Crónica de Monza: “Um sonho de menino”

Por a 10 Setembro 2013 23:07

Em 1992,ao jogar na minha antiga Mega Drive sonhei um dia assistir a uma corrida no Circuito de Monza. Há algum tempo, no final do GP de Valência, após ser desafiado por um grupo de tifosi, decidi que seria em 2013, ajudado pela boa performance da minha equipa favorita, a Mercedes, embarquei e começou aí um cumprir-se um sonho de menino.

Já em Monza, após ter conhecido um filho de portugueses chamado Luís Bastos que acompanha quase todas as competições motorizadas em território italiano, mas já nascido em Itália que me ajudou bastante nas movimentações por lá, foi super fácil encontrar a catedral da velocidade, cheirava-se na atmosfera o GP e já se via vermelho com fartura.

Presente no Autódromo Nationale di Monza, a loucura, o êxtase, as tatuagens , bandeiras, bonés, t-shirts, cabeleiras, caras pintadas, pulseiras , tudo vermelho, a verdadeira onda vermelha, bem regada e nadinha zangados por não haver um único italiano na grelha, houve até quem me perguntasse se Trulli ainda estava por lá. Só a Ferrari conta, só a Ferrari existe e as conversas entre adeptos giram todas entre assuntos Ferrari, quem será o segundo piloto? De quem é a culpa dos mais recentes insucessos? Pelo que me foi possível perceber, os adeptos da Ferrari querem Nico Hulkenberg na Ferrari e Domenicali o mais longe possível de Maranello.

E eu, o intruso da Mercedes, trajado a rigor, sempre recebido com sorriso e uma piada bem alegre para o “intruso”. Passear no banking foi algo indescritível e ao mesmo tempo desolador, o asfalto trova como um motor, cheira a borracha queimada, e devido à curva acentuada é muito difícil de subir a pé até ao rail, que ‘mostra’ as dificuldades de quem lá andou há muitos anos. A vegetação em redor pinta o resto duma paisagem deliciosa para um adepto de F1 como eu, mas a triste conservação até me fez chorar, tudo velho, piso rachado, rails enferrujados, e alguns arrancados, buracos enormes onde se levantam plantas, não é assim que se conserva um marco tão maravilhoso e único como o banking de Monza.

Apenas tive oportunidade de visitar o que resta do anel de velocidade que fica paralelo à parabólica, e segundo me informaram, o resto do anel situado na zona das boxes está muito melhor conservado.

“Se a esposa me trair, ao menos que ele tenha um Ferrari”

É hora da qualificação, as bancadas não estão cheias mas a cerca de 90% ocupadas, bandeiras ao vento, só se vê tifosi, para aí 98% das pessoas equipam à Ferrari, algo nervosos pelos resultados, mas com um crer e uma vontade incrível, cada pessoa que circula na boxe da Ferrari é logo brindada com uma ovação enorme. Faltam poucos minutos para começar e um grupo de tifosi começa a festa com uns foguetes de fumo vermelho, claro. Os pilotos vão saindo, as cabeças seguem os carros e um olho para os ecrãs, nenhuma movimentação nem manifestação anormal até quando passam os Toro Rosso, que são também uma equipa italiana até que saem os dois Ferrari, e aqui começou a festa, a verdadeira festa, quase todos de pé, a gritarem pela Ferrari abanando bandeiras, a verdadeira loucura, o fim do mundo, aliás, perguntei a um adepto o que dizia o cartaz dele, não foi fácil, mas consegui perceber algo como “se a esposa me trair, ao menos que ele tenha um Ferrari que assim não me importo e perdoo”, por outro lado Vettel, Hamilton e Raikkonen sempre que passam causam uma reação mista, aplausos dos seus adeptos que não são muitos e apupos dos tifosi.

Infelizmente no meio da reta não é permitido vislumbrar grande trabalho por parte dos pilotos, visto seguirem em aceleração pura sem travagens ou mudanças de direção. Com o final da Q1 e sem surpresas de maior, já que todos os eliminados são usuais e a poucos minutos de começar a Q2, o mesmo grupo volta a soltar um foguete de fumo vermelho. A mesma situação repete-se os carros começam a sair e todos calmos, até que os Ferrari se fazem a pista e mais uma fez, uma festa imensa, gritos, agitar de bandeiras, punhos cerrados ao ar, festejam o erro de Hamilton na parabólica visto nos ecrãs porque só se viu poeira a ser levantada e vão-se festejando os tempos obtidos por Massa mas principalmente por Alonso, no final da secção festeja-se a eliminação de Hamilton, Raikkonen e Grosjean quando são anunciados nos altifalantes, e festeja-se a passagem dos dois Ferrari.

