GP do Mónaco F1, os insólitos: a primeira e única de Oliver Panis
Após um fim-de-semana nebulado, mas sem qualquer ameaça de chuva, aquele domingo de Maio de 1996 amanheceu com nuvens carregadas e forte ameaça de precipitação, prometendo baralhar ainda mais as contas no habitual bailado dos carros pelas estreitas ruas de Monte Carlo. Pela segunda vez consecutiva, Schumacher fazia a pole-position, evidenciando as categóricas melhoras da Scuderia após vários anos de amargura, seguido de Damon Hill, líder destacado do campeonato, e dos dois Benetton.
No warm-up Panis já foi o mais rápido, mas nada nem ninguém previa uma vitória do simpático francês, já que se tratava de uma sessão de testes e vários pilotos estavam a experimentar set-up de piso molhado, antevendo um eventual aguaceiro antes da partida. De facto, o céu estava decidido a baralhar as contas e uma violenta chuvada caiu pouco antes do início dos procedimentos de partida, motivando mesmo a organização a permitir um segundo warm-up de 15 minutos para os pilotos se adaptarem às traiçoeiras condições de pista. O festival de despistes causou a primeira baixa, já que o Forti de Montermini bateu e, sem carro-reserva, estava encontrada a primeira “baixa” do dia.
Na partida, Hill surpreendeu Schumacher (lago já de si, surpreendente, passe a redundância) para tomar o comando e ser o único sem problemas de visibilidade, enquanto cá mais para trás as coisas complicavam-se logo em St.Devote. Verstappen, o único a largar em slicks confiando que a pista secaria rapidamente, saiu em frente contra os rails de imediato, enquanto Lamy e Fisichella batiam a sair da primeira curva, deixando Giancarlo Minardi à beira de um ataque de nervos. Hill abriu de imediato uma boa vantagem e Schumacher cometeu um dos seus raros erros – ainda mais notório pela sua conhecida mestria à chuva – ao derrapar e bater nos rails em Portier – e Barrichello também ficava de fora nesta primeira volta após uma batida. Deste modo, Hill liderava um pelotão já reduzido a 16 viaturas, seguido de Alesi, Berger, Irvine, Frentzen e Coulthard (ironicamente o escocês competia com um capacete emprestado por Schumacher, já que o seu estava a embaciar anormalmente com as baixas temperaturas do dia).
Irvine estava mais lento que os seus perseguidores, permitindo a Hill e aos Benetton destacarem-se, embora o inglês estivesse no perfeito controle dos acontecimentos, podendo sonhar com uma vitória no Principado, depois das cinco conseguidas pelo seu pai Graham.Mais na retaguarda do pelotão, Katayama, Rosset e Diniz eram vítimas das condições traiçoeiras da pista, mas o segundo candidato a abandonar era Berger, que parava nas boxes à décima volta com problemas irresolúveis na sua caixa de velocidades. Mais cá para trás, o efeito-tampão de Irvine enervava Frentzen que tentou uma manobra demasiado otimista para chegar a terceiro à 18ª volta, partindo a asa da frente, o que o obrigou a uma paragem suplementar e o atirou para as profundezas da classificação. O asfalto estava a secar gradualmente e Hill entrou na volta 28 para meter slicks, tal como Irvine, Coulthard e Panis. Alesi assumia o comando, e Coulthard era o grande perdedor quando deixou o motor ir abaixo nas boxes, caindo para quinto. Alesi liderou duas voltas até efetuar a sua paragem, regressando ao segundo posto.
Com o pelotão reduzido a onze pilotos depois do despiste de Brundle, a volta 35 assistiu a um dos momentos marcantes – na descida para o gancho de Hotelo Loews, Panis forçou a passagem a Irvine por dentro, e o irlandês por pouco não bateu nos rails, deixando o carro ir abaixo. Já se preparava para desistir quando foi empurrado pelos comissários devido à posição perigosa em que se encontrava, e com o declive o Ferrari voltou a pegar e Eddie continuava em prova após uma passagem pelas boxes para verificar o carro e ajustar os cintos de segurança (que tinha começado a tirar para desistir), relegado para o penúltimo lugar e irremediavelmente atrasado. A meio da prova Hill tinha uma enorme vantagem para Alesi, por sua vez com Panis a grande distância, seguido de Coulthard, Herbert e Villeneuve, este último passou todo o fim-de-semana sem conseguir encontrar as afinações ideais no seu Williams.
Porém, a exibição impecável de Hill não utou muito, pois o seu motor Renault quebrou espetacularmente na saída do túnel à 41ª volta, deixando muito óleo na pista, o que por pouco não levou a uma batida de Panis. Isto deixava Alesi completamente isolado no comando e perto de vencer a segunda prova na sua longa e azarada carreira na F1, até que no final da 59ª volta entrou nas boxes queixando-se de problemas de estabilidade. A equipa verificou o Benetton e não encontrou nada de anormal, procedendo a uma troca de pneus, mas duas voltas depois o destino voltava a pregar uma partida ao carismático francês, já que a suspensão estava danificada e não havia nada a fazer a não ser desistir. Isto deixava o surpreendente Ligier-Mugen Honda de Olivier Panis no comando, com Coulthard a ganhar gradualmente tempo, animado pela hipótese de quebrar o jejum da McLaren que se arrastava desde o G.P. da Austrália de 1993. Herbert era terceiro, seguido de Villeneuve, Salo e Häkkinen.
Enganem-se se pensam que as peripécias terminam por aqui… Para começar, Panis tinha optado por não reabastecer por isso tinha que poupar gasolina e, aliado à superioridade técnica do McLaren-Mercedes, via-se na prespetiva de ter que se defender do escocês, que rodava cada vez melhor. Por sua vez, o fim-de-semana miserável de Villeneuve terminava mais cedo quando, na volta 66, encontrou o Forti de Badoer, que rodava com seis voltas de atraso… o italiano não cooperou na dobragem em Mirabeau e o resultado foi a retirada de ambos os monolugares. O limite das duas horas aproximava-se e Panis esperava ansiosamente que a prova não fosse até ao fim, mas até à bandeirada de xadrez os percalços continuaram. Na volta 70, Irvine cometeu um erro no mesmo sítio do seu colega Schumacher, e na tentativa de regressar à pista o mais depressa possível provocava um acidente com Mika Salo, surpreendendo Häkinen que rodava logo atrás… A limpeza da pista seria complicada se não estivessem apenas quatro carros a rodar (!!!!!), e o limite das duas horas levou à antecipação do final da prova para a 75ª volta. Panis aguentou Coulthard para conseguir uma surpreendente vitória, com Johnny Herbert a fechar o pódio. O único piloto além destes ainda a rodar era Frentzen, que nunca se recompôs do incidente com Irvine e entrou na box à entrada da última volta, já que o seu quatro posto estava garantido.
Apesar de ter sido ajudado pelas inúmeras desistências, não se pode tirar mérito à exibição muito consistente de Olivier Panis, que não se intimidou nunca com as condições e ultrapassou problemas com o motor nos treinos para conseguir aquela que viria a ser a sua única vitória na F1, e a última da Ligier – se bem que já sem o seu fundador Guy Ligier “ao leme”. Foi também a primeira vitória de um motor Mugen-Honda e a última de um piloto francês até á data de edição deste artigo.