GP da Turquia de F1: A corrida dos desalinhados
Numa pista que nunca permitiu o uso de pneus slicks, Charles Leclerc, Lewis Hamilton e Esteban Ocon apostaram em realizar todo o Grande Prémio da Turquia sem trocar de pneus, mas só o francês conseguiu que estratégia desse algum resultado e mesmo no seu caso, foi fruto das circunstâncias e não da validade da opção.
Qualquer um dos pilotos tinha condições muito distintas para disputar a corrida do passado domingo, mas todas elas conjuraram para equacionarem realizar as cinquenta e oito voltas de prova apenas com um jogo de borrachas intermédias, que eram as mais apropriadas para o asfalto de Istambul Park, que nunca secou totalmente, apesar de a chuva se ter mantido maioritariamente ausente.
Charles Leclerc era o mais bem posicionado, mas tinha um carro afinado para seco e, portanto, com menos apoio aerodinâmico. A alinhar no terceiro posto da grelha de partida, um pódio seria um bom resultado para o monegasco da Ferrari.
Por seu lado, Lewis Hamilton arrancava de décimo primeiro – depois de ter montado o seu quarto motor de combustão interna, o que lhe valeu uma penalização de dez lugares na grelha de partida – mas com o carro mais competitivo nas mãos, olhava para um pódio como um resultado capaz de limitar os danos.
Já Esteban Ocon não passou da Q2 e alinhava do décimo segundo lugar e preparava-se para uma longa tarde, uma vez que o Alpine não se dá bem com os intermédios e alcançar os pontos seria um feito que dificilmente seria concretizado sem situações anormais.
A primeira volta correu sem dramas a qualquer um destes três pilotos, tendo Leclerc se lançado na perseguição a Bottas e a Verstappen, ao passo que Hamilton e Ocon ganhavam uma posição graças ao pião de Fernando Alonso na primeira curva depois de um ligeiro toque de Pierre Gasly, pelo qual o francês sofreu uma penalização de cinco segundos.
Apesar de ter uma afinação para seco, com menos asa e, portanto, pouco indicada para as condições da pista, que permanecia muito escorregadia, o piloto da Ferrari não tinha grandes dificuldades em acompanhar os dois homens da frente, parecendo até mais rápido que Verstappen.
Por seu lado, Hamilton foi ganhando posições consistentemente, apesar de Yuki Tsunoda se ter mostrado um osso duro de roer na luta pelo oitavo posto, e na trigésima terceira volta estava encostado a Sérgio Pérez.
O inglês lançou um ataque fortíssimo ao mexicano, mas este defendeu-se estoicamente, tendo os dois realizado diversas curvas lado a lado, mantendo o quarto lugar e o heptacampeão mundial perdia algum do seu fulgor.
Na mesma volta, Esteban Ocon continuava no décimo primeiro lugar, apesar de ter sido ultrapassado por Carlos Sainz, que realizava uma recuperação notável com a sua nova unidade de potência Ferrari, beneficiando do pião de Yuki Tsunoda que rodara nas posições pontuáveis até à vigésima primeira passagem pela linha de meta.
Com mais de metade da prova realizada, era evidente que a pista não secaria de modo a permitir o uso de slicks e começava a chegar o momento de trocar os intermédios do início da corrida por um novo jogo.
Daniel Ricciardo, que estava a ter uma corrida de grandes dificuldades, fora o primeiro a parar, na vigésima primeira volta, e depois de um longo período de granulação, na trigésima terceira, começou a rodar num ritmo superior ao dos homens da frente.
A dúvidas das equipas passava pela forma como os pneus novos aqueceram após a saída das boxes e quão longa seria a fase de granulação, que seria um fator para todos.
Apesar de ter Leclerc por perto, Verstappen foi o primeiro a parar, correndo o risco de um potencial “overcut”, que poderia ser eficaz nas condições do asfalto de Istambul Park.
Ao longo da volta de saída, o holandês estava a perder tempo para o monegasco – subiu de 15,3s para 16,0s – mas quando tentava encontrar os 18s necessários para ganhar uma posição ao piloto da Red Bull, o ferrarista seguiu em frente na travagem Curva 12, perdendo quase quatro segundos e, mais importante, danificava os pneus, que perdiam também temperatura.