Instantes antes de começar a Q3,o mesmo grupo lança o terceiro foguete, avistei um grupo de tronco nu em que cada um tinha escrita uma letra no peito e todos juntos formavam… Ferrari claro. Durante a Q3,toda a gente a roer as unhas, foi a fase mais silenciosa, todos a espera de ver o resultado final e quando termina o tempo e os carros terminam as suas últimas voltas, noto uma meia desilusão entre os tifosi, ainda para mais com os Red Bull na frente, Hulkenberg em terceiro e só depois os Ferrari, ainda por cima liderados por Massa que todos parecem unânimes que já não pertence à família Ferrari.

No meu ponto de vista ainda fiquei mais desolado com o resultado alcançado pela Mercedes. Após o anúncio dos resultados e a foto dos três primeiros praticamente 80% das pessoas começam a preparar-se para ir embora e com todas as conversas a girarem em volta da corrida de amanhã, todos partilham a estratégia correta, a hipótese de chuva, as suas opiniões e comentam o facto de Hulkenberg ser terceiro e a boa qualificação da Toro Rosso, mesmo assim o principal assunto são as possibilidades reais da Ferrari vencer a corrida.

Com o grupo do Luis no hotel percebi que todos estão esperançados numa vitória de Alonso com uma recuperação semelhante à feita em Spa. A noite, na rua, nos restaurantes, cafés, bares, toda a gente já tem a cabeça na corrida e todos os estabelecimentos estão decorados a rigor, todos sonham e desejam com uma vitória da Ferrari.

No domingo, a viagem até ao circuito foi um caos, um trânsito enorme, alguma chuva a cair, nada de alarmante mas a causar confusão na cabeça de todos, mas quando chegamos, o mesmo espectáculo de ontem, os tifosi estão prontos, equipados e já numa festa impressionante, sente-se o amor e carinho no ar. Já no meu lugar fiquei calmamente a espera da parada de apresentação dos pilotos, com um céu com cara muito feia e um chuvisco de vez em quando, em que se repete um dos rituais do fim de semana, na apresentação de Alonso e Massa, a loucura, cânticos, bandeiras, punhos no ar e com Vettel, Hamilton, Rosberg, Raikkonen alguns apupos, nada exagerado, mas nota-se o desconforto dos tifosi com estes pilotos em especifico.

Os momentos entre a parada dos pilotos até ao início da corrida, parecem ser os mais calmos do fim de semana, toda a gente parece estar a preparar-se para a corrida e a possibilidade de chuva causa uma azáfama anormal com os pilotos a saírem e a entrarem varias vezes nas boxes com pneus diferentes, calma apenas perturbada para lançar os últimos incentivos a Alonso, Massa e todos os operacionais da Ferrari. Todos de pé no hino italiano e está tudo preparado. A corrida é a seco e todos estão esperançados. Com a boa partida dos Ferrari o primeiro momento de festa, só após a ultrapassagem de Massa e com as paragens de Vettel e Alonso é que há alguma tensão nas bancadas, fora isso até foi uma corrida relativamente calma nas bancadas apenas apimentada com alguma boas ultrapassagens em plena reta da meta, visto as posições dos Ferrari estarem praticamente controladas desde início.

Após a corrida, nota-se uma desolação enorme nos tifosi, assobiam Vettel, Webber, Newey, os hinos alemão e austríaco, os únicos momentos de festa acontecem quando é anunciado Alonso, no momento que lhe é entregue o troféu e após as suas respostas no pódio, a invasão calma e pacífica apenas serve para brindar Alonso e o seu segundo lugar que todos parecem conformados que Vettel era inalcançável hoje. Durante a saída dá para notar que o campeonato está entregue pelos tifosi, mas o entusiasmo está lá na mesma, cantam, berram, agitam bandeiras, tudo conformado mas orgulhoso.

Em suma, felizmente já pude assistir a vários eventos desportivos, mas certamente esta aventura em Monza foi claramente a mais emocionante, mais apaixonante, mais única em que participei, tudo isto após um resultado insuficiente da Mercedes, mas mesmo assim, fiquei maravilhado com tudo, o ambiente, o circuito, a envolvência, o amor dos tifosi é realmente especial e tornaram esta experiência realmente inesquecível.

Recomendo a todos os adeptos de F1, como eu, que se um dia puderem dentro das suas possibilidades, visitem Monza no fim de semana de Grande Prémio, vale bem a pena. Um dia prometo voltar.

Pedro Torres

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