F1: Mercedes – Em busca da glória total

Por a 9 Fevereiro 2021 11:45

A Mercedes começa encara esta época como a oportunidade única de se destacar no livro de ouro da F1. Mas o caminho até aqui não foi fácil. A Mercedes não quer desperdiçar esta chance de se tornar na única equipa a conquistar oito títulos consecutivos.

Se em 2012 disséssemos que a Mercedes se iria tornar na maior força da F1, muitos soltariam uma gargalhada. Se em 2013 disséssemos que a Mercedes ia conquistar sete títulos consecutivos, ninguém acreditaria. A verdade é que a Mercedes tornou-se numa máquina de colecionar triunfos de tal forma que já é considerada a equipa mais dominante da história da F1, tendo ultrapassado o recorde de seis títulos consecutivos da Ferrari, algo que parecia impensável.

Uma caminhada dura e cheia de desafios

Mas a caminhada foi longa, por vezes penosa e feita de trabalho árduo. Dizem que o segredo do sucesso da Mercedes está na sua unidade motriz que desde início se assumiu como a melhor da grelha. Mas até esse “parto” aparentemente fácil, se revelou complicado.

Recentemente, Andy Cowell, homem responsável pela criação e desenvolvimento da unidade Mercedes, revelou à The Race que em junho de 2013 o desenvolvimento do motor sofreu um problema grave que punha em causa todo o plano da equipa. Numa reunião da empresa na sexta-feira do GP da Grã-Bretanha de 2013, a Mercedes admitiu internamente que estava “em apuros”. Cowell recorda que, como ponto de viragem, a resposta determinaria se a Mercedes poderia escalar a montanha à sua frente, ou ser derrotada.

Em resposta ao problema, a Mercedes cessou as suas atividades não essenciais e mudou o objetivo final de “ganhar o campeonato” para “estar pronta para a Austrália 2014”. O pessoal concordou em fazer mais 10 horas de trabalho por semana e foram redistribuídas em áreas mais críticas. A Mercedes parou todo o desenvolvimento do seu carro de 2013, para poder estar preparada para 2014, algo que não era um dado adquirido.

Mesmo o que se diz sobre a preparação antecipada da Mercedes, pode fazer parecer que os Flechas de Prata tiveram muito tempo de avanço para preparar a nova era, mas o plano inicial da F1 era usar motores de quatro cilindros em linha, algo que a Mercedes já tinha começado a testar. E Cowell admite que a Mercedes fez um esforço consciente para começar o mais cedo que pôde. Mas isso trouxe os seus contratempos, pois os regulamentos de F1 mudaram no Verão de 2011 para os turbo-híbridos V6 que agora conhecemos.

“Tivemos um único cilindro a funcionar cedo, que tivemos de adaptar porque não obtivemos todos os parâmetros exatamente à medida que os regulamentos saíam. Fizemos um motor de quatro cilindros, para o qual tínhamos a cabeça e um cárter pronto, e que foi para o lixo! Quando os regulamentos mudaram de um quatro cilindros em linha para V6…sim, fomos para casa e estávamos chateados. Mas voltámos logo no dia seguinte, e dissemos: “Vamos ter um V6 a funcionar antes do Natal”. E tínhamos um motor de teste V6 a funcionar antes do Natal.”

Sorte e engenho

Como em qualquer caminhada bem sucedida a sorte tem de estar presente e algumas das decisões tomadas que se revelaram acertadas mostraram-se mais acertadas que inicialmente previsto.

O designer-chefe da Mercedes, John Owen afirmou que Cowell não só foi “muito corajoso por ceder aos pedidos do departamento do chassis para a integração do motor” como também teve uma ideia engenhosa mas trabalhosa para o processo.

“O que ele fez foi conceber três motores”, disse Owen. “Um penso que pesava 250 quilos, o primeiro. E era um motor que era quase inquebrável. Estava lá apenas para compreender o desenvolvimento do desempenho. Depois fez outro motor que era muito frágil, que ia ser o motor de fiabilidade, onde não faziam muito trabalho de desempenho. E depois o terceiro motor foi uma espécie de casamento entre os dois, que se tornou no motor para as corridas.”

“Penso que encontraram uma forma muito, muito boa de o fazer. Ouvimos outras equipas a tentarem construir a sua unidade tanto para o desempenho como para a fiabilidade e sofreram com o tempo parado das avarias, o que atrasou o processo de desenvolvimento.”

