Daniel Ricciardo: Em busca da felicidade

O mercado continua a mexer de forma rápida e surpreendente. O anúncio da saída de Sebastian Vettel acabou com a acalmia vigente nas últimas semanas e poderá mudar completamente a face da F1.

Na última semana o Grande Circo ganhou três protagonistas: Vettel, Daniel Ricciardo e Carlos Sainz. Vettel decidiu que o seu tempo na Ferrari chegaria ao fim este ano e a Scuderia tinha Ricciardo e Sainz em vista para a subsituição, com Sainz a ser o favorito. Logo no dia seguinte ao anúncio de Vettel se dizia que Sainz estava quase certo na Ferrari e que, por conseguinte, Ricciardo estaria a caminho da McLaren.

Esperava-se que o negócio Sainz fosse anunciado primeiro, mas a McLaren antecipou-se e tornou pública a ida de Daniel Ricciardo para Woking em 2021, uma excelente jogada de marketing.

McLaren soma e segue

A McLaren continua a somar pontos. A equipa estava numa posição favorecida, depois de uma época 2019 com claro sinal positivo, tendo evoluído muito e, mais que isso, tendo mostrado grande potencial para o futuro.

Zak Brown demorou a encontrar a fórmula do sucesso. mas depois da trágica época 2018, o americano arregaçou as mangas e tratou de reestruturar a equipa de cima a baixo. Fê-lo maioritariamente com a prata da casa (com a supervisão de Pat Fry), mas a qualidade que existe em Woking permitiu que a reestruturação começasse da melhor forma com a criação do MCL 34. O carro de 2019 melhorou muito em relação ao seu antecessor e permitiu a que a equipa respirasse finalmente.

Mas as mudanças não ficaram só por ai. Com a saída de Fernando Alonso e Stoffel Vandoorne (desiludido e dispensado, respetivamente) a equipa apostou numa dupla de pilotos jovem e irreverente. Lando Norris é a grande aposta da equipa para o futuro e Carlos Sainz ficou sem lugar na Renault e viu na McLaren a hipótese perfeita para relançar a carreira.

A todas estas mudanças faltava só a cereja no topo do bolo que Brown estava a cozinhar: A entrada de James Key para a liderança do departamento técnico da equipa, assim como a contratação de Andreas Seidl. Foram estes dois trunfos que entraram no baralho da McLaren que fizeram a diferença, com Key a ser um dos melhores no desenho de monolugares de F1 da atualidade e Seidl a ter no seu CV a responsabilidade de ter levado o projeto Porsche ao sucesso em Le Mans.

Na teoria tudo parecia muito interessante e a prática comprovou isso mesmo. A equipa cresceu, melhorou, Norris teve um bom primeiro ano e Sainz assumiu-se como estrela do meio da tabela. Foi a sua excelente época na McLaren que terá convencido a Ferrari a contratá-lo.

A McLaren não queria deixar sair o espanhol, mas tinha a tarefa da substituição facilitada porque era agora um assento apetecível ao contrário do que era no final de 2018. Com Vettel livre, a lógica diria que o alemão era a escolha óbvia para a McLaren. Um piloto experiente, titulado e que já tinha expressado publicamente a vontade de assumir um projeto interessante, mesmo que não permitisse lutar logo pelo título. Mas durante o rebuliço que a confirmação da saída de Vettel provocou, Daniel Ricciardo surgiu como a opção mais forte para a McLaren.

Ricciardo em busca da felicidade

Ricciardo abandonou a Red Bull no final de 2018, por considerar que o seu tempo na Red Bull se tinha esgotado e que precisava de um desafio diferente. O australiano quer ser campeão do mundo e terá achado que o foco cada vez maior em Max Verstappen o ia prejudicar. A Renault aproveitou e convenceu Ricciardo a juntar-se ao seu projeto, mostrando-lhe argumentos fortes e a carteira grande, com um contrato de 20 milhões ao ano.

