A História dos pilotos de F1 que pagaram o ‘preço final’

Por a 8 Abril 2024 15:40

Ainda no Japão, Charles Leclerc recordou Jules Bianchi, que perdemos em 2015, na sequência de um acidente, uns meses antes em Suzuka. O desporto automóvel é uma paixão perigosa. Os acidentes acontecem – nada há que os possa totalmente evitar, até porque um dos intervenientes se chama Homem e, como tal, é falível e imprevisível, tal como as máquinas de competição. A segurança é atualmente uma prioridade e uma conquista do desporto automóvel, ainda que continuem a suceder acidentes trágicos, mas nem sempre assim foi.

Desta forma, recordamos alguns vultos do automobilismo de competição, que desapareceram, vítimas da sua paixão, pagando o mais alto preço: com a própria vida. A todos eles, famosos, ilustres, desconhecidos, esquecidos – a nossa mais sincera homenagem e um enorme agradecimento. Porque foi pelo seu sacrifício que tantas outras vidas se salvaram. Nas pistas e nas estradas de todo o mundo.

De Depailler a Alboreto

Ainda tinha o AutoSport poucos anos de vida, e já muitos pilotos tinham dado o melhor de si mesmos, no altar das pistas e das florestais. Alguns deles já eram famosos, tinham carimbado com feitos e perseverança a sua passagem por este desporto, tão cruel como apaixonante. Recordemos alguns:

Patrick Depailler (09-08-1944/01-08-1980). Piloto de F1, viciado em adrenalina – quando não estava a correr, estava a divertir-se em asa delta ou noutros desportos radicais. Conduziu para a Tyrrell, mas foi numa sessão de testes privados com um Alfa Romeo que perdeu a vida, na curva Oeste do antigo Hockenheim, quando se despistou, sem sinais de travagem.

Riccardo Paletti (15-06-1958/13-06-1982). Sem grande palmarés nas fórmulas de promoção, chegou à F1 porque o seu pai era o dono da Pioneer na Itália. Era o único que usava óculos e terá sido essa dificuldade em ver que provocou o embate no Ferrari de Pironi, que ficou parado na grelha na largada para o GP do Canadá. A sua mãe assistiu à sua morte, pois ele tinha-a convidado para o seu 24º aniversário, que era dois dias mais tarde.

Attilio Bettega (19-02-1953/02-05-1985). Um dos grandes pilotos da Lancia, embora nunca tenha ultrapassado o estatuto de privado. Morreu na Volta à Córsega, exatamente um ano antes de Toivonen, quando o 037 que tripulava se despistou e um ramo de árvore esmagou o seu lado do habitáculo.

Stefan Bellof (20-11-1957/01-09-1985). Alemão, a sua passagem pela F1 foi meteórica. Entrou a vencer na F2, com um Maurer e, em 1984, com um Tyrrell, esteve quase a ganhar o ‘tal’ GP do Mónaco, sob chuva, que toda a gente diz que seria de Ayrton Senna – esquecendo-se que Bellof, que vinha atrás, estava mais rápido. A sua morte nos 1000 Kms de Spa fê-lo entrar na lenda – embateu no muro de suporte das bancadas no início do Radillon, quando tentava ultrapassar o seu colega de equipa Jacky Ickx, ambos em Porsche 962C. A manobra era impossível e só um piloto corajoso e destemido como Bellof poderia tê-la tentado!

Didier Pironi (26-03-1952/23-08-1987). Quase ficou sem pernas num acidente nos treinos para o GP da Alemanha, em tudo igual ao que, semanas antes, tinha ceifado a vida ao seu colega de equipa na Ferrari, Gilles Villeneuve. Nunca mais correu em F1 e voltou-se para os barcos de competição. Morreu numa prova ao largo da Ilha de Wight, quando o Colibri, barco que ele próprio tinha feito, com base nas suas dificuldades físicas, se desfez ao enfrentar uma onda cruzada; com ele, morreu toda a equipa do barco.

Roland Ratzenberger (04-07-1960/30-04-1994). Este austríaco foi o outro piloto que morreu no mesmo fim de semana de Ayrton Senna. Ao volante do medíocre Simtek, na volta antes do acidente fatal perdeu parte de uma asa da frente, que se quebrou em definitivo após a passagem pela Tamburello, quando seguia a mais de 300 km/h.

Michele Alboreto (23-12-1956/25-04-2001). Um dos últimos gentlemen na F1, mostrou a sua validade na Tyrrell, onde foi o vencedor do último GP para a Cosworth. Foi o primeiro italiano a assinar pela Ferrari em muitos anos e a sua carreira foi aí destruída. Recuperou-a em provas de Sport, não sobrevivendo a um acidente na nova pista de Lausitzring, quando testava um Audi R8.

Os menos desconhecidos

Mas o martirológio do automobilismo é composto por largos milhares (cerca de quatro mil) de nomes: o primeiro de que há notícia, foi Émile Levassor, a 14 de abril de 1897; o mais recente, Dan Wheldon, que morreu no passado domingo, em Las Vegas. Alguns deles, ilustres desconhecidos – mas também alguns ilustres, conhecidos mas muito esquecidos. Pais e filhos, marido e mulher, jovens entre os seis e os 88 anos. Exemplos?

Rolf Stommelen (11-07-1943/24-04-1983). O amigo de Domingos Piedade, protagonista do acidente que acabou com a velha pista de Montjuich, em 1975 e que morreu pilotando o monstruoso Porsche 935, quando se quebrou a asa traseira, em Riverside.

