Opinião: A Verdade de Carlos Tavares, a importância de Vila Real e o bom senso
É tempo de balanços em Vila Real. A 53.ª edição do Circuito Internacional de Vila Real teve um “sabor” diferente, com as competições históricas a preencherem quase por completo a agenda do animado fim de semana na capital transmontana. Uma espécie de homenagem ao passado, enquanto Vila Real procura um novo presente e futuro.
O balanço do fim de semana acaba por ser positivo. Tivemos em pista máquinas de outros tempos, que até fizeram parte da história do Circuito e que, por exemplo, estiveram nas filmagens do filme Le Mans. Com tempo, haveremos de abordar esses temas com o devido cuidado. O que interessa dizer por agora é que a ideia de fazer de Vila Real um festival do automóvel mostrou potencial. Lamenta-se apenas a grelha de apenas 10 carros nos protótipos da Peter Auto, algo que deu que falar. Não foi um evento com a emoção de outras edições, mas o público apareceu para fazer a festa.
Os históricos deram um colorido muito bonito à festa, com as competições da ANPAC também em excelente plano. Nas provas dos Clássicos, dos 1300 e até dos Legends e Super Legends, vimos boas lutas, mas ficou a sensação que a novidade, a Taça de Vila Real, acabou por merecer mais atenção por parte do público que, apesar de um cartaz com menos nomes sonantes, fez questão de marcar presença.
Carlos Tavares e a possibilidade da Fórmula E
Quem também marcou presença foi Carlos Tavares. Em entrevista à Universidade FM, rádio local, escancarou as portas à hipótese Fórmula E. O AutoSport falou com o CEO do grupo Stellantis e tentou confirmar a hipótese:
Quando Tavares fala, todos ouvem com muita atenção. A sua visão do mundo automóvel, a sua influência e o seu conhecimento obriga a que todos estejam atentos. A forma simples como passa a sua mensagem e a sua visão abrangente provam que a sua chegada ao topo da pirâmide da indústria automóvel não aconteceu por acaso. Tavares é um apaixonado por carros e pela competição. Apaixonou-se também por Vila Real e mostrou vontade de fazer algo pelo desporto motorizado nacional. Uma ajuda deste nível deve ser bem aproveitada.
Nacional ou internacional? Eis a questão
As suas declarações motivaram comentários por parte de muitos nomes reconhecidos do nosso desporto, enfatizado a necessidade de colocar os recursos onde eles são necessários, para fazer evoluir o desporto nacional. Nada mais acertado. Apesar da realidade económica global não ser a mais entusiasmante, o desporto motorizado português ganhou um novo fôlego com a maioria das competições a crescerem em quantidade e qualidade. Se conseguirmos que essa evolução seja consolidada, poderemos ter o desporto nacional como o queríamos há muito tempo. E para isso, é preciso investimento.
O caso de Vila Real é especial. Atualmente o maior palco do norte do país, e um dos circuitos citadinos, mas emblemáticos da Europa, Vila Real acontece porque há vontade política do município local em ceder as suas ruas para lá se fazerem corridas. E a vontade, desde o início deste regresso, foi tornar internacionalizar o circuito, o que acabou por se concretizar. Em 2014 Vila Real voltou em força e em 2015, de forma quase surpreendente, recebeu o WTCC. Foi com a vinda do WTCC que Vila Real se transformou num palco apetecível.
Ausência do CPV lamenta-se
Atualmente, discute-se a importância da presença da competição maior da velocidade nacional, o CPV, que atravessa uma fase muito positiva, muito por culpa do trabalho da Race Ready e do seu líder Diogo Ferrão. Foi Diogo Ferrão que se mostrou insatisfeito pela falta de condições que as equipas do CPV enfrentaram em Vila Real. Foi Diogo Ferrão que bateu o pé e disse que sem as condições mínimas o CPV não regressaria a Vila Real, o que acabou por acontecer este ano.
Do lado da organização de Vila Real, foi-nos dito que houve abertura para encontrar soluções, que o promotor e as equipas foram convidados para ir a Vila Real dar a sua opinião. Esse convite, segundo os responsáveis transmontanos, não foi aceite.
Chegamos, portanto, a uma fase em que o interesse coletivo começa a ser esquecido e aqui englobamos todos os envolvidos.
