Mundial de Ralis com nova era: Vida nova no WRC
Vai arrancar com o Rali de Monte Carlo uma nova era do WRC. Pela primeira vez na história da competição, carros de rali híbridos substituem os fantásticos WRC 2017/21. Entre muitas dúvidas, uma coisa parece certa: emoção e competitividade não vão faltar…
José Luís Abreu
FOTOS @World/André Lavadinho e Oficiais
Vai arrancar em Monte Carlo a 50ª edição do Mundial de Ralis, e está à porta uma nova era do WRC. Pela primeira vez na história da competição, e depois da Fórmula 1 o fazer já desde 2014, e o WEC, desde 2012, os novos carros de topo nos ralis, os Rally1, são híbridos.
Trata-se da maior mudança de sempre de regulamentos técnicos no Mundial de Ralis, com os carros a atingirem pela primeira vez desde os ‘monstros’ dos Grupos B, potências acima dos 500 cv, quando combinada a potência do motor de combustão, o mesmo 1.6 litros turbo já conhecido desde 2017, com a grande novidade, um sistema híbrido que adiciona 100 Kw, cerca de 136 cv, para ser utilizado pelos pilotos nos troços, de acordo com regras que pode ler nas páginas seguintes.
Para esta nova geração de carros de Rally1 híbridos, disseram presente os mesmos três fabricantes que perderam a companhia da Citroën Racing no final de 2019: a Toyota Gazoo Racing, Hyundai Motorsport e a M-Sport/Ford.
Outro ponto muito positivo desta mudança, é o facto dos novos regulamentos técnicos conduzirem o WRC rumo a um futuro mais sustentável. Os novos Rally1, que foram concebidos em torno de um chassis com a célula de segurança muito melhorada, têm também a partir de agora combustível 100 por cento isento de fósseis.
Não sendo possível acabar com as emissões nocivas para a atmosfera, reduzem-se significativamente, mitigando os seus efeitos pela primeira vez na história da competição.
Os três fabricantes tiveram vêm de duas épocas, 2020 e 2021 muito condicionadas pela pandemia de covid-19, e ainda lograram conseguir, ao mesmo tempo que competiam pelos títulos em jogo, pensar, desenhar, construir e desenvolver carros completamente novos que veem agora a luz do dia em competição, já a partir de amanhã no Rali de Monte Carlo.
Um novo campeão
Com a saída de Sébastien Ogier a tempo inteiro do WRC, e depois de mais dois títulos nos últimos dois anos para o francês, a temporada de 2022 vai ter um campeão novo, talvez completamente novo.
Tal como pode comprovar pelas estatísticas que damos à estampa lá mais para a frente, desde 2004 que os campeões foram Sébastien Loeb ou Sébastien Ogier, com a exceção de 2019, em que foi Ott Tanak a vencer.
É certo que a competição vai ter um novo campeão, logo veremos se será uma novidade absoluta ou o estónio.
Se há ano em que antever quem pode ser o campeão é difícil é esta. Carros completamente novos, muita coisa para aprender, mudança grande de paradigma em termos de pilotagem, pela primeira vez na sua história de pilotos, vão ter que fazer ‘lift and coast’ para poupar energia na bateria.
Há demasiadas coisas novas que impedem que se faça uma análise consubstanciada. Até porque com carros completamente novos, desenvolvidos por três equipas completamente diferentes, qualquer uma delas pode ter descoberto um caminho melhor do que as outras. Isso só vamos saber em competição e dificilmente em Monte Carlo.
Quanto muito vamos ter uma ideia do que os carros podem valer face aos outros, mas com tantas incógnitas na equação do Rali de Monte Carlo, é muito difícil ter certezas, pois mais do que o que valem as máquinas, as escolhas de pneus certas têm um valor enormíssimo no Rali de Monte Carlo.
Seja como for e se olharmos para 2017, as três equipas, quatro na altura, construíram e desenvolveram carros muito semelhantes em termos competitivos e foi mesmo o trabalho das equipas e dos pilotos com os seus engenheiros que foi fazendo a diferença.
Por exemplo, se olharmos para 2021, a Toyota venceu nove vezes face aos três triunfos da Hyundai, mas a Toyota esteve somente 115 troços na frente dos ralis face às 97 vezes da Hyundai o que mostra um equilíbrio diferente do número de triunfos de cada uma.
Como bem sabemos, não foi tanto a performance que fez a diferença, mas sim a fiabilidade. E esta vai ser decisiva neste ano de carros completamente novos.
Tendo em conta que neste momento é impossível ter a mais pequena ideia do que valem os carros face aos adversários, se olharmos somente para a qualidade dos plantéis, a M-Sport, apesar da entrada de Craig Breen, continua a ser a equipa com um plantel mais fraco face ás adversárias. Contudo, tendo em conta que baixou muito o nível de empenho na operação do WRC 2020 e 2021 – não contrataram pilotos de ponta, de modo a poupar dinheiro para 2022 – e colocaram todo o esforço, dedicação e afinco, no projeto de 2022, isso pode significar agora que apesar de ter um plantel mais fraco, o valor do carro face aos adversários pode equilibrar os pratos da balança. Mas isso vamos saber mais tarde…
Olhando apenas para os plantéis, Toyota e Hyundai estão ambas mais fracas face a 2021.
