As fintas do Rali de Castelo Branco ao vírus
O Rali de Castelo Branco marcou, com sucesso, a retoma da modalidade em Portugal. As saudades que pilotos, comissários, responsáveis e, acima de tudo, adeptos tinham de ver os carros em acção, eram grandes. A Escuderia Castelo Branco assumiu o desafio de quebrar este hiato e, com o contributo de todos, organizou a prova que fintou, por completo, o vírus que criou um novo normal.
Faltavam duas semanas para mais uma edição da Baja TT do Pinhal, primeira prova do Campeonato de Portugal de Todo-o-Terreno, quando Portugal confinou. Um vírus altamente contagioso, que alterou o ritmo da vida das mais diversas sociedades no planeta, fazia com que a maioria das pessoas tivesse de ficar em casa. A Escuderia Castelo Branco, responsável pela organização da ronda inaugural da temporada de TT em Portugal, suspendia, assim, boa parte da sua atividade.
Este período de confinamento prolongou-se durante mais de três meses. “Todas as provas que tínhamos previstas para março, abril e maio foram adiadas assim que percebemos que a situação não se ia alterar tão depressa”, explicou o presidente da Escuderia, António Sequeira.
A incerteza instalou-se. Voltar a levar a competição do papel para as estradas ou para as pistas era o maior desejo. Mas ninguém sabia quando isso podia acontecer. “Por momentos, ainda pensámos que poderíamos organizar uma prova em junho, a Perícia Alegro Castelo Branco. Mas com a aproximação da data e a forma como o vírus se transmitia em Portugal, essa possibilidade deixou de existir”, contou o responsável. Perante este cenário, a equipa passou a dedicar os seus esforços para a retoma do Campeonato de Portugal de Ralis, com o Rali de Castelo Branco.
Originalmente, seria a sexta prova da competição. Com a pandemia, transformou-se na segunda ronda do ano. Mas para que se tornasse uma realidade, era necessário fazer uma série de alterações e adotar novos procedimentos. “A FPAK manteve contactos com a DGS e com o Secretário de Estado do Desporto. Entretanto, juntamente com a equipa médica, apresentou um documento às autoridades que chamou de plano de contingência”, afirmou António Sequeira. Este processo não teve, apenas, uma etapa. Não se pode dizer que tenha havido avanços e recuos, mas nem tudo era claro porque o país desconfinava a um ritmo semanal, após as reuniões do Conselho de Ministros que determinavam novas regras. Por isso, o documento original apresentado pela FPAK tinha medidas que, quando foi apresentado, ainda nem podia ser colocado em prática na totalidade. A federação procedeu, entretanto, a algumas alterações e criou o manual de competição. “Pegámos nesse documento e fomos, pela primeira vez, falar com o delegado de saúde de Castelo Branco, o Dr. Joaquim Serrasqueiro. Não o fizemos no passado, mas desta vez precisávamos, como autoridade de saúde, da sua ajuda e do seu aval. Havia, inclusivamente, entidades que não se sentiam confortáveis sem o parecer favorável dos responsáveis sanitários” revelou o presidente da Escuderia.
Um rali é organizado por um clube mas resulta do trabalho entre diversos agentes. Nesta fase, em que se vive perante uma ameaça tão complexa como a provocada pelo SARS-CoV-2, este compromisso de todos foi ainda mais importante. Disso foi exemplo o trabalho desenvolvido com o delegado de saúde de Castelo Branco. “Prontamente analisou tudo e ajudou-nos com uma série de informações e recomendações para organizarmos o rali”, adiantou António Sequeira.
Com os dados recolhidos e o manual emanado pela FPAK, a equipa de Escuderia Castelo Branco criou o seu próprio plano de contingência, adequado às especificidades do rali albicastrense (ver caixa). Este trabalho foi desenvolvido sempre com a incerteza no ar. A novidade que é este vírus e o desconhecimento que existe, fez com que tudo fosse preparado com a consciência que, num dia ou noutro, tudo iria por água abaixo. Ou porque tinha surgido um surto na região, ou porque as autoridades nacionais tinham deliberado dar um passo atrás na retoma da normalidade.
O Rali de Castelo Branco foi, contudo, uma realidade. Durante dois dias, as 89 equipas que esgotaram a lista de inscritos competiram nos troços desenhados nos concelhos de Vila Velha de Ródão e de Castelo Branco. Com máscara, produtos desinfetantes e distanciamento social, foi possível colocar na estrada o evento que marca a retoma do desporto automóvel à normalidade possível.
No primeiro dia, os concorrentes discutiram três especiais. No segundo dia, houve mais quatro. Todas elas com a generalidade dos intervenientes a cumprirem as regras de forma escrupulosa. No final, não houve cerimónia de pódio para evitar aglomerados de pessoas na zona centro da cidade de Castelo Branco. Sem a festa final, a Escuderia fez questão de entregar, à partida, um troféu de participação exatamente igual a todos os concorrentes que participaram na edição de 2020 do rali.
As medidas que deram luz verde ao rali
A Escuderia Castelo Branco propôs uma série de medidas objetivas para obter a autorização de realizar o Rali de Castelo Branco.
Todos os processos burocráticos que podiam ser realizados à distância, com recurso a soluções digitais, foram assim concretizados. Foi o que aconteceu com as verificações técnicas e com as reuniões de antevisão do rali, vulgarmente conhecidos por briefings. Foi feita uma grande aposta em comunicação, com a criação de sinalética específica. A Escuderia Castelo Branco adquiriu equipamentos de proteção individual, produtos desinfetantes e promoveu o distanciamento social. Em todas as situações em que era necessário, o pessoal da organização tinha EPI ao seu dispor. Nos troços, os controladores dispunham de álcool-gel e tinham condições para estarem distanciados. Para evitar ajuntamentos, a organização abdicou de um dos momentos altos das edições passadas do Rali de Castelo Branco, a super-especial. Oportunidade de ouro para divulgar a prova e aumentar o alcance do evento, teve de ser cancelada porque era complicado gerir milhares de pessoas. Na edição de 2019, e segundo a PSP, a super-especial tinha recebido 30 mil espectadores. Também com o intuito de promover o distanciamento social, a Escuderia Castelo Branco aumentou o investimento em comunicação com destaque particular para transmissão de uma classificativa através do canal do clube no Facebook. Esta foi uma das formas de levar o rali a casa das pessoas que assim não se deslocariam para os troços.
“Apoio dos pilotos foi fundamental”
A Escuderia Castelo Branco conseguiu levar a bom porto a realização do Rali de Castelo Branco. Mas para que isso fosse uma realidade, precisou do contributo de diversos intervenientes. O presidente do clube organizador destaca a forma positiva como as equipas contribuíram para que o regresso dos ralis fosse uma realidade.
“O seu contributo foi fundamental. A associação de pilotos, presidida pela José Pedro Fontