F1: A logística do Grande Circo

Por a 3 Outubro 2018 12:25

São poucas as coisas na F1 que não se tornam espantosas aos olhos do “comum mortal”. A tecnologia, a velocidade, a forma como as equipas trabalham… Um sem fim de motivos de interesse que fazem deste campeonato uma máquina complexa que funciona sempre a tempo e horas.

Um dos grandes desafios que as equipas e os organizadores enfrentam é a logística do transporte de material para as pistas, especialmente se, como acontece esta semana, as corridas forem seguidas. Steve Nielsen director desportivo da F1 falou um pouco das exigências deste trabalho:

“Usamos seis ou sete aviões de carga Boeing 747. Dependendo do que as equipas decidirem, isso pode envolver um sétimo avião. Um 747 de carga leva cerca de 130 toneladas. Não é apenas o equipamento das equipas, mas também o nosso – o centro de transmissão, o equipamento de cronometragem, todo o equipamento da FIA. São mais de 750 toneladas. ” 

Temos de ter em conta que a F1 é um desporto essencialmente europeu e que das 10 equipas que estão inscritas, todas elas têm pelo menos uma base secundária (no caso da Haas) na Europa o que faz que a grande maioria do material terá de sair de solo europeu para os 20GP que se vão realizar. Claro que as equipas mais ricas têm capacidade para transportar mais coisas e torna-se também numa vantagem competitiva.

As provas europeias são relativamente simples de fazer em termos logísticos e como o transporte é feito por camião, relativamente barato. Ainda assim é um grande desafio pois as equipas têm 3 dias para desmontar, transportar e voltar a montar o material necessário, no caso das provas seguidas. O transporte do GP da Áustria para o GP da Grâ-Bretanha foi a parte mais difícil da sucessão de 3 GP seguidos, implicando que cada camião usado tivesse 3 motoristas, um a conduzir e os outros dois a dormir numa caravana que acompanhava os camiões para que assim o transporte se fizessem virtualmente sem paragens.

“As corridas seguidas na Europa envolvem desmontar motorhomes, construir motorhomes, frotas de camiões e todo tipo de movimento. Na Europa, a F1 exige cerca de 300 camiões articulados. Na verdade, é mais complexo que uma prova com transporte aéreo. As distâncias são obviamente muito maiores, mas estamos  basicamente a empacotar e colocar tudo nos mesmos aviões. A F1 organiza o movimento de todos os transportes das equipas e é um processo muito eficiente; a forma como o equipamento se move é muito mais fina do que em uma corrida europeia.”

Mas as provas fora da Europa são muito mais complicadas e aquelas que são seguidas ainda pior. Tivemos o exemplo do GP do Bahrein que foi seguido pelo GP da China. Além da distância há também menos 5 horas de trabalho devido aos fusos horários, uma situação semelhante ao que as equipas enfrentam neste momento para o GP do Japão que receberá as equipas vindas da Rússia.

Mas o planeamento desta prova foi feito com meses de antecedência, logo no início do ano em que cada equipa encheu em média 3 contentores com algum do material a ser utilizado (o mais pesado e menos  dispendioso):

“Digamos que você tenha um equipamento como um torno”, diz Nielsen. “É barato, mas provavelmente pesa 10kg, então faz sentido economicamente fazer cinco e enviá-lo por mar, em vez de voar como um objecto único e pesado por todo o mundo. Isso não se faz  com peças de carros, mas pode fazer-se com barreiras de controlo de multidões ou painéis de garagem, itens maiores e mais pesados com custos relativamente baixos. E assim, geralmente as equipas têm cinco sets. A qualquer momento, dois ou três desses conjuntos estarão em um navio porta-contentores em algum ponto do mundo indo para a próxima corrida. ” 

Por exemplo o set que esteve no GP da China é o que vai ser usado para o GP do Japão. O set do Azerbaijao foi para os EUA e o set do Canadá servirá o GP do México.

Assim o plano para levar o material por avião tem de ser meticulosamente feito e é delineado na quinta feira antes da prova. A desmontagem começa no domingo de manhã altura em que a equipa começa a arrumar peças de substituição que não irão ser usadas na corrida, como o motor. A desmontagem começa 15 minutos após a bandeirada de xadrez e embora os carros tenha de ficar para mais tarde, devido as inspecções, tudo o resto começa a ser desmontado e foi enchido um primeiro contentor com o material que as equipas pretendem ver primeiro na pista. Este material vai encher o primeiro 747 que levantará voo em primeiro lugar.

No caso da corrida no Bahrein, oito horas após o fim da corrida, todos os contentores estavam prontos para seguir viagem (alguns já tinha seguido viagem) e ao meio dia de segunda feira, todos os aviões de carga estavam em trânsito para a China. Na terça feira seguinte já os primeiros contentores estavam na pista de Shangai à espera que todo o material chegasse. Só depois de todo o material chegar é que as equipas podem começar a montar as boxes, o que no caso de Shangai aconteceu na terça de manhã, com os contentores de primeira prioridade. Depois da montagem da primeira fase, a pista voltou a ser fechada para que fossem entregues os contentores de segunda prioridade cuja montagem foi feita na quarta feira. No final da manhã de quarta, todas as boxes estavam operacionais. Foram apenas precisas 58 horas para desmontar, transportar e voltar a montar tudo.

A complexidade deste ballet é cada vez maior uma vez que as equipas pedem cada vez mais material para ser transportado e precisam de mais tempo para o fazer:

“Como as equipas trazem cada vez mais material por mar, eles querem chegar à pista mais cedo e, por isso, temos pedidos regulares das equipes para entrar na pista na sexta-feira, uma semana antes da corrida”, comenta Nielsen. “Se fosse há 15 ou 20 anos, as equipas provavelmente chegariam na terça-feira da semana da corrida. A montagem acontece quatro dias antes, especialmente em provas fora de portas, e é porque a construção da garagem, cabelagem etc é muito mais complexa agora. Do nosso ponto de vista, na F1, nosso centro de transmissão TV é construído ainda antes disso. Acho que nossas primeiras pessoas estão no Brasil na quarta-feira da semana antes da corrida. Para nós e para as equipas, é um processo incrivelmente complexo, quase uma operação militar. ”

Por exemplo aquando da “despromoção” da Force India, os puristas defendiam que a equipa deveria ir para a última boxe, pois era uma equipa nova e segundo a tradição a ordem das boxes é feita segundo a classificação do ano anterior. Mas por motivos de logística tal não se fez pois a Force India já tinha planos e material enviado para uma certa configuração de box e alguma da primeira montagem dos cabos já estava a ser feita para as próximas provas pelo que tal não era prático para nenhuma das equipas envolvidas.

O planeamento desta operação é espantoso e ainda mais espantoso e saber que na sexta quando a luz verde para o TL1 se acener, tudo estará pronto para um fim de semana de competição intensa. Não é à toa que se chama Grande Circo.

 

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