O problema que os ralis têm com a TV, que é difícil de resolver…

Por a 15 Janeiro 2024 18:52

Há precisamente 20 anos, o AutoSport entrevistou David Richards, na altura Presidente da ISC, International Sportsworld Communicators, firma detentora dos direitos comerciais do Mundial de Ralis, como é agora a Red Bull Media House e o WRC Promoter, cargo que Richards detinha desde abril de 2000.

Nesse período, a empresa trabalhou para melhorar a cobertura televisiva e promover o campeonato para um público mais amplo, mas o trabalho não correu muito bem e em 2006 Richards quis afastar-se para se dedicar à equipa Subaru World Rally, e à Prodrive. O tiro saiu um pouco pela culatra, pois a Subaru pouco depois saiu do WRC e o projeto de F1 da Prodrive com a BAR-Honda também não correu bem.

Curiosamente, é interessante recordar o que disse David Richards na altura, pois muitos dos problemas que tinham os ralis na altura, mantêm-se, passados 20 anos.

David Richards dizia na altura que a grande prioridade continuava a ser o mercado televisivo e por isso, pretendiam aumentar não só quantitativa, mas também qualitativamente, os diretos das classificativas.

Como sabemos, hoje em dia temos a RallyTV, que é perfeita para os adeptos hardcore que não querem perder pitada das provas, e que têm dias inteiros de transmissões em direto, entrevistas, media zones, comentários, análise, tudo e mais alguma coisa para quem é apaixonado pelos ralis, mas quem de direito ainda não percebeu que o produto não funciona para as massas…

Os ralis têm um problema

Ao contrário da F1, e das corridas em pista, os ralis e as provas de estrada têm um grande problema para resolver com a TV. É que durante uma semana inteira em que a caravana do WRC aterra num país para disputar uma prova, só há cerca de 45 minutos de ‘boa TV’ para os adeptos não-harcore: a PowerStage.

Não há adepto ‘comum’ nenhum que esteja um dia inteiro a ver a RallyTV, e ver um resumo ao fim do dia, quando já todos podem ter ido ver os resultados é ‘poucochinho’.

A maioria dos desportos prendem a atenção do telespectador se lhe derem espetáculo e um clímax. No caso do futebol, os golos, e o fim do jogo. Há um resultado, uns ganharam, outros perderam ou empataram. É um espetáculo que começa, acaba, e pode ter vários momentos de êxtase pelo meio.

É perfeito para a TV.

A Fórmula 1 ou as corridas em pista, funcionam bem, e mesmo assim já estão a criar mais momentos-chave, para além da qualificação, que prende as pessoas: quem vai ser o mais rápido, depois há o Grande Prémio: como vai ser a corrida e quem ganha no fim? E agora inventaram as corridas Sprint, para haver mais momentos bons para a TV e para os adeptos. Resulta.

Como é nos ralis? Giro, giro é ver ao vivo. Ver ralis pela TV, ok, os adeptos minimamente conhecedores podem ver um troço durante a prova, pelo espetáculo, mas ali ninguém ganha nada, exceção feita à PowerStage em que já alguém ganha alguma coisa: o rali. Agora, com as novas regras, os ralis vão ter um pouco mais de interesse para o adepto eventual. No fim do dia de sábado há alguém que vai somar mais pontos do que os outros, é uma novidade – nem sequer interessa se os vai confirmar ou não no domingo – e no domingo há o vencedor do dia, o vencedor da PowerStage e o vencedor do Rali. E o que soma mais pontos.

Pode ajudar um bocado a TV, mas não resolve o problema grande que os ralis têm com a TV.

Não há ‘golos’, não há um ‘jogo’ em que começa aqui e acaba ali 90 minutos depois, como o futebol.

Como a F1. Os ralis são outra ‘coisa’. Portanto é muito difícil massificá-los através da TV. Até porque, convenhamos, o Mundial de Ralis não é um produto tão forte quanto era nos anos 80 e 90 e até meio da década de 2000. Foi a partir daí que perdeu força.

Veja o que dizia David Richards na altura: “devemos informar os espectadores o melhor possível. Devemos ser mais criativos e menos ‘politicamente corretos´. Ainda não esgotamos todas as possibilidades que temos. No próximo ano pretendemos mostrar três diretos de ralis disputados na Europa. Temos acesso a muitos ‘ingredientes’ que poderemos explorar nas transmissões. Só é preciso a equipa da ISC ganhar, agora, mais confiança e realizar mais testes”

Já na altura o problema estava identificado mas o difícil era encontrar uma solução.

Na altura, David Richards, patrão” dos direitos televisivos, insistia no sistema ‘1000 Pistas’ como ele lhes chamava, que era um rali compacto que se fazia num dia e tudo ficava ali decidido.

Foi David Richards que contribuiu para desvirtuar a estrutura dos ralis, transformando-os em trevos com uma base ao invés de ralis em linha com quatro ou cinco dias. Foi na tentativa de adequar o ‘produto’ a algo mais agradável para a TV, que os ralis se desvirtuar. Mas o problema está muito longe de ter sido só pela estrutura. Provavelmente a estrutura até foi o menor dos seus males.

