Os Heróis silenciosos dos ralis, começamos com Paulo Fiúza: “navegador tem que ser um bocadinho de tudo”

Nos ralis, os pilotos são as estrelas, mas ao lado deles há alguém essencial para o sucesso: o navegador. Responsáveis por ditar o ritmo, através das notas de andamento, e muito mais do que a maioria acha que fazem, os navegadores são peças-chave, embora nem sempre recebam o reconhecimento merecido.
É por isso que este ano, damos início a um conjunto de conversas com navegadores, para os ficarmos a conhecer melhor, e também para ficarmos a saber melhor as nuances do seu trabalho.
Nesta entrevista, damos destaque a quem ‘nos mostra o caminho’ enfrenta o desafio de ser preciso a cada segundo, tal como os pilotos. O que é preciso para ser um bom navegador? Qual a característica essencial para o sucesso? Como tem evoluído este papel ao longo dos anos? Além disso, abordamos a pressão dos erros, o impacto na evolução dos pilotos e até o futuro da navegação num desporto onde a tecnologia não para de avançar.
Se sempre quis saber mais sobre os bastidores dos ralis, esta é a primeira de muitas conversas que vão mostrar o lado menos falado, mas fundamental, da competição.







Que é preciso para ser um bom navegador?
“Para já gostar muito do desporto e ter confiança na pessoa que vai a conduzir. Um navegador como eu costumo dizer tem que ser um bocadinho de tudo, tem que perceber de mecânica, tem que ser psicólogo, às vezes tem que fazer ‘baby sitting’ aos pilotos, sim, mas basicamente é isso.”
Qual achas ser a característica mais importante que o navegador tem que ter, entre as mais importantes?
“Para já haver uma boa ligação com o copiloto, e depois sentir bem o carro, porque o navegador pode cantar muito bem as notas, pode ditar muito bem as notas, mas tendo aquela sensação se vamos andar muito depressa, ou pouco, ou se vamos já nos limites, eu acho que isso é uma das funções mais importantes do navegador…
Nós quando vamos editar as notas, neste caso, mais nos ralis, nós temos que sentir todo o carro. Temos que sentir que a curva foi feita para a direita, a próxima será uma esquerda, porque em zonas muito encadeadas, nós temos que sentir isso no nosso corpo, é pelo feeling, e não pelo estar a olhar para a frente e ver as curvas.
Quando já estamos um bocadinho no limite, nós sabemos que já vamos no limite…”
Como tem sido a evolução do vosso trabalho ao longo destes anos todos?
“A evolução tem sido bastante grande, porque antigamente treinava-se muito, as notas eram tiradas e tirava-se ali uma semana de treinos. Agora estamos limitados às passagens, à velocidade dentro dos próprios troços, evoluiu na sequência de se filmarem bem os troços para em casa ter o tempo, ler as notas, ver tudo o que foi filmado haver sintonia entre piloto e navegador, além das notas também, as notas evoluíram muito, hoje em dia é mais fácil utilizar as notas de números, antigamente era as médias, rápidas, as notas evoluíram muito, os roadbooks em si também. Houve uma evolução bastante grande nesse sentido…”
Relativamente às coisas que se faziam no início, antes treinava-se agora reconhece-se…
“Sim, antigamente passavam-se 20 vezes – eu não sou muito dessa altura – muitas vezes em ritmo de prova, os carros de treinos eram muletos, muitos já muito idênticos aos de prova, hoje em dia há os muletos, mas não se pode fazer os treinos como antigamente.”
Resume tudo o que faz no navegador. Peço resumo porque faz muita coisa…
“Bom, desde preparar as notas, preparar os treinos, isso antes da prova. Depois na prova temos ali toda a parte de secretariado. Fazer as verificações, preparar os fatos, preparar a própria marcação de restaurantes para almoçar ou jantar, a horas próprias. No carro, desde os pequenos pormenores, levar uma balaclava suplente, porque se pode esquecer, cair, umas luvas, pressão de pneus, toda essa gestão, tentar sempre ter o máximo de comunicação com a assistência para saber o que é preciso fazer no parque de assistência porque o tempo é sempre reduzido, são sempre aqueles 20, 30 minutos, e quando chegamos precisamos de ter tudo ali preparado, e ter sempre uma solução para o que haja eventualmente de imprevisto e o navegador aí tem que ser a chave fundamental.
