Fórmula 1: Sofrerá a Mercedes sem o “party mode”?
A FIA surpreendeu tudo e todos ainda antes do Grande Prémio de Espanha ao revelar às equipas que pretendia abolir os modos de potência especiais das unidades de potência usados na qualificação, havendo quem garanta que o objectivo é atingir a Mercedes… Mas será mesmo assim?
Desde que os V6 turbohíbridos foram introduzidos em 2014 que os construtores disponibilizam os imortalizados por Lewis Hamilton “party modes”. Uns mais performantes que outros, claro, e a formação Brackley esteve consistentemente à frente das suas concorrentes.
Estes modos de potência baseiam-se no uso massivo da potência eléctrica gerada pelo ERS – composto pelo MGU-H e pelo MGU-H –, uma maior pressão do turbo e a utilização de um consumo de combustível elevado.
Contudo, esta “afinação” não pode ser usada por longo períodos, uma vez que coloca em risco a fiabilidade de todos os componentes. Este ano cada piloto tem apenas três unidades de potência para efectuar dezoito Grandes Prémios – na realidade deverão ser dezassete – o que exige que cada grupo motor tenha de cobrir a distância de cerca de seis fins-de-semana, constituídos por treinos-livres, qualificação e corrida.
Nos últimos dois anos era a Ferrari que tinha a liderança neste exercício, mas com as directivas técnicas emanadas pela FIA durante o defeso, o V6 turbohíbrido perdeu fulgor, tendo a “Scuderia” e a entidade federativa alcançado um acordo secreto, dado os homens da organização sediada em Paris não conseguir provar a legalidade ou ilegalidade da unidade de potência italiana.
Ora a FIA baseia-se precisamente na sua dificuldade em policiar efectivamente o uso dos V6 turbohíbridos para introduzir a directiva técnica que enviará às equipas antes do Grande Prémio da Bélgica – 30 de Agosto – para terminar com os modos de potência qualificação, os vulgos “party modes”.
Porém, no paddock do Circuit de Barcelona – Catalunya o sentimento dominante era que os homens da Place de la Concorde estaria a tentar diminuir a vantagem da Mercedes em qualificação.
O próprio Toto Wolff admite que a equipa que dirige tem acesso a modos de motor muito eficazes. “Temos um bom modo de qualificação e conseguimos ter um pouco mais de potência naquela última sessão”, afirmou o austríaco.
Se olharmos para as qualificações deste ano – excluindo a do Grande Prémio da Estíria que foi disputada à chuva – vemos que os números são impressionantes.
Se transformarmos o melhor volta de cada equipa em percentagem, assumirmos as marcas da Mercedes como 100% – uma vez ter conquistado todas as pole-positions deste ano – e compararmos a evolução de Ferrari, Red Bull e McLaren (foi a única equipa com motores Renault a alcançar sempre a Q3) com a do formação de Brackley, chegamos aos números apresentados no quadro mais abaixo que representa a média dos saltos competitivos nos cinco eventos em questão.
% | Q3 – Q1 | Q1 – Q3 | Q2 – Q3 |
Ferrari | -0,299 | 1,012 | 0,426 |
Red Bull | -0,185 | 0,835 | 0,2 |
McLaren | -0,614 | 1,062 | 0,523 |
Entre a terceira sessão de treinos-livres e a Q1 – primeira coluna – todas as equipas analisadas ganham performance à Mercedes, o que é natural, uma vez que a Mercedes não precisa de atacar para sair do primeiro segmento da qualificação, ao contrário de Ferrari e McLaren, que não podem correr o risco de serem “apanhadas com as calças na mão”.
Porém, se olharmos para o salto que os “Flechas Negras” dão entre a Q1 e a Q3 – segunda coluna – verificamos uma evolução abismal com todas as três equipas analisadas a perder em torno de um ponto percentual. Isto significa o ganho de cerca de um segundo às suas rivais numa volta hipotética de 1m40s.
Entre a Q2 e a Q3 – terceira coluna – a Mercedes continua a ganhar vantagem para as suas rivais, muito embora menos, o que demonstra que começa a usar modos mais agressivos logo na Q2, muito provavelmente, para que os seus pilotos se possam ambientar ao comportamento do carro nas características com que vão disputar o segmento que define a pole-position.
É evidente que o “party mode” da unidade de potência do construtor da estrela de três pontas são extremamente potentes e será a equipa que mais perderá com a medida imposta pela FIA para o Grande Prémio da Bélgica.
No entanto, tanto Hamilton como Wolff já deixaram bem claro que a abolição dos modos de qualificação não será algo de negativo para a equipa, sublinhando que a performance perdida no sábado poderá ser usada na corrida de domingo. “Se isso deixar de ser possível (n.d.r.: usar os ‘party modes’) tudo terá de ser suavizado para a corrida e isso não será um déficit para nós, antes pelo contrário, pensamos que podemos traduzir isso em mais performance para a corrida. É algo que é um grande desafio para nós e fá-lo-emos assim que a medida for implementada”, enfatizou o austríaco.
No fundo, o que Wolff nos diz é que menos performance na qualificação traduz-se em mais na corrida.
Segundo o timoneiro da Mercedes, cinco voltas no modo mais agressivo de uma unidade de potência equivalem a vinte e cinco em corrida, o que demonstra bem o impacto que têm na fiabilidade de todos os componentes. Sem os modos de qualificação, de facto, os técnicos de Brixworth poderão dar a Lewis Hamilton e a Valtteri Bottas – assim como aos pilotos das suas equipas-cliente – mais performance na tarde de domingo.
É claro que os “Flechas Negras” perderão alguma coisa em qualificação com a medida da FIA, devendo, no entanto, ser difícil que deixe de monopolizar a primeira linha, mas poderá não ser o suficiente para que vejamos os monolugares de Brackley em inferioridade em Spa-Francorchamps…
Mas cá estaremos para analisar os números após o Grande Prémio da Bélgica.