A Toyota porque perdeu Sébastien Ogier, embora o vá ter em quatro ou cinco provas durante o ano. Vai certamente ajudar na luta dos Construtores, provavelmente já muito bem em Monte Carlo. Para o substituir chegou Esapekka Lappi. O finlandês conseguiu a sua única vitória no WRC precisamente na Toyota e é um valor seguro no seio da equipa.
Elfyn Evans lutou pelo título até à última prova nos últimos dois anos, e isso diz muito do piloto que é hoje em dia. Kalle Rovanperä venceu pela primeira vez em 2021, e já não tem o mesmo handicap que trouxe até aqui: a menor experiência. A partir de agora a questão já não é se consegue vencer, mas sim se vai lutar pelo título.
Takamoto Katsuta só tem com ‘obrigação’ fazer melhor que no ano anterior.
Na Hyundai parece-nos estar o melhor plantel.
Thierry Neuville tem este ano provavelmente a sua melhor oportunidade de ser campeão.
Já não há Ogier, mas logo ali ao lado há Ott Tänak. O estónio e dois pilotos da Toyota (Evans e Rovanpera) e vamos ver como será com Craig Breen na M-Sport/Ford.
Se tivéssemos a certeza que todos os pilotos se adaptariam bem aos novos carros e que estes eram equilibrados como em 2017, apontaríamos claramente Ott Tanak como favorito ao título. Dani Sordo e Oliver Solberg vão partilhar o terceiro carro, do veterano espanhol espera-se bons pontos para os Construtores e do jovem sueco, que cresça e se junte rapidamente às lutas na frente como fez Rovanpera.
Na M-Sport/Ford, só mesmo Craig Breen tem capacidade para aproveitar uma eventual maior competitividade do novo Ford Puma Rally1. Mostrou-o nos últimos tempos na Hyundai, está motivado como nunca. Vamos ver como suporta essa pressão.
Adrien Fourmaux pode melhorar um pouco o que fez em 2021, mas vai ter que mostrar em 2021 se vai chegar-se com consistência às lutas da frente, especialmente no asfalto ou se fica apenas um bom piloto do meio do pelotão. Gus Greensmith continua a ter dificuldades de evoluir o mesmo que os seus adversários pelo que a sua diferença para os homens da frente mudou pouco em dois anos, apesar de estar, naturalmente, um melhor piloto. Mal seria se não estivesse. Por fim, Sébastien Loeb. Tem previsto apenas o Monte Carlo, que bom seria fazer mais provas com a M-Sport: aumentaria muito a possibilidade da equipa fazer bons resultados.
Claro que tudo isto depende da forma como os pilotos se vão adaptar aos carros e ao novo estilo de pilotagem. veja-se o caso de Tanak, campeão em 2019 com um Toyota com seis vitórias e terceiro do campeonato com apenas um triunfo. A diferença esteve na não adaptação imediata à nova equipa e carro. Algo deste estilo pode sempre acontecer, um piloto não se adaptar a uma nova realidade. Ou o contrário, também. Destacar-se muito.
Enorme mudança
Com os três novos carros: Toyota GR Yaris Rally1, Hyundai i20 N Rally1 e Ford Puma Rally1, abre-se uma nova era no WRC, sendo segundo Malcolm Wilson “a maior mudança de sempre no Mundial de Ralis”. A fiabilidade será um fator crucial na luta pelos títulos deste ano, pois há tanto detalhe que as equipas ainda não podem dominar a 100%..
Todos gostariam de ter mais tempo para testes, pois há muitas áreas completamente novas nos carros deste ano, mas o Rali de Monte-Carlo está aí à porta.
Por fim, um detalhe importante para os adeptos. Tendo em conta o recuo em alguma tecnologia que foi vista nos WRC 20217/21, por uma questão de custos, os carros serão mais simples, não há diferencial central, a suspensão é menos evoluída a aerodinâmica dos carros retrocedeu muito, portanto os carros vão ser mais lentos, pelo menos para já, porque o seu potencial, com a potência híbrida é enorme. Em teoria, em partes dos troços (explicações mais à frente) os pilotos terão bem mais de 500cv para explorar e isso vai ter que fazer diferença no cronómetro. Sébastien Ogier diz: “os Rally1 vão evoluir depressa, WRC foram em 2021 bem mais rápidos que em 2017”. E tem toda a razão.
Vamos ver o que nos traz o WRC 2022. Em teoria todas as equipas vão agora poder lutar por vitórias, o que não sucedeu nos últimos três anos, por isso os ingredientes para um grande campeonato estão no ‘lume’. Vamos ver se a ‘refeição’ sai saborosa…