Manfred Winkelhock (06-10-1951/12-08-1985). Piloto mediano na F1, a sua morte foi chocante, na medida em que foi uma tampa de esgoto elevada que provocou o despiste do Porsche 962C em Mosport.

Jo Gartner (24-01-1954/01-06-1986). Piloto de F1 na Osella, morreu durante a noite, nas 24 Horas de Le Mans, carbonizado no início da recta de Mulsanne, porque era impossível abrir as portas do Porsche 962C capotado.

Paul Warwick (29-01-1969/21-07-1991). Irmão mais novo de Derek Warwick, morreu num acidente em Oulton Park, ao volante do mesmo carro com que Pedro Chaves tinha sido Campeão no ano anterior. Declarado vencedor da prova, foi o primeiro campeão a título póstumo da história da F3000.

Denny Hulme (18-06-1936/04-10-1992). Campeão do Mundo de F1, foi vitimado por um ataque cardíaco, nos 1000 Km de Bathurst. O piloto estacionou o seu BMW M3 fora da pista, encostou a cabeça ao volante e morreu.

Scott Brayton (20-02-1959/17-05-1996). Norte-americano, embateu fatalmente no muro de Indianapolis, em resultado de um furo, dois dias após ter feito a pole positon para as 500 Milhas de Indianapolis.

Jeff Krosnoff (24-09-1964/14-07-1996). Morreu numa prova da IndyCar, na pista urbana de Toronto, quando o seu carro levantou voo ao tocar as rodas de outro, desfazendo-se contra as redes de proteção. Os destroços provocaram também a morte do comissário canadiano Gary Avrin.

Gonzalo Rodríguez (22-01-1972/11-09-1999). Uruguaio, está no panteão dos heróis daquele país sul-americano, sem tradição no automobilismo mundial. Correu na Europa e estava na F3000, com o apoio da Marlboro, onde era vencedor, quando foi convidado para fazer uma corrida em Laguna Seca, na IndyCar. Os travões falharam na curva do Saca Rolhas, o seu monolugar seguiu em frente e bateu nos rails, passando para o lado de lá, com o piloto morto no interior, por quebra do pescoço.

Greg Moore (22-04-1975/31-10-1999). Canadiano, tinha um grande futuro à sua frente, talvez até na F1, onde era visto como sucessor de Gilles Villeneuve. Perdeu a vida na última prova da temporada, na oval de Fontana: o seu carro entrou em pião no “infield”, ressaltou num pequeno monte e desfez-se contra o muro de cimento.

Adam Petty (10-07-1980/12-05-2000). A quarta geração da família Petty, onde pertence “The King” Richard Petty, o piloto que mais provas de stock cars venceu. Morreu aos 19 anos, na oval de New Hampshire. Não há quinta geração.

Dale Earnhardt (29-04-1951/17-02-2001). “Mister Nascar”, a sua pista preferida era Daytona. Foi aqui que morreu, num embate inócuo na última volta das 500 Milhas: o embate de frente, seco, no muro, foi-lhe fatal, por deslocamento do bolbo cerebral.

Tony Renna (23-11-1976/22-10-2003). O último piloto de automóveis a morrer em Indianapolis. Estava a fazer um teste de pneus, já em preparação para a temporada seguinte, quando um deles rebentou. A sua morte foi imediata.

Paul Dana (15-04-1975/26-03-2006). Jornalista, foi o penúltimo piloto de IndyCar a morrer. O seu acidente foi um equívoco: percebeu mal as indicações do seu spotter e desceu a oval de Homestead, acertando no carro de Ed Carpenter. Não sobreviveu.

Lista (quase) infindável

A lista quase não tem fim. É assustadora – sem contar com os pilotos que morrem, quase todas as semanas, em acidentes em corridas locais, há que contar ainda com outros, desaparecidos em circunstâncias tão trágicas como inesperadas. Estou a lembrar-me de Thierry Sabine, que desapareceu num acidente de helicóptero, durante o ‘seu’ Dakar, em 1986; e, por falar em acidentes deste tipo, recordo também Colin McRae, campeão do Mundo de Ralis em 1995 e um dos mais queridos e espetaculares pilotos de ralis de sempre, que morreu em 2007; e de Nigel Harris (navegador de Malcolm Wilson) e Henry Liddon (vencedor do Monte Carlo de 1964, ao lado de Paddy Hopkirtk), quando o helicóptero em que acompanhavam o Rali do Bandama em 1987 se despenhou.

Ou, ainda, o jovem sueco Lars-Erik Thorp, investido pelo Lancia Delta de Alex Fiorio quando assistia ao Rali de Monte Carlo de 1989. A lista é quase infindável, como disse – mas ainda há espaço para recordar dois nomes que desapareceram, não vítimas de acidente, mas consumidos pela doença mortal: o piloto sueco de F1, Gunnar Nilsson, em 1978 e, em 2005, o britânico Richard Burns, campeão do Mundo de Ralis de 2011. Ambos tinham pouco mais de 30 anos e muito para dar ao desporto que adoravam. Que todos eles, sem exceção, estejam a descansar em paz. As fotos que vai ver são os rostos de alguns dos pilotos, carros que guiaram, numa lista que não pretende ser exaustiva, mas simplesmente recordar alguns pilotos que já nos deixaram…

Hélio Rodrigues, In Memoriam

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