Fórmula 1: qual é, afinal, o segredo da Ferrari?
Acho que é a pergunta que depois do GP da Alemanha todos fazem, no paddock da competição, mas também entre os adeptos: como é que a Ferrari consegue ganhar tanto tempo em reta?
Depois do Grande Prémio da Áustria, essa pergunta tem pairado na mente de todos os interessados no tema Fórmula 1. Esta situação de evidente supremacia da Ferrari já deu origem ao maior número de teorias, sendo que duas se destacam.
A primeira está relacionada com algo que a casa de Maranello encontrou na parte híbrida da unidade de potência do SF71H. A segunda está ligada a uma descoberta, no lado cinzento da regulamentação, para reduzir o arrasto provocado pelo carro o que permite carregar mais a aerodinâmica sem prejudicar a velocidade de ponta.
Alguns órgãos de comunicação social que acompanham “in loco” as corridas da temporada 2018, tiveram acesso aos dados oferecidos pelo GPS de cada carro no Grande Prémio da Alemanha. Mas até nem seria preciso, já que questionado sobre o que pensava da velocidade dos Ferrari, Nico Hulkenberg referiu, publicamente, que “passaram por mim entre a Mercedes Arena e o Motodrom e ganharam-me um décimo de segundo. Isto, apenas, em 300 metros!”
Tornando a coisa mais científica, os dados do GPS dizem que os Ferrari, em linha reta, ganhavam 4 décimos de segundo aos Mercedes e 8 décimos aos RedBull. Wow! Mas o que mais espanta é que Nico Hulkenberg referiu que entre as curvas 2 e 6, já na parte final da longa curva que é feita a fundo e que tem cerca de 1100 metros de comprimento, os Ferrari, a determinada altura, desapareciam.
Voltando aos dados de GPS a que vários órgãos de comunicação tiveram acesso, percebe-se que entre os 250 e os 320 km/h, os Ferrari são os mais rápidos na aceleração. Se entre as curvas 6 e 8 a Mercedes consegue fazer jogo igual em termos de velocidade, a verdade é que juntando todos os setores e numa volta perfeita, sem erros dos pilotos, a diferença entre a Ferrari e a Mercedes seria de 0,5 segundos. Ora, na qualificação, Vettel bateu Bottas por um pouco mais de 2 décimos e Raikkonen por mais de 3 décimos.
Recordamos que a Ferrari introduziu a segunda versão do seu motor no Grande Prémio do Canadá, mas só em Silverstone é que a unidade de potencia italiana deu um ar da sua graça. E segundo alguns engenheiros de motores que já passaram pela Fórmula 1, só pode ter acontecido uma de duas coisas: depois de iniciarem a utilização das novas unidades de potência com alguma cautela, os homens de Maranello asseguraram-se que podiam libertar toda a capacidade da unidade de potência, ou descobriram um “software” capaz de modificar o sistema de alimentação do motor.
Andy Cowell, engenheiro chefe da divisão de motores da Mercedes em Brixworth, aventou que para o nível de performance exibido há uma diferença de cerca de 40 CV entre o propulsor Ferrari e o Mercedes. Algo que deixou espantado Toto Wolff que se apressou a dizer “se isso for verdade, é um salto para o qual nós precisamos de dois anos de desenvolvimento normal para lá chegar!”
Como desmontar estas teorias?
Alguns analistas dizem que a melhoria de performance não se deve só aos modos de potencia do motor, pois não se viu na Haas nem na Sauber esses ganhos. E ambas as equipas utilizam motores de 2018 e a Ferrari está obrigada a fornecer os mesmos motores. Por outro lado, Kimi Raikkonen continua a surpreender com a sua velocidade e ele não está a utilizar uma das novas unidades de potência, depois da troca que foi forçado a fazer em Espanha. Portanto, dizem esses analistas, a diferença terá de vir de outro lado. E aqui a mente brilhante de Andy Cowell, pode ajudar.
Segundo o engenheiro britânico, “para conseguir controlar de forma tão perfeita a performance, a Ferrari deverá ter encontrado algo que permite manter a pressão do combustível sempre constante e isso, acreditem, é uma enorme vantagem em todas as partes dos circuitos.”
Deitando mão ao regulamento da Fórmula 1 – um “calhamaço” com 105 páginas – podemos tentar encontrar a resposta. Diz o regulamento no artigo 5.12.6, diz que todos os elementos da unidade de potência têm de estar instalados no perímetro da célula de sobrevivência. Além disso, todas as tubagens, entre outras coisas, que tenham uma pressão superior a 10 bar, fazem parte da unidade de potência, abaixo desse valor contam como elementos do chassis, não precisam de estar dentro do referido limite da célula de sobrevivência.
Esta abertura no regulamento, pode ter oferecido á Ferrari uma vantagem no que toca a manter o fluxo de 100 kg/h de combustível sempre constante. Isto porque todos os engenheiros de motores já confessaram que não conseguem manter ao longo de uma corrida o fluxo constante, existindo algumas quebras que, a dado momento, enfraquecem a capacidade do motor de combustão interna. Como é que tubagens fora do perímetro da célula de sobrevivência ajudam é algo que, acredito, os comuns mortais não saibam. Porém, caso essas linhas de baixa pressão consigam alimentar as de alta pressão sem constrangimentos de estarem amarfanhadas no espaço exíguo do motor, pode realmente ser uma boa vantagem como referiu Andy Cowell.
Mas, se a vantagem da Ferrari estiver em outro lugar?
As teorias da conspiração são mais que muitas. Uns dizem que a Ferrari tem um depósito adicional que não está ligado ao sensor do medidor de fluxo de combustível. Outros referem que a bateria tem mais capacidade que o permitido e mais alguns dizem que o motor elétrico do SF71H debita bem mais potência que os 120 kW (163 CV) permitidos pelo regulamento.
Todas são um verdadeiro disparate pois a FIA tem repetidamente, verificado os carros de Maranello e sempre foram declarados legais por Charlie Whiting.
“Talvez a Ferrari tenha encontrado algo que reduza drasticamente o arrasto a alta velocidade. E isso é algo que pode explicar a maior velocidade dos carros vermelhos face aos clientes, já que nessa área não há obrigação de fornecer Haas e Sauber. Seria, sempre, algo da Ferrari e não para os clientes” atirou Andy Green, o brilhante diretor técnico da Force India. Porém, esta teoria também tem pés de barro.
Após o acidente de Sebastien Vettel, foi possível tirar fotos á parte inferior do Ferrari e a muitos detalhes do SF71H. E nada de revolucionário ou diferente foi encontrado ou, sequer, ilegal. Além disso, as equipas analisam de forma meticulosa os vídeos e as fotos que recolhem, todos os fim-de-semana, sobre os carros dos adversários, sendo raro que alguma ideia mais arrojada ou brilhante passasse despercebido aos rivais.
Outra linha de pensamento diz que a Ferrari está a usar o ar quente dos escapes para aumentar o apoio e diminuir o arrasto na asa traseira. Uma imagem que passou, fugazmente, durante o Gp da Alemanha, mostrou que as ponteiras de saída dos gases da válvula “wastgate” estavam numa posição anormal, as duas juninas por cima da saída de escape do motor de combustão. E, curiosamente, estavam mais perto da asa traseira que tinha a colher invertida com uma pequena bossa na extremidade. E sabe-se que as duas saídas da válvula de descarga do excesso de pressão do turbo, unem-se numa só, existindo duas por questões de regulamento. Ora se a saída inferior tiver pouco ou nenhum fluxo e a superior expele todos os gases. Isso, em teoria, permitira anular o efeito de apoio da asa traseira para assim aumentar a velocidade. Uma ideia que poderá ir contra aquilo que a maioria deseja, ou seja, retirar da asa traseira o fluxo de gases quentes. Será que a Ferrari encontrou aqui algo de diferente?
Enfim, o segredo que fez a Ferrari andar tão depressa desde o GP da Áustria continua… um segredo. Mas é algo que vai nas bocas dos adeptos (e não só) caso na segunda fase do Mundial de Fórmula 1 a casa de Maranello continue a demonstrar velocidade superior aos rivais, nomeadamente, os Mercedes.
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