F1: Não vás, Vettel!

Por a 25 Maio 2020 13:48

O cenário da saída de Sebastian Vettel da F1 começa a ganhar cada vez mais força. As opção são reduzidas e a vontade talvez não seja a mesma. Mas se Vettel sair, será uma perda para a o Grande Circo.

Na semana passada vimos notícias que falavam de uma desvalorização de quase 90 milhões de dólares se Sebastian Vettel sair da F1. São números grandes para um piloto que tem uma exposição mediática nula fora das pistas e que faz questão de manter a sua vida o mais privada possivel. Mas então o que traz Vettel ao Grande Circo?

O primeiro ponto tem de ser obviamente estatísticas dignas dos melhores de sempre. Em 240 GP foram 53 vitórrias, 57 poles, 120 pódios, quatro títulos mundiais e três vice-campeonatos em 14 épocas. Vettel é sem dúvidas um dos grandes nomes da F1 mas nem sempre é visto e respeitados como tal.

O alemão que se tornou tetracampeão na Red Bull, foi o protagonista de uma era em que o domínio dos carros da equipa austríaca causou algum fastio… tal como qualquer outro domínio exacerbado. Vettel teve uma ascensão meteórica e foi o mais jovem campeão do mundo de sempre. Foi por isso fácil entrar logo no livro de ódios de estimação de alguns. Os grandes campeões são assim, ou se amam ou se odeiam. Pode-se tentar comparar o seu talento com o outros pilotos como Fernando Alonso ou Lewis Hamilton e até podemos chegar à conclusão que o alemão não será tão dotado quanto os nomes acima referidos. Mas ninguém pode dizer que é um piloto mediano com sorte.

É verdade que com o carro certo, Vettel é imbatível e muitas vezes o que ele fez na Red Bull é menosprezado. É verdade que teve melhor carro do grid, mas teve de adaptar o seu estilo de condução para tirar o máximo partido dele e do famoso “blown difuser”. Mark Webber, que não é manco nenhum, nunca foi tão competitivo quanto Vettel. Webber foi algumas vezes prejudicado por decisões da equipa, mas Daniel Ricciardo provou de forma clara que a Red Bull (e qualquer equipa) beneficia sempre o piloto em melhor forma. É também verdade que sob pressão, Vettel mostra falhas graves e que não gosta muito de improvisar. É no fundo uma mistura pouco convencional de características germânicas e latinas.

Mas o que Vettel traz à F1 é mais do que um piloto com talento. A forma como comunica, a forma como por vezes perde a cabeça e “parte a loiça toda”. Para alguns, as cenas no final do GP do Canadá 2019 foram deploráveis e desprestigiantes, mas para mim foram uma pedrada no charco. Vettel esqueceu o politicamente correcto, foi para a motorhome com vontade puxar o lustro ao vernáculo italiano. Passado dois minutos, lá vai ele para o pódio, porque apesar de tudo não é maldoso e tem respeito pelos adversários (e também podia ser ainda mais penalizado), mas ainda vai trocar as placas, numa espécie de “dedo do meio firme e hirto” para quem assinou a penalização. Para alguns pode ter sido um circo desnecessário, mais ainda para um campeão… Para mim foi o Grande Circo no seu esplendor: Uma luta fantástica, polémica e um piloto sem filtro.

Vettel disse no final que faz falta à F1 um discurso mais sincero, mais genuíno. Não podia concordar mais! Basta ver as conferências de imprensa. Juntem Vettel, Hamilton Ricciardo, Alonso e Raikkonen e temos os ingredientes certos para ter uma conferência entretida de 30 minutos. Juntem Grosjean, Kvyat, Stroll, e os miúdos e passado 5 minutos já estamos a bocejar. Vettel faz isso, traz um discurso genuíno e um humor inesperado para um alemão.

A F1 é o reflexo da nossa sociedade… demasiado limpa, demasiado correcta, demasiado sem sabor. A F1 tem abdicado aos poucos dos discursos inflamados, dos pilotos com carácter forte e sem medo de dizer o que lhes vai na alma… no fundo tem abdicado de tudo o que a tornou especial.

A F1 tornou-se grande, enorme, porque tínhamos os “Macho Alfa” que diziam o que queriam e fazia o que queriam, que punham a vida em risco por um objectivo maior. Na era do politicamente correcto, essa postura Alfa é quase censurada porque temos de tentar ao máximo não incomodar quem se ofende com um suspiro mais profundo. A F1 dava-nos uma espécie de válvula de escape porque era genuína e isso tem-se diluído.

É por isso que Ricciardo, à sua maneira, ganha cada vez mais fãs, porque não tem medo de dizer o que pensa. Não é por acaso que Kimi Raikkonen tem tantos fãs. A F1 precisa de uma revolução nos regulamentos, mas também uma revolução na sua postura. A F1 tem de voltar a ser o Grande Circo e dar liberdade aos seus artistas. Isso sim faz a diferença.

E Vettel traz isso. Por vezes exagera nas queixas, nas reações, no discurso, mas sentimos que o que vemos é verdadeiro. Com Nico Rosberg, por exemplo, as palavras soavam a falso, com um discurso estudado e insípido. Com outros pilotos o discurso é semelhante ao de um jogador de futebol ao fim do jogo. Vettel é o oposto. É por isso que a F1 vai perder muito se ele resolver pendurar o capacete. É por isso que qualquer competição que ele decida abraçar após a F1 irá lucrar muito. Porque Vettel é mais do que um bom piloto.

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