GP do Qatar de F1: Uma oportunidade que Alonso não deixou escapar

Fernando Alonso regressou aos pódios, depois de mais de sete anos, e a sua performance não foi fruto do acaso e de uma carambola que tivesse atirado carros mais competitivos para fora de pista, deveu-se antes a uma estratégia de risco que foi magistralmente colocada em prática pelo piloto da Alpine, aproveitando a subida de forma que os carros do construtor francês mostraram no Grande Prémio do Qatar.

O regresso do espanhol à Fórmula 1 só pode ser considerado um sucesso – tem mostrado velocidade, capacidade de gestão e o seu tradicional instinto de corrida, características que lhe permitem, no mínimo, explorar o potencial do material colocado à sua disposição e, não poucas vezes, suplantá-los.

No entanto, faltava-lhe aquele resultado que sobressaísse e que desse significado às performances notáveis que tem vindo assinar ao longo do ano – quem não se lembra de Silverstone ou Hungaroring – e em Losail, finalmente, o destino não o desfavoreceu e conquistou um pódio, que até já poderia ter acontecido em Sochi, com uma prestação a que estamos habituados a ver em Alonso – a não desaproveitar nenhuma oportunidade.

Desde sexta-feira que era evidente que o Alpine A521 estava particularmente à-vontade em Losail, com muitas curvas de apoio de média – alta velocidade, muito semelhante àquilo a que Hungaroring se tornou com a mais recente geração de carros, e no traçado magiar os carros do construtor gaulês mostrou-se muito competitivo, tendo até Esteban Ocon vencido, ainda que ajudado pelas circunstâncias.

Para além disso, Alonso adorou o traçado catarí e isso notou-se nos seus resultados, assegurando o quinto lugar na qualificação a uns inexpressivos trinta milésimos de segundo de Pierre Gasly, que conquistava a pole-position do Segundo Pelotão aos comandos de um Alpha Tauri que continuava a evidenciar uma performance prodigiosa.

Com as penalizações de Max Verstappen e Valtteri Bottas – devido a incidentes com bandeiras amarelas provocadas pelo francês, que partiu a asa do seu monolugar na sua derradeira volta lançada da Q3 – o gaulês e o espanhol eram promovidos ao segundo e terceiro lugares, respectivamente, deixando-os numa posição privilegiada para conseguirem bons resultados.

No entanto, e apesar de as ultrapassagens poderem ser difíceis em Losail, esperava-se que o holandês e o finlandês pudessem recuperar as suas posições naturais e até Sérgio Pérez, que não conseguira passar à Q3 e arrancava de décimo primeiro.

Mas fosse como fosse, se quisesse acalentar alguma possibilidade de subir ao pódio, Alonso teria, antes de mais, de lidar com Gasly.

O espanhol não deixou os seus créditos por mãos alheias e no arranque, depois de se defender de Verstappen, que arrancou quem nem um foguete da sétima posição, lançou um ataque ao francês, assinando uma ultrapassagem magistral, por fora, na longa Curva 2, assumindo o segundo lugar – a primeira batalha estava ganha, havia agora que ver como seria a recuperação do holandês, de Bottas e Pérez.

Depois de um bom arranque, que o deixou em quarto, o líder do Campeonato de Pilotos rapidamente chegou a segundo, na quinta volta, deixando o segundo posto de ser uma opção para Alonso, com as duas primeiras posições entregues aos rivais na luta do ceptro deste ano.

Porém, conter o avanço dos escudeiros destes continuava a ser uma opção, sendo essa a única possibilidade de o piloto da Alpine garantir um lugar no pódio, estando ao abrigo de qualquer veleidade dos pilotos das outras equipas do Segundo Pelotão, dado que neste grupo ninguém o conseguia acompanhar.

Pérez era nono no final da primeira volta e mostrava-se bastante aguerrido, ao passo que Bottas, parecia uma vez mais condicionado por estar no meio do pelotão, e caía de sexto para décimo primeiro.

As ultrapassagens revelavam-se menos difíceis do que o esperado, e Pérez ia ganhando posições, mas o desgaste dos pneus continuava a ser uma preocupação, havendo ainda dúvidas quanto à melhor estratégia, se uma ou duas paragens.

A Pirelli garantia que uma passagem nas boxes para trocar de borrachas não era aconselhável, apontado para duas e os pneus macios que Alonso usava atirava-o para esse sentido.

Pérez e Bottas rodavam com médios, usados no caso do finlandês por ter chegado à Q3, o que lhes dava maior flexibilidade estratégica.

No entanto, entre os três, foi o mexicano o primeiro a parar, estavam cumpridas dezanove voltas, montando um jogo de duros novos, que o deixavam na fronteira entre ter de voltar a entrar nas boxes ou seguir definitivamente até ao fim.

