Grande Prémio de Espanha de Fórmula 1: A perfeição de Hamilton
O Mercedes W11 EQ Power+ é sem dúvida o monolugar mais competitivo do Campeonato do Mundo de Fórmula 1 de 2020, mas, em corrida, a diferença para o Red Bull RB16 Honda não é tão grande como por vezes os resultados fazem crer e é Lewis Hamilton que está a fazer a diferença, como se viu com o seu triunfo no Grande Prémio de Espanha deste ano.
A Mercedes chegava ao Circuit de Barcelona – Catalunya depois de uma pesada derrota no Grande Prémio do 70º Aniversário em que, com o muito calor que se fez sentir em Silverstone, não conseguia manter os pneus em boa forma sempre que tentava rodar em ritmos competitivos.
Os homens da formação de Brackley encaravam a sexta etapa da época deste ano sem grandes certezas quanto aos problemas que sentiram e, com a canícula mediterrânica a invadir a pista de Montmeló (as temperaturas roçaram os 50ºC na pista), o receio de voltar a experimentar as dificuldades do fim-de-semana anterior estava bem presente entre eles, apesar de para a corrida espanhola a Pirelli ter optado por pneus um degrau mais duros que na segunda prova disputada em solo britânico.
Face às condições, a estratégia de duas paragens ganhava força na segunda sessão de treinos-livres e a suspeita de que Max Verstappen poderia ser uma ameaça para os Mercedes verificava-se, com o ritmo de corrida do Red Bull número trinta e três a quedar-se a apenas 0,2s por volta daquilo que os “Flechas Negras” conseguiam.
Este era uma diferença que deixava o holandês em contenção pela vitória devido à forma mais branda como o carro de Milton Keynes trata os pneus.
Em ritmo de qualificação a vantagem dos Mercedes era bem maior, sendo esta superioridade apontada aos modos de qualificação, que a FIA pretende interditar a partir do próximo Grande Prémio, que se disputa em Spa-Francorchamps no dia 30 de Agosto.
Como se esperava, na qualificação os Mercedes não deram hipóteses aos seus adversários, tendo monopolizado a primeira linha da grelha de partida, com vantagem para Lewis Hamilton que bateu Valtteri Bottas para conquistar a sua nonagésima segunda pole-position.
Na manhã de domingo surgiram rumores de que a Mercedes não teria usado os seus modos de qualificação durante a tarde de sábado para mostrar à FIA que as intenções desta não alterarão o panorama competitivo da actual Fórmula 1. Contudo, este boato não é consistente com os tempos verificados ao longo da qualificação, tendo o ritmo dos carros de Brackley dado um salto da Q2 para a Q3 coerente com o que se verificou até agora – uma subida de 0,3 pontos percentuais face ao Red Bull…
No domingo, como era esperado, a temperatura do asfalto rondava os 50ºC e a gestão dos pneus seria preponderante para o decorrer da corrida, até porque os dez primeiros alinhavam na grelha de partida com pneus macios usados, o que basicamente tornava a opção de uma estratégia de uma paragem uma impossibilidade.
Foi com este cenário que se deu o arranque e, enquanto Hamilton executava na perfeição a sua partida, Bottas sofria um pesadelo nos primeiros metros, perdendo posições para Verstappen e Lance Stroll, sendo ainda acossado por Sérgio Pérez.
O finlandês arrancou do lado sujo da pista e isso não foi benéfico para o seu esforço – entre os dez primeiros três pilotos perderam posições e apenas Pierre Gasly ganhou lugares – mas ainda assim, para se bater com Hamilton tem de ultrapassar as contrariedades e ver um Racing Point passar para a sua frente, condicionou completamente a sua corrida.
Enquanto o Campeão do Mundo geria os seus pneus, o Bottas via-se obrigado a esforçar os delicados macios com que tinha realizado a qualificação para ganhar o lugar que perdera para Stroll, o que conseguiu na quinta volta, e, depois, recuperar terreno para Verstappen de modo a colocá-lo sob pressão.
O seu colega de equipa tinha de fazer pela vida para se colocar em contenção pelo seu lugar, mas Hamilton realizava as primeiras voltas com pinças na tentativa de preservar a saúde dos seus pneus. Nas primeiras dez voltas, o inglês permitiu que Verstappen rodasse a cerca de segundo e meio, mas a partir de então, a situação mudava substancialmente.
O Campeão do Mundo aumentou o ritmo, mostrando o jogo, e, até à paragem do holandês, na vigésima primeira volta, abria uma vantagem de mais de sete segundos, sublinhando que estava no controlo da gestão dos pneus, quando o piloto da Red Bull se queixava de que os seus macios usados não proporcionavam já a aderência que desejava.
Mais atrás, sem argumentos para suplantar o Red Bull em pista, Bottas manteve-se a cerca de dois segundos de Verstappen até à paragem deste, com o intuito de proteger os seus pneus e nas paragens nas boxes tentar recuperar o segundo lugar, mas o finlandês não conseguiu executar o plano.
Verstappen bateu Bottas
A equipa de Milton Keynes surpreendeu a Mercedes, defendendo-se do “undercut”, mas os homens da formação de Brackley tentaram realizar o “overcut”, parando ambos os seus pilotos na vigésima terceira volta – duas depois de Verstappen.
Contudo, se a tarefa de Bottas não era fácil, este também não conseguiu aumentar o seu ritmo, perdendo seis décimos de segundo para o seu colega na vigésima primeira volta e um segundo na de entrada nas boxes, o que demonstra bem a discrepância entre ambos. O esforço que pedira aos seus pneus no início da corrida estava agora a ser pago.
Com a primeira ronda de paragens nas boxes completadas entre os três primeiros, Hamilton continuava na primeira posição, agora com quatro segundos de vantagem para Verstappen, e Bottas mantinha-se no terceiro lugar também a quatro segundos do holandês.
Enquanto o líder permitia uma aproximação do seu perseguidor, o finlandês começava assim que deixava as boxes a aproximar-se do seu perseguido, chegando a estar a apenas 1,6s do piloto da Red Bull, estavam decorridas cinco voltas após a sua passagem pelas boxes.
A partir de então a diferença entre os dois variou ao sabor das dobragens, mas sem que Bottas alguma vez estivesse em condições de suplantar o jovem da formação de Milton Keynes.
Quando na trigésima nona volta o finlandês se colocou a um segundo e meio do holandês, perfilando-se para realizar o “undercut”, a Red Bull reagiu, chamando Verstappen para realizar a sua segunda e última paragem nas boxes na quadragésima primeira.
Se a preocupação com Hamilton era ligeira, bastava dar-lhe os pneus necessários para terminar a corrida no momento certo, tinha cavado uma vantagem de dez segundos para o holandês, já com Bottas a Mercedes precisava de encontrar uma forma de lhe permitir recuperar o segundo posto e, dessa forma, limitar os danos na luta pelo título com o seu colega de equipa.
Os estrategas da estrutura de Brackley mantiveram o finlandês em pista por mais sete voltas, tentando garantir-lhe a distância necessária para montar um jogo de pneus macios usados que lhe permitissem suplantar Verstappen.
Bottas saiu das boxes a sete segundos do seu objectivo, mas a estratégia escolhida pela Mercedes para o seu piloto nunca deu verdadeiramente frutos e o máximo que Bottas conseguiu foi ficar a 5,2s de Verstappen, na sexagésima terceira volta, ficando claro que a dobradinha há muito que tinha sido perdida.
A equipa dos “Flechas Negras” assumiu na sexagésima quarta volta a derrota na batalha pelo segundo lugar, chamando Bottas à boxe para montar pneus médios novos e garantir a volta mais rápida, o que foi conseguido.
Por seu lado, Hamilton, depois da sua segunda troca de pneus, montou médios na quinquagésima volta, ampliou a sua vantagem para Verstappen cruzando a linha de meta com uns impressionantes vinte e quatro segundos de distanciamento.
Uma vez mais, o inglês executava todo o plano de corrida na perfeição, gerindo os pneus de forma magistral, o que lhe permitiu colocar-se ao abrigo da “ameaça Verstappen”.
Já Bottas, colocou-se numa posição de inferioridade logo no arranque e sem a possibilidade de gerir as borrachas da Pirelli num dia em que isso foi determinante, não conseguiu recuperar o seu segundo lugar na grelha de partida.
Ficou o demonstrado, novamente, o porquê do finlandês não conseguir montar um verdadeiro desafio a Hamilton na luta pelo título – é que para bater o inglês é preciso raiar consistentemente a perfeição e Bottas vai deixando algumas imperfeições aqui e ali, como ficou demonstrado no Grande Prémio de Espanha…