Entrevista a Ricardo Domingos (Domingos Sport): “Falta-nos algo mais, mas estamos a trabalhar para lá chegar”
A Domingos Sport é uma estrutura de Alcanena, Santarém, que assiste e prepara carros de ralis. A equipa tem vindo a crescer a olhos vistos e no recente Rally de Lisboa assistiu… 17 carros. Conversámos um pouco com Ricardo Domingos, líder da equipa…
Estivessem os ralis em Portugal ao nível de pilotos como estão as estruturas que os suportam, e as coisas estariam ainda melhores! A paixão pelos ralis em Portugal reflete-se de diversas formas e para muitos que não têm a possibilidade de a explanar de volante na mão ou a ‘cantar’ notas, não é muito menor a adrenalina de um mecânico quando o ‘seu ‘ carro chega a assistência. Como se de um bebé se tratasse!
Como exemplo podemos dar a Domingos Sport, que no fim de semana do Rally de Lisboa assistiu nada menos, nada mais do que 17 carros. É algo pouco visto em Portugal…
Nesse contexto, e até que para além do visível sucesso da equipa, há outros temas importantes para discutir, conversámos um pouco com Ricardo Domingos, líder da Domingos Sport, que para além da sua equipa, tem contribuído também para tentar melhorar os ralis em Portugal, tentando com a federação e com os pilotos chegar a uma plataforma que seja mais confortável para todos e que acabe de uma vez por todas com os atuais altos e baixos que se têm visto nos ralis em Portugal.
A Domingos Sport é uma estrutura que tem vindo a crescer muitos nos últimos anos, tendo no recente Rally de Lisboa, assistido um surpreendente número de 17 carros. Quase 100% dedicados aos ralis, têm vindo a crescer paulatinamente como estrutura, na direta proporcionalidade que novos pilotos mostram a sua confiança no trabalho da equipa.
Começaram em 2000 com o Luís Mota, um piloto que não necessita de qualquer tipo de apresentação e que milita nos ralis em Portugal desde 1999, tendo já bem mais do que 300 ralis no palmarés e vários títulos pelo meio.
Desde aí, e do tempo em que Ricardo Domingos navegava Luís Mota no Opel Kadett GSI 16v, já lá vão mais de duas décadas, em que a confiança foi crescendo e com ela o desenvolvimento da equipa.
Neste caminho, alcançaram até aqui inúmeros títulos de regionais, Campeonatos de Clássicos, Open, duas rodas motrizes, e agora trabalham para chegar a algo mais.
Entre vários assuntos que conversámos com Ricardo Domingos, líder da equipa, conta-se a questão dos Campeonatos Promo e Start, em que o homem forte da Domingos Sport tem sido um elemento aglutinador pois tem vindo a trabalhar na defesa dos interesses comuns dos pilotos que representa, e não só: “Temos-nos dedicado à competição, que é o nosso trabalho praticamente a 100% nos ralis, os clientes vão-nos procurando pelo nosso trabalho, pela forma como estamos na competição, que é sempre de forma humilde respeitando toda a gente seja um piloto que venha para se iniciar ou um piloto que venha com um carro mais modesto, seja alguém que queira estar no topo.
Nós trabalhamos para todos da mesma forma, e penso que possivelmente por isso e pelo ambiente que vivemos dentro da equipa, que é um ambiente familiar, é que chegámos onde estamos, e que as coisas estão a levar o rumo que estão agora” começou por dizer Ricardo Domingos, que arrancou com a sua equipa em 2000 com o Luís Mota, no saudoso Regional Oeste, quando Mota ainda guiava o Opel Kadett GSI 16v, e que tinha um jovem navegador chamado… Ricardo Domingos: “ depois foram aparecendo mais um ou outro cliente, mais tarde, quando surgiu o Fernando Teotónio foi quem espoletou um bocado mais a equipa para o sucesso, porque os resultados apareceram, e quer queiramos quer não, uma equipa pode ser muito boa mas se não tiver um piloto de nome e que eleve a equipa, nunca se consegue chegar a lado nenhum…
Nós somos o que somos derivado aos nossos pilotos e também porque temos tido a sorte de ter pilotos bastante bons e rápidos, que nos têm ajudado nesse sentido”, começou por dizer Ricardo Domingos, cuja equipa, nestes 20 anos somou muitos títulos, mas o seu fundador… já lhes perdeu a conta, o que é um excelente sinal, pois são tantos que se tornam difíceis de contar: “títulos regionais, Campeonatos de Clássicos, Open, duas rodas motrizes, sei que temos muitos títulos, não consigo quantificar quantos, mas sei que são muitos…”, disse Ricardo Domingos, que admite ainda mais crescimento para a Domingos Sport: “Falta-nos algo mais, confesso, queremos e estamos a trabalhar para lá chegar. Mas passo a passo sem querer ter a fasquia demasiado alta…”
17 carros no Rally de Lisboa
Para que se perceba um pouco até onde já chegou a Domingos Sport, e a confiança que recebe de muitos e variados pilotos de ralis, no recente Rally de Lisboa, a estrutura de Alcanede teve a assistir 17 carros: “é efetivamente um risco, eu sei que é, para ter o controlo de tudo isto conseguir lidar com todas as pessoas, porque somos solicitados para isto, para outra situação porque um cliente precisa disto ou daquilo é preciso ter um grande controlo para que nada falhe, é difícil.
Mas quisemos abraçar este desafio, este objetivo, foi uma pressão que colocámos sobre nós próprios, e correu bem, como nós idealizamos.”
Assistir 17 carros num rali não é tarefa fácil, ainda mais com carros tão diversificados como os que correm na Domingos Sport: “para trabalhar connosco é muito simples. Respeito e humildade. Respeito parte a parte, nós respeitamos os pilotos e navegadores e eles respeitam-nos a nós, e humildade, porque não aceito que nenhum piloto ou navegador, se sobreponha ao mecânico, a quem está a colocar o combustível, o trabalho tem de ser em equipa e de forma igual e penso que o bom ambiente que se vive na equipa é um bocado a base do sucesso, por assim dizer”.
No Rally de Lisboa, era 22 pessoas na estrutura a assistir 17 carros: “desde quem trata do catering, quem faz as inscrições nas provas e está nas provas a tratar de toda a logística, as pessoas que estão a colocar combustível, que são cinco, com os abastecimentos remotos, os mecânicos que temos, para lá das que subcontratamos, e tenho que agradecer muito a estas pessoas porque sem eles era impossível.
E não é só pelo dinheiro que vêm ganhar, é também pela grande paixão que têm pelos ralis, é graças a eles que estamos aqui porque sozinhos ninguém consegue fazer nada.
Somos muito, muito gratos a quem nos ajuda…
Para onde ‘vão’ os ralis?
Outro tema muito importante para Ricardo Domingos é o facto de conhecer muito bem a realidade de quem está nos ralis com menos meios, mas com a mesma paixão, ou ainda mais, que todos os outros.
Porque a viveu desde o princípio, e sentiu na pele aquilo que hoje defende para os ralis em Portugal.
Como se sabe, há um braço-de-ferro entre um conjunto de pilotos, especialmente do novo Campeonato Promo de Ralis, e um pouco também do novo Campeonato Start de Ralis, que tem sub-divisões em Norte, Centro e Sul.
O ano passado os regionais estavam divididos em Norte, Centro e Sul, mas este ano a FPAK decidiu reestruturar os campeonatos, criou um ‘Promo’ com 10 provas e três Start, onde só podem correr duas rodas motrizes.
Se até 2021 sempre tem havido críticas quanto ao modelo, número e quantidade de provas que realizam, este ano as críticas subiram muito de tom ao ponto de termos chegado a ver ralis adiados por falta de ‘quorum’ e boicotes dos principais pilotos dos Promo às provas da competição realizadas com o CPR.
As queixas são por demais conhecidas, não vale a pena recordá-las, mas desta feita tudo indica que as partes têm mesmo de se sentar, discutir e encontrar uma solução.
Como está dificilmente pode ficar: “Quando se começou a desenrolar toda esta situação, nós, Domingos Sport e alguns pilotos juntámos-nos para fazer ver à federação qual era a vontade dos pilotos, o que é que os pilotos realmente pretendiam, e sinceramente…faço competição federado desde o ano 2000 e há uma coisa que sempre me chateou imenso, as pessoas não serem tratadas de forma igual, e nas provas do ‘nacional’ isso mexia muito comigo, via um tratamento muito diferenciado, os pilotos do ‘nacional’ passavam nuns troços, no fim repetiam os troços e os pilotos do regional só passavam no fim das segundas passagens nos troços.
Mais do que isto, a entregas de prémios, além das estradas estarem sujas, além de quando passavam os pilotos do regional já não estava ninguém na estrada, as entregas de prémios era quando já não havia ninguém.
Davam-lhes o nome dos ‘sem abrigo’, e isso revoltava-me imenso, é óbvio que quem tem um orçamento de 200 ou 300 mil euros por ano para correr ao mais alto nível, tem de ser valorizado por isso, temos que nivelar por cima, temos que respeitar muito essas pessoas, a competição precisa deles e muito.
Mas não podemos deixar de respeitar quem está mais embaixo.
Existe uma pirâmide nos ralis e a base tem que ser mais sustentada, é os carros mais fracos, é as pessoas que vêm dos regionais, que gostavam e gostam de fazer ralis, para mim toda a gente tem que ter oportunidade de fazer ralis. Nem que seja um rali por ano.
Como há muita gente, que faz por exemplo as Camélias ou o Rali de Lisboa e não fazem mais nenhum.
E as coisas aconteceram um bocado por aí. Então, juntámos uma série de pilotos, algumas equipas que participavam em ralis do regional, falámos, chegámos a um consenso daquilo que a maioria pretende, porque acho que assim é que deve ser, democracia é assim que funciona, fizemos chegar à federação um documento com o que pretendemos, e fazer entender à federação que o Start e o Promo, separados como estavam, não iria funcionar, e não temos mercado para ter um CPR, Promo, Start, tentar fazer a FPAK perceber que as coisas não podem ser feitas desta forma.
A federação entendeu que tinha de ser como queriam, então os pilotos decidiram unir-se e dizer que não queremos estar juntos com o CPR, pelo menos nos moldes em que estão, não faz sentido.
As pessoas que querem fazer provas com o CPR pondera-se poder fazer isso, mas tem de ser com equidade.
Ser tratadas de forma igual. OK, os Promo podem fazer menos troços, ter menos tempo de antena na imprensa, mas queremos ter o mesmo tratamento, e a partir daqui é que as coisas se desenvolveram para o que está a acontecer.
Agora é conversar com a federação relativamente ao que pretendemos para o próximo ano e a partir daí vermos como fica. Queremos fazer parte da solução e não do problema.
Queremos que as coisas melhorem porque todos temos a ganhar com isso, até mesmo os pilotos do ‘nacional’.
Nós vimos por exemplo na última prova do CPR no Rali de Castelo Branco, eu penso que para quem está no campeonato, e que tem patrocinadores e que quer levar os patrocinadores às provas, ter um rali com 20 carros a chegar ao fim, acho que não é positivo, se tiver 40 ou 50, é muito melhor chegar aqui a um parque de assistência ver os carros e a festa do que são os ralis, verdadeiramente”, disse Ricardo Domingos que dá a sua contribuição para um processo, que permitiu uma união quase singular dos pilotos de ralis em Portugal.
FPAK Junior Team é boa novidade
Mas nem tudo são críticas que Ricardo Domingos endereça à FPAK. Este ano, por iniciativa da federação, nasceu o FPAK Junior Team, uma competição para jovens pilotos de ralis até aos 25 anos, maioritariamente paga pela FPAK, em colaboração com um conjunto de equipas. Uma novidade muito boa para os ralis em Portugal que bem precisam de jovens a aparecer: “Muito boa, essa é daquelas coisas que em muito tempo não me lembro de ter visto a federação ter feito algo igual em Portugal. Pelo menos não me lembro.
Houve algumas coisas como o ‘Onde está os Às’, agora como iniciativa da federação não me lembro de algo assim, e a federação está mesmo de parabéns, vimos agora jovens aparecer em Castelo Branco e Viana do Castelo, e jovens com muito valor, com muita margem para progredir, e eu acho que é desta forma que conseguimos potenciar, sem descrédito, sem tirar o mérito de quem quer que seja, nós não podemos só ter pilotos com mais de 40 anos a discutir o campeonato nacional.
Temos neste momento o Miguel Correia, todos os outros têm mais de 40 anos.
Atenção que são pessoas com muito valor, Deus queira que façam ralis até ao 60, mas nós temos que ter jovens, eu acho que nós para podermos ambicionar algo mais, para não cairmos em descrédito quando cá vêm pilotos estrangeiros, devemos potenciar realmente os jovens que temos em Portugal.”