Antes da sua primeira troca de pneus, o piloto da Red Bull estava já no quarto posto a pouco mais de dois segundos de Alonso, ao passo que Bottas estava em sexto a menos de oito segundos do veterano da Alpine – a situação para o espanhol não se apresentava fácil.

Porém, Pérez caía para décimo segundo imediatamente atrás de Sebastian Vettel e este foi, talvez o principal estratégico da Red Bull, que não chamou o seu piloto antes de este ter conseguido uma vantagem suficiente para sair à frente do alemão, tendo perdido muito tempo atrás do carro britânico.

Quanto Alonso parou, na vigésima terceira volta, conseguiu sair à frente de Daniel Ricciardo, que estava à frente de Pérez, que, entretanto, já passara o tetracampeão mundial.

A Alpine tinha jogado melhor estrategicamente que a Red Bull e, se ambos os pilotos fossem até ao fim da corrida sem parar, o mexicano teria de passar o espanhol em pista.

Apesar das contrariedades, a superioridade do carro de Milton Keynes, permitia a Pérez evoluir e na vigésima nona posição, ultrapassava o espanhol.

A possibilidade de um pódio para Alonso pareciam estar a esfumar-se, até porque Bottas ainda não parara e, com pista livre na terceira posição, era consistentemente mais rápido que o piloto da Alpine, apesar de ter pneus médios com mais vinte e seis voltas.

Mas na trigésima terceira volta a corrida começava a ir de encontro às pretensões do espanhol.

Bottas com os seus pneus já em esforço via o esquerdo – direito, o que mais sofre em Losail, ceder, sendo obrigado a rumar às boxes a baixa velocidade, ficando fora de contenção por um lugar nos pontos, quanto mais no pódio, acabando mesmo por abandonar.

Em circunstâncias normais, o quarto lugar estava assegurado para Alonso, mas a noite tornar-se-ia mais entusiasmante para o espanhol quando Pérez parava pela segunda vez, quadragésima primeira volta, caindo para sétimo a vinte segundos do terceiro lugar que deixara nas mãos do piloto da Alpine.

A Red Bull, em contenção pelo título de Construtores, não podia arriscar um furo e perder pontos, sobretudo num dia em que a Mercedes, apesar de ganhar com Lewis Hamilton, poderia perder pontos, com os problemas de Bottas.

Já a Alpine, muito embora em contenção pelo quinto lugar com a Alpha Tauri, tinha o luxo de poder correr mais riscos com o intuito de ganhar um pódio, mantendo-se no caminho de uma estratégia de apenas uma paragem.

Em dezasseis voltas, o mexicano tinha de ganhar vinte segundos e quatro lugares para alcançar o pódio, ao passo que o espanhol tinha de gerir a recuperação do piloto da Red Bull e cuidar dos seus pneus.

A meio deste segmento da corrida, na quadragésima nona volta, Pérez tinha recuperado já três posições, ficando com oito voltas para recuperar catorze segundos e roubar o terceiro posto, uma tarefa que não se afigurava fácil.

No entanto, outros pilotos começavam a sentir problemas com o pneu dianteiro – esquerdo: Lando Norris entrava nas boxes na quadragésima nona volta com pneumático em questão a perder ar, duas depois George Russell furava e uma mais tarde era a vez de Nicholas Latifi.

Era evidente que este pneu estava em grande esforço e a Alpine pedia a Alonso para evitar os correctores, sobretudo nas curvas de alta velocidade, sendo peremptória a preocupação da equipa.

O espanhol foi gerindo a aproximação do seu perseguidor, conseguindo suster de alguma forma a sua recuperação, tendo ainda uma vantagem de mais de nove segundos para Pérez a três voltas da bandeira de xadrez, o que dava alguma esperança a Alonso, muito embora, um problema com os pneus pudesse colocar tudo em risco.

Contudo, a sorte que em outras ocasiões virou as costas ao bicampeão mundial de Fórmula 1, desta feita não o abandonou, com a corrida a entrar em situação de Safety-Car Virtual, na quinquagésima quinta volta, para recuperar o Williams de Latifi, que tinha parado numa escapatória.

Isto permitia reduzir o ritmo, protegendo os pneus do Alpine, e apenas com uma volta por realizar quando a neutralização foi terminada, Alonso pode rodar num ritmo baixíssimo sem colocar em risco os seus pneumáticos, caminhando cuidadosamente para o seu primeiro pódio desde o Grande Prémio da Hungria de 2014, um segundo lugar aos comandos de um Ferrari.

Foi uma performance em que, na ponta final, o espanhol teve de andar no máximo possível sem danificar os seus pneus, algo que Alonso pôs em prática com grande mestria, como lhe é reconhecido, evidenciando que continua a ter uma das suas melhores características e o torna num dos melhores pilotos dos últimos vinte anos – nunca deixar escapar uma oportunidade.