Hugo Magalhães: “quero aprender cada vez mais, evoluir e enfrentar novos desafios”

Por a 8 Fevereiro 2022 12:30

Hugo Magalhães correu este fim de semana no Qatar, em mais uma prova internacional a somar às muitas que já tem no seu currículo. Este ano, mantém a aposta em ajudar jovens a desenvolver-se no mundo dos ralis e mantém o objetivo de correr aos mais alto nível no WRC e ERC.

Pouco dias antes de rumar ao Qatar, tivemos uma interessante conversa com Hugo Magalhães, único navegador português de momento a fazer carreira internacional, onde continua a ter pilotos de várias origens e latitudes.

O navegador de Fafe, tem como boa parte das gentes daquela terra, ‘ralis nas veias’, e depois de ter visto o seu primeiro rali com o avô materno com apenas sete anos, nunca mais quis outra coisa.

Começou a carreira em 2006, depois de alguns anos a fazer a sua carreira em Portugal, em 2012, teve a sua primeira aventura internacional ao lado de João Silva na WRC Academy, e depois disso começou a fazer muitas provas internacionais, ao lado de pilotos estrangeiros, mas também de Bernardo Sousa, nos seus tempo do WRC.

Volvidos 10 anos e muitas provas depois, continua a trabalhar com vários pilotos, por exemplo Nick Loof, um jovem a quem tem vindo a ajudar a afirmar-se no ERC: “É uma vertente que eu gosto, trabalhar com jovens, passar-lhes algum know how, experiência, dar-lhes aquilo que eu não tive.

Ele apareceu através de um piloto que eu já tive, o Mark Wallenwein, também alemão, um coach, e procurava também um co-piloto, e como sabe que eu estou virado a trabalhar com jovens, fez um convite, que aceitei”, começou por dizer Hugo Magalhães, que resumiu o ano de Nick Loof: “Foi uma época com muitas histórias, bons e menos bons resultados, mas que no fim resultou num terceiro lugar no ERC Junior, um excelente resultado, na primeira vez que fez ralis a nível internacional, nunca esquecendo que ele, no seu currículo tinha apenas 10 ralis locais, na Alemanha. Foi uma época de muito trabalho mas que acabou com um belo prémio.

Ele veio a Portugal, passou cá uma semana, fomos para as especiais do Rali de Portugal, do antigo Sopete, fomos tirar notas, criar um novo sistema, porque era a primeira vez que iria usar as notas em inglês. Passámos algum tempo a fazer atividade física, também para criar alguma empatia, para nos conhecermos, de modo a perceber as suas necessidades. Queria conhecê-lo melhor antes da primeira aventura.

São jovens que saem da sua zona de conforto e que passam por dificuldades eu diria mais psicológicas e mentais mas eu já tenho uma bagagem boa nesse aspecto, como sabem lancei-me cedo para fora, a fazer ralis no estrangeiro, pelo que tenho esse know, experiência e consegui colmatar ali algumas dificuldades. Passei-lhe o conhecimento dos ralis, dei-lhe algum conforto nesse aspeto.

Depressa surgiram as primeiras dificuldades porque ele estava a colocar demasiada pressão sobre si, pois era o primeiro rali, pensava ter que mostrar resultados, o que as pessoas estariam a pensar sobre si, tive que ter uma conversa e fazê-lo entender que era o princípio duma fase, que ninguém lhe estava a meter pressão, ele estava ali para aprender, simplesmente lhe pedimos que tinha de ser um piloto comprometido com os ralis, tinha de trabalhar e tinha de aprender.

Teve que haver uma conversa séria, para ele voltar a animar, pois estava e ter ali uma oportunidade para aprender, as coisas acabaram por fluir o rali correu bem, tinha que desfrutar do momento e da oportunidade.

No fim ele agradeceu e disse que eu tinha feito com que o rali não tivesse terminado antes sequer de começar.

Ele tinha entrado numa espiral em que estava tudo perdido. Depois durante o ano evoluiu bastante bem, especialmente na terra, onde fizemos dois pódios. Hoje os jovens querem chegar longe e depressa, mas o que ele tinha de fazer era evoluir de rali para rali, definir objetivos reais, que nos levem a ganhar confiança para passar ao objetivo seguinte. No asfalto não correu tão bem, mas fi-lo ver que correu contra pilotos que já tinham feito aqueles ralis, alguns mais do que uma vez, estavam bem mais preparados pelo que não se podia sentir frustrado, e que as coisas tinham que se fazer passo a passo e ele entendeu perfeitamente a mensagem. Tornou-se um piloto consistente”, explicou.