Sabemos que havia queixas já de há algum tempo das equipas nacionais, com alguns pormenores a deixarem a desejar. Todos entendem que a prioridade tem de ser dada a competições internacionais, mas as estruturas nacionais precisam de condições semelhantes para trabalhar. Sabemos também que por parte da organização de Vila Real tentou-se encontrar soluções. As condições muito específicas do evento obrigam a uma boa dose de imaginação e organização para encaixar as peças todas. Nem sempre deu para que todos ficassem satisfeitos. Este desencontro, fez com a principal competição nacional de velocidade não visitasse o seu maior palco, pela envolvência e pela festa.
A importância das competições internacionais em Vila Real
As palavras de Carlos Tavares têm sido usadas para apontar a importância das competições nacionais e que se deve apostar nelas em detrimento das internacionais. Mas, mais uma vez, o bom senso tem de imperar. Vila Real assumiu, desde início, que queria ser internacional, uma aspiração legítima. Conseguiu-o e, graças a isso, cresceu. Vila Real sem o WTCC não teria a mesma força que tem agora. Vila Real sem as vitórias de Tiago Monteiro no WTCC, sem o triunfo de Manuel Pedro Fernandes no ETCC, sem o espetacular acidente resolvido de forma brilhante pelos incansáveis comissários, sob a liderança do CAVR, em tempo recorde (e em direto, para todo o mundo ver), não seria o que é hoje. O WTCC foi a janela para o mundo de uma festa que pode e deve ser mais do que um evento local. A exposição internacional mostrou uma organização capaz, a todos os níveis. Vila Real, ao ritmo do CPV, apenas agora começaria a ter uma festa que justifique o esforço dos habitantes locais que enfrentam ruas fechadas. Neste regresso, Vila Real já acolheu o CPV com grelhas demasiado pequenas. Pode parecer que Vila Real está a virar as costas ao CPV, mas a verdade é que a festa transmontana também já fez muito pela principal prova nacional de velocidade.
A importância da exposição internacional não pode ser esquecida e Vila Real é hoje uma potencial opção para campeonatos de renome, porque causa dessa exposição internacional.
E isso justifica a ausência do CPV? Não. Mas explica a postura dos locais em apostar em competições de fora e, por vezes, dar-lhes prioridade. Mas a equação é ainda mais complicada. Enquanto Vila Real teve festas de deixar o mundo de queixo caído, as lutas políticas eram abafadas pelo ruído da multidão a clamar os heróis do volante. A unanimidade, mesmo que circunstancial, assegurava o futuro do evento. Desde a queda do contrato com o DTM que a luta política local tem-se feito sentir de forma mais vincada. Vila Real não é um circuito. É uma cidade do interior do país, com pessoas que fazem lá a sua vida e se calhar nem gostam de corridas. É preciso que o esforço de montar uma estrutura que compromete o conforto de muitos compense. E se não compensar, o circuito deixa de existir.
Solução? União e bom senso
Num mundo onde as opiniões extremadas são moda, este texto irá, por certo, interessar a poucos. Porque me parece que a solução está a meio caminho de todos os argumentos expostos. Carlos Tavares tem razão quando diz que o investimento deve ser ponderado e que dar 15 milhões (ou mais) para receber a Fórmula E, ou outra competição de renome internacional, deve ser algo a pensar de forma cuidadosa. O desporto motorizado nacional tem potencial, tem equipas, tem pilotos, tem qualidade e com esse dinheiro, poderia dar o salto que todos queremos. Mas os organizadores de Vila Real também têm razão quando dizem que querem um circuito internacional, com provas que deem exposição mediática mais forte à região. Foi graças a isso que o nome voltou a ganhar força e a cidade ganhou nova vida. Diogo Ferrão também tem razão quando exige melhores condições ao CPV.
Todos perdem quando as relações se crispam, quando as divergências se acentuam, quando as costas se voltam. Vila Real é um palco demasiado importante. E tudo o que se faça para prejudicar o sucesso do evento é grave. O desporto motorizado não tem ainda a força que deve ter para se poder dar ao luxo de perder um dos melhores palcos, especialmente nesta fase em que temos apenas dois traçados prontos a receber corridas. Vila Real deve ser preservado e, para isso, as pessoas devem remar para o mesmo lado. A FPAK tem aí um papel fundamental, do qual não se pode alhear. A FPAK, como organização que zela pelo desporto automóvel, tem a obrigação de reunir todas as partes, de forma neutra, promover soluções.
É uma questão de bom senso. Sem união, Vila Real fica em perigo. E com isso perdem todos.
Fotos: NunOrganista e Nuno Costa
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Vila Real sem competições internacionais não faz sentido nenhum, mas como o contribuinte paga e não bufa, anda-se a despejar dinheiro para o encher o ego (e os bolsos de alguns).