Dizia David Richards: “…os ralis passarão a ter duas passagens por troço no mesmo dia. Com este novo sistema, a ISC também terá que mudar o seu ‘modus operandi’ pois terá que passar a concentrar o trabalho na parte final do rali, em detrimento dos programas nocturnos. E aí a principal dificuldade serão os condicionalismos inerentes aos ralis. Esta instabilidade afeta tanto o equilíbrio do negócio, como perturba as marcas e os espectadores. Mas o nosso trabalho é fazer o ‘sistema’ funcionar… qualquer que ele seja!”

A verdade é que foi por essa altura, em que Richards saiu da ISC, que os ralis foram perdendo gás, e até hoje nunca mais ninguém conseguiu resolver os problemas que David Richards detetou na altura: “Mesmo com audiências elevadas, que subiram 65 por cento em relação ao ano passado e totalizaram mais de 918 milhões de espectadores, a ISC não chegou ainda a acordo com a FIA quanto ao modelo de cobertura televisiva a implantar no próximo ano. O principal problema reside no novo sistema das “1000 Pistas” que, com horários semi-rígidos (dependentes dos atrasos ou não dos reconhecimentos), não facilitam a definição do tipo de programa que a empresa de Richards pretende pôr em prática. Taxativamente, “nesta altura, não podemos dar um calendário de programação aos emissores”.

O ideal para a detentora dos direitos de transmissão do Mundial seria que os ralis começassem às 05h00

da manhã para que o horário de chegada pudesse ser cumprido. Se isso acontecer, ficará então só por decidir

qual o modelo de cobertura a colocar em prática”, disse Richards na altura ao AutoSport.

Ironicamente, agora é ele próprio e Richard Reid que lideram agora o Grupo de Trabalho que procura soluções para o WRC. Pode ser que tenha mais sorte, e na verdade os ralis têm agora um problema bem mais grave do que há 20 anos. Vamos esperar para ver como tudo evolui…

Só uma nota final para o sucesso do Dakar. Também não temos transmissões, só um resumo diário, mas o Rali Dakar é um sucesso também entre as massas. Porque é o rali mais difícil do mundo, toda a gente conhece o Dakar, por causa disso, por ser uma aventura. Resumindo, a ASO soube bem aproveitar a ‘marca’ Dakar. Mesmo sendo apenas uma vez por ano, tem uma legião de fãs que voltam todos os anos, mesmo que durante o ano não liguem a mais nada dos motores…

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Scb
Scb
11 meses atrás

O Dakar é o Dakar porque acontece 1x ano. Às outras provas do W2RC ninguém liga. 24h Le Mans idem, só os fãs hardcore de endurance prestam atenção às restantes rondas do WEC. E ambas provas, Dakar e WEC dão num canal mais ou menos acessível ao contrário do WRC. O Rali de Portugal tem muita gente na estrada, na exponor, nos restantes ralis também acredito que seja mais ou menos similar. É verdade que não é tão interessante ver na tv mas nos anos 90 tudo que tivesse tv à 5a e 6a à tarde transmitiabo Rally de Portugal… Ler mais »

F1 FOR FUN
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Reply to  Scb
11 meses atrás

Eu não sou fã hardcore do WEC, sou sim da F1 (vejo todas as sessões de F1, F2 e F3), mas vejo todas as corridas do WEC, vejo todas as especiais do WRC, vejo todas as corridas de Indycar, de motogp, o dakar como são só resumos isso não me dá interesse, se transmitissem onboards durante o dia teria muito gosto em acompanhar.

mpedro
mpedro
11 meses atrás

Tem tudo a ver com a transmissão ser aberta. O Dakar é um exemplo, outro talvez até mais parecido com o WRC na transmissão é o ciclismo, também não parece fácil no entanto há quem veja as etapas do início ao fim, se tivessem de pagar por isso especificamente quem via?

F1 FOR FUN
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Reply to  mpedro
11 meses atrás

Aberta? Mas o Dakar tem transmissão? Tem um resumo de 9 minutos no YT, um programa na Eurosport que nem sempre dá nas horas certas se é que dá, por isso deixei de ver.

F1 FOR FUN
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11 meses atrás

Não podem comparar o Dakar com o WRC, o Dakar só tem resumos o WRC só vale a pena se for como no ano passado com a sport TV, ou transmitem todas as especiais ou então não vale a pena ligar a TV para ver uma ou duas especiais por dia sem perceber o contexto. Eu vejo as etapas do WRC normalmente em diferido, escolho os pilotos mais rápidos e pressiono FFW para os restantes. Este ano promete ser rápido de ver só existem 4/5 pilotos que justifiquem o meu tempo (Estou a ver o Kalle vai partilhar o carro… Ler mais »

F1 FOR FUN
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11 meses atrás

O ciclismo é o que está mais próximo do WRC e TT, são corridas por etapas, quem gosta como eu vê as etapas desde o início, não vão transformar o WRC em 3 Power stages para que os adeptos “informais” fiquem felizes, isso já existe chama-se rally cross. O futebol também é chato para alguns, tem jogos de 90 minutos, mas também existem resumos gratuitos para adeptos “informais”.

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