O objetivo não era vencer a curto prazo mas dar passos cada vez maiores rumo a esse objetivo. Mas o ano de Ricciardo na Renault foi longe de ser positivo. O piloto demorou a adaptar-se ao seu novo carro, que não lhe permitia usar o seu truque preferido, que é travar mais tarde que todos os outros. Mas mais preocupante que isso, terá sido o retrocesso que a equipa viveu em 2019. A Renault, no papel, vinha numa progressão clara, mas na prática essa progressão era titubeante, mais demérito dos adversários do que mérito próprio. Cyril Abiteboul disse que a chegada de Ricciardo trazia mais pressão e responsabilidade à equipa, mas que esta era benéfica. A realidade foi diferente e a Renault ficou longe do que prometeu e chegou ao fim do ano atrás da equipa que em 2018 em sexto, longe da Renault e com mais mudanças na sua estrutura. Ricciardo, que tinha assinado por dois anos, terá ponderado se a Renault teria mesmo condições para chegar em tempo útil perto do top3.

Ricciardo fez o que se esperava

A resposta à reflexão do australiano está à vista. Ricciardo assinou pela McLaren onde acredita que poderá ter mais hipoteses de se aproximar dos “grandes” e quem sabe tentar o título. Para o #3 é uma decisao sensata. Não sentindo na equipa francesa a capacidade para chegar onde queria, terá olhado para a Ferrari como a melhor hipótese para ser campeão. A Ferrari é que não terá querido juntar na mesma equipa Charles Leclerc, a nova jóia da coroa e Ricciardo, que não iria certamente aceitar um lugar de nº2 não-oficial. Com as portas da McLaren a abrirem-se, Ricciardo apostou na equipa do meio da tabela que parece ter mais condições de crescer de forma regular e sustentada.

McLaren pode sorrir

Para a McLaren é uma jogada fantástica. Ricciardo é um piloto com créditos firmados, com qualidade acima de qualquer dúvida, experiência e podemos dizer que esta dupla é mais forte do que a dupla Sainz/Norris. A química que existiu entre os dois jovens em 2019 foi um dos segredos do sucesso mas com Ricciardo, a equipa ganha a todos os níveis e a convivência entre Ricciardo e Norris promete também ser boa, e promete oferecer boas gargalhadas. O departamento de marketing da McLaren deve estar no céu pois tem agora para trabalhar dois dos pilotos mais populares do gird e com uma postura irreverente que pode dar um impulso extra à marca. E na pista, onde mais interessa, o objetivo da McLaren continua a ser evoluir e por isso os confrontos entre a nova dupla deverão ser mínimos. Ricciardo sabe jogar de forma “limpa e justa” e Norris está ainda numa fase de aprendizagem e não deverá entrar em conflito com Ricciardo. No fundo a McLaren fica com uma dupla que promete bom ambiente, mas que, com Ricciardo, terá mais exposição mediática e mais possibilidades de bons resultados.

Renault sai derrotada deste processo… para já

Para a Renault é um golpe no ego. Ver a sua estrela anunciar de saída, passando um ano e para uma equipa do mesmo nível é um sinal claro de desconfiança do piloto no projeto. É um “castigo” justo para uma equipa que tarda em dar o que tanto promete. É um cenário que já estaria a ser equacionado, olhado para as declarações de Alain Prost, que afirmava ser quase impossível segurar Ricciardo.

A única forma da Renault compensar esta saída é assinar com um nome forte. Vettel pode ser hipótese, embora o cenário da sua retirada pareça ganhar cada vez mais força, e nos últimos dias Fernando Alonso tem-se divertido a comentar as publicações das redes sociais da Renault. Será apenas divertimento ou um sinal do que o espanhol pode regressar à casa que o tornou campeão do mundo? Seria uma bomba na F1 e Abiteboul poderia respirar de alívio, com a saída de Ricciardo a ser claramente minimizada.

O mercado continua a fervilhar, mas a McLaren pode dar-se por satisfeita e é já uma das vencedoras. Ricciardo agora tem uma nova injeção de moral e irá tentar ser feliz na McLaren e quem sabe voltar a provar o champanhe, servido na sua bota.