A divisão do turbo, com a turbina de um lado e o compressor do outro do motor, foi pensada para ajudar na integração do motor no chassis, mas tornou-se num elemento chave do sucesso do motor. Além de permitir que o motor possa ser colocado sem se alongar muito no chassis, tornando-se num bloco mais compacto que permite um trabalho na aerodinâmica mais facilitado, a divisão do turbo torna-o mais eficiente com uma redução na tubagem e uma separação da turbina quente e do compressor que fornece o ar ao motor, o que também permite um intercooler mais pequeno, sem comprometer que o ar que chega ao motor seja frio o suficiente para permitir uma combustão eficiente. O desenho é tão complexo de colocar em prática que os outros fornecedores tentaram copiar a ideia, mas o sucesso dessas tentativas não foi óbvio, embora a Honda tenha adotado e a Ferrari deva fazer o mesmo em breve . Mas a determinação dos engenheiros da Mercedes permitiu este avanço chave.

Dúvidas sempre superadas com determinação

Apesar da abordagem inovadora e com bons resultados a Mercedes chegou ao primeiro teste sem saber se teria um bom motor e as primeiras impressões até pareciam indicar que a Ferrari estava melhor, com uma fiabilidade mais interessante. Mas depressa esse cenário se desvaneceu e a Mercedes tornou-se oficialmente a fornecedora do melhor motor. Uma caminhada que do lado de fora pareceu implacável e certeira, mas que foi vivida por dentro com muita incerteza.

Mas a Mercedes desenvolveu algo que a diferenciou das restantes… um apetite insaciável pela perfeição. Em 2014 a Mercedes foi a melhor de longe, em 2015 a Ferrari aproximou-se, mas não o suficiente, em 2016 a Mercedes voltou a ficar muito a frente das adversárias, cenário que mudou um pouco em 2017 e 2018 mas sem efeitos práticos. A Mercedes ficou em média 229 à frente das suas adversárias no fim das épocas e apenas em 2018 a vantagem foi menor que 100 pontos (94). No “pior” ano da Mercedes (no melhor da Ferrari) os Flechas de Prata conseguiram ainda praticamente 4 GP de vantagem.

A Mercedes entendeu que tinha vantagem do lado do motor, mas foi sempre desenvolvendo a sua arma. 2019 e 2020 foram a prova de como a estrutura liderada por Toto Wolff opera e num ano apenas, conseguiram anular praticamente toda a diferença de performance para o motor “ilegal” da Ferrari que foi obrigada a abdicar do truque que usava para tirar mais potência da sua unidade. A Mercedes mostrou uma determinação férrea e conseguiu suplantar mais um desafio.

Mesmo do lado do chassis, a equipa adotou uma filosofia completamente diferente da maioria das equipas, com um carro longo de forma a poder moldar melhor o ar e direciona-lo para as zonas desejadas. Isso retirou agilidade nas curvas lentas, mas a Mercedes com o trabalho intenso de desenvolvimento, conseguiu anular essa fragilidade. Conseguiu criar o DAS, aprimorou soluções aerodinâmicas e no computo geral, manteve-se sempre acima das restantes.

A estatística que não engana

O resultado é claro: Em nove épocas na F1 (227 GP), venceram 115 vezes (50,7% de vitórias), fizeram 236 pódios, 126 poles (55,5%). Pontuaram em 90% das corridas em que entraram e com isso conquistaram nove títulos de pilotos (Juan Manuel Fangio 2, Nico Rosberg 1, Lewis Hamilton 6) e sete título de construtores (2014 – 2020).

No décimo ano de competição na F1, a Mercedes procura o oitavo título consecutivo, procura também dar a Hamilton o oitavo título tornando-se assim no piloto com mais títulos (sempre com a Mercedes, quer como equipa, quer como fornecedora de motores) e reforçando a sua posição como estrutura com mais títulos consecutivos.

O que a Mercedes tem conseguido, num desporto de uma exigência tremenda é fabuloso. É a prova de que uma boa organização, uma liderança talentosa e uma equipa determinada que não olha a sacrifícios para chegar ao sucesso pode fazer na F1. A Mercedes reescreveu o guia de como ser bem sucedido na F1 e deu uma lição a equipas como Ferrari, McLaren e Red Bull. A única certeza que podemos ter é que em Brackley e Brixworth há gente determinada em continuar neste caminho e que não se cansa de ganhar.

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