A possibilidade de realizar o “overcut” a Verstappen esfumava-se, mas o terceiro lugar estava ainda ao alcance de Leclerc.
Contudo, o piloto de 23 anos sonhava com o triunfo e, juntamente com a sua equipa, explorou a possibilidade de se manter em pista até ao final sem parar nas boxes. As borrachas, porém, eram quase slicks e foi-se tornando cada vez mais difícil parar o carro nas travagens e colocar a potência no chão à saída das curvas.
Bottas não teve dificuldades em suplantar o jovem da Ferrari e o segundo posto era uma questão de tempo até ter de o ceder a Verstappen, o que o atirou para terceiro, mas com o risco de perder mais lugares, se se mantivesse em pista sem parar.
Na quadragésima sétima volta, dez depois do holandês, Leclerc parava nas boxes, descendo para terceiro, mas com a granulação de que foi alvo – como todos os restantes pilotos, mas mais grave para si por ter uma configuração aerodinâmica para pista seca – acabaria por perder um lugar para Sérgio Pérez, terminando em quarto, um resultado frustrante para quem rodou durante a maior parte da corrida dentro de posições do pódio.
Hamilton tentou também manter-se em pista, tendo ignorado uma ordem direta da Mercedes para entrar nas boxes, estavam cumpridas quarenta e uma voltas.
O inglês tinha como objetivo alcançar o pódio, depois de arrancar de décimo primeiro, minimizando o impacto da penalização que sofrera por montar um novo V6.
Por seu lado, a equipa não acreditava ser possível ver a bandeira de xadrez apenas com um jogo de pneus e estava preocupada com Gasly, que poderia entrar na zona em que Hamilton sairia atrás de si.
A Mercedes deu alguma margem ao seu piloto para seguir com a estratégia que propusera, mas a ameaça do piloto da AlphaTauri aumentava a cada passagem pela linha de meta e na quinquagésima volta, chamou o inglês definitivamente, que caiu de terceiro para quinto.
Tanto Hamilton como Leclerc ficaram a meio caminho, tentaram realizar as cinquenta e oito voltas apenas com um jogo de pneus, mas acabaram por reverter para uma de uma paragem, tal como quase todos os restantes, ficando dessincronizados com os seus adversários diretos.
Isto custou um lugar no pódio ao monegasco, que se viu suplantado por Pérez quando passava pela fase de granulação dos pneus.
Hamilton, apesar de ter sido ameaçado por Gasly, conseguiu manter o quinto lugar final, posição em que se encontrava antes das paragens, não tendo, portanto, um custo direto. Porém, se tivesse parado aquando do seu colega de equipa, em torno da trigésima sétima volta, poderia ter, tal como Pérez, ganho uma posição a Leclerc, o que significaria mais dois pontos, que poderiam ser importantes no final da temporada.
Já Esteban Ocon levou a sua opção até às últimas consequências, realizando toda a corrida apenas com um jogo de pneus. O francês terminou na décima posição, o que lhe permitiu marcar um ponto numa prova em que as suas esperanças de terminar entre os dez primeiros eram diminutas.
Contudo, a sua estratégia pouco terá tido a ver com o resultado, uma vez que, se Tsunoda não tivesse errado e Sebastian Vettel não tivesse apostado intempestivamente em montar pneus slicks, dificilmente poderia ter subido uma posição relativamente ao lugar em que completou a primeira volta. Para além disso, mais uma volta e o francês seria ultrapassado pelos dois Alfa Romeo, o que o atirava para fora dos pontos.
Qualquer um destes pilotos teria na ideia a prova do ano passado, quando os pneus intermédios duravam muitas voltas, tendo Hamilton vencido com um jogo bastante usado. Contudo, a pista mudou drasticamente do ano passado para este, com a limpeza de água a alta pressão, ficando bastante abrasiva, colocando forte pressão nas borrachas.
Era, portanto, uma tentativa com grande dose de risco e que dificilmente daria certo, como se verifica com a corrida de Ocon que, sem os erros de Vettel e Tsunoda, veria bandeira de xadrez em décimo segundo, perdendo uma posição relativamente à primeira volta. Mas o piloto da Alpine não tinha nada a perder, ao contrário de Leclerc e de Hamilton.