma visão claramente curta, fechando os olhos às más organizações.
Por este e tantas outras questões é que dá vontade de perguntar: será que os ralis precisam de uma liderança marcada por questões de marketing ou por questões desportivas? Não deveria existir uma espécie de “figura de estado” dos ralis que superintendesse todos os problemas e que pudesse “avisar” os principais agentes de decisão quando a paixão e emoção estivessem a ir longe demais?
Martin Holmes
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