Carreira internacional

Hugo Magalhães nunca escondeu a sua preferência pelo estrangeiro, é lá que se podem construir carreiras mais sólidas. E é o que tem feito: “metade dos 230 ralis que tenho foram feitos a nível internacional. Desde cedo defini para mim que queria fazer ralis a nível internacional, e sabia que iria sair da zona de conforto, aprendi línguas, tive que correr riscos, mas nunca tive medo de arriscar, e desde que fui ao primeiro rali lá fora, percebi que era isso que queria, pois queria sentir-me ‘alimentado’ e isso significava ralis novos, tudo o que fosse um desafio que me obrigasse a fazer mais. Nesse sentido tenho-me aguentado a nível internacional, e com os anos a passar estou com uma mentalidade ainda mais desportiva, quero ganhar e aprender cada vez mais, evoluir e enfrentar novos desafios.

O que ambiciono, que é difícil, mas gostava de chegar a uma equipa oficial, não digo que é impossível, mas é difícil e o impossível para mim não existe, e por isso continuo a trabalhar.

Gostava de ter um programa ganhador no WRC2, são esses os meus objetivos, nos últimos anos entrei muito por essa vertente de ajudar os jovens, tenho tirado algumas formações a nível de coaching, porque nunca me quis só limitar a ditar notas e a fazer somente o papel de navegador. O que gostava era continuar a correr lá fora, e estar no WRC e ERC2, disse, falando depois de Pedro Almeida, o seu ex-piloto, pois já se sabe que este ano não vão correr juntos: “O Pedro foi muito inteligente no passo que deu, pois tal como muitos jovens que não começam a sua carreira pela categoria certa, o Pedro voltou atrás. Aí fizemos muito desse trabalho, implementámos um novo sistema de notas, reconhecer com menos passagens, entrámos num campeonato com pilotos que nos obrigavam a lutar mais e encarar os ralis com outro tipo de abordagem. O Pedro cresceu muito, mas questiono-me se cresceu o suficiente, porque eu acho que há coisas que têm de ser bem cimentadas. Mas na minha opinião acho que devíamos ter feito algo mais. Estávamos já capacitados a nível de condução e mental, mas é algo que ainda me questiono um bocadinho, mas respeito a decisão do Pedro em passar para os R5”, disse, falando depois das dificuldade dos jovens em singrar: “em Portugal há uma realidade, há falta de apoios para os jovens pilotos, há falta de uma estrutura de algo bem sustentado que possa ajudar jovens através da nossa federação, provavelmente em conjunto com o ACP, que é o que vimos noutros países, mas eu acho que essencialmente falta a algumas das pessoas perceber que isto é um processo, que leva tempo, pois é preciso passar determinadas etapas, e se queremos um dia ser campeões nacionais ou ir a um Europeu, ou a um Junior WRC, tem que se estruturar bem as coisas, e não pode haver desvios no plano.

Provavelmente vai haver mais dificuldades do que se pensava, mas o que acontece muitas vezes é que os jovens não têm os objetivos muito bem definidos. Querem chegar rápido, e depressa, estar a bater um Bruno Magalhães, um Armindo (Araújo) ou Zé Pedro (Fontes), mas é muito difícil chegar lá e vencê-los. A espaços podem dar luta, ganhar uma especial, estar próximos de ganhar um rali mas eu acho que não estão bem preparados para gerir uma prova nem a nível emocional, nem ao nível de condução, para chegar e vencer. Até podem ganhar um rali, mas têm que trabalhar muito.

As pessoas têm que perceber que quando se dá o passo têm que dar tempo, não se pode definir objetivos que não sendo inalcançáveis, vão colocar demasiada pressão neles próprios, têm que perceber que querem ganhar, querem lá chegar, mas têm que fazer uma carreira sustentada. Rali a rali, passo a passo, mostrar consistência, ganhar confiança.

O problema de muitos é mesmo isso, querem mostrar à primeira que são capazes e depois surgem as dificuldades de se afirmarem. É muito mais fácil haver problemas, os níveis de confiança baixarem e depois vem a espiral negativa. Falta a muitos jovens uma abordagem diferente para sustentar melhor as suas carreiras. É preciso definir uma estratégia, dizer que ‘este é o caminho que vou seguir’ não se desviarem, mesmo com altos e baixos, e continuar a acreditar e eu acho que falta um ‘bocadinho’ disso aos jovens, querem tudo muito rápido e não sabem esperar pelo seu tempo. Definir como objetivo um caminho por baixo acho que isso não é o melhor caminho nem a melhor mentalidade para um jovem”, disse.

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