Falo por mim às vezes aquelas pequenas situações e nós temos de ser um bocadinho ‘Mac Gyver, e tentar resolver essa situação.”
Os pilotos fartam-se de errar nos troços, nunca ninguém liga, mas quando é o navegador a falhar, é muito mais fácil de apontar. Como é que vocês lidam com o erro?
“É assim eu pessoalmente lido mal! Quando eu falho – são poucas as vezes – mas quando falho, fico chateado comigo próprio, e penalizo-me muito a mim próprio. Agora claro, mas aí temos que ver tudo como uma equipa o piloto não pode pôr as culpas no navegador e saltar em cima fazer aquela pressão porque, como disseste e bem, isto é um bocado como o futebol, o ponta de lança pode falhar uma data de golos feitos e o guarda-redes faz um frango, e ele é que é falado. O navegador é um bocado isso, nós podemos fazer quase tudo perfeito e tentar o máximo ajudar o piloto, e depois podemos falhar numa nota, ou atrasarmo-nos numa nota ou dar uma nota mal, e haver ali uma consequência de perda de tempo, ou pior. Mas somos uma equipa, e quando há uma boa ligação entre piloto e navegador, isso fica para trás, o que se passa dentro do carro fica no carro. Não tem que sair cá para fora e isso aí é o mais importante.”
Que papel têm os navegadores na evolução dos pilotos?
“Quando são pilotos novos, que começam a fazer os seus primeiros ralis ou todo-o-terreno, quando andam com navegadores com experiência, sim, nós temos um papel fundamental a tentar chamar sempre um pouco à terra os pilotos, porque como se costuma dizer os pilotos, quando vão para os troços, vão sempre com uma fome muito grande. Vão com tudo e às vezes é preciso baixar ‘um trinco’ baixar um degrau, para estar ali mais seguros, fazerem os melhores tempos possível, e quanto mais quilómetros fizerem no início, melhor para eles, porque eles vão aprendendo com os quilómetros. Agora claro que sim o nosso papel nesse ponto, é bastante importante tentar ajudar o máximo na leitura de terreno dos pilotos, quando eles começam a ficar já naquela situação de que já pensam que sabem fazer, e não sabem, aí é que é a transição mais complicada, porque já pensam que sabem fazer as coisas e não sabem, e aí temos que tentar puxar um bocadinho o travão de mão, tentar descê-los à terra, e tentar explicar tudo o máximo possível. No nível de alinhamentos, a nível de pressão de pneus, pequenos pormenores que fazem depois a grande diferença.”
É frequente os navegadores incentivarem a aumentar o ritmo, ou o contrário, travar esse ímpeto?
“Sim, isso acontece quando nós estamos a ver que já está a passar um bocado das marcas, tentamos sempre travar um bocadinho o piloto, quando se vê que aquilo vai fluido, aí até largamos um pouquinho mais a corda. Damos alguma corda. Nós percebermos o andamento e quando se começa a perceber que já se apanhou um susto numa curva, apanhamos outro noutra a seguir e já começamos a perceber que o andamento está a ser um bocadinho mais para lá do que era certo e aí, sim, temos que temos que chamar o piloto um bocadinho à terra”.
Para finalizar, com tanta tecnologia a mudar, o que achas que pode mudar no papel do navegador no futuro?
“O papel de navegador vai ser sempre importante, a tecnologia claro que vai ajudar muito, mas eu acho que continua a ser importante, o papel navegador nos ralis continua a ser igual, não vai mudar, no todo o terreno, sim, com a evolução dos tablets com a parte toda de road-books digitais, aí poderá mudar um bocadinho, mas basicamente acho que vai continuar a haver falta de navegadores e vai ser preciso sempre navegadores tanto nos ralis como no todo-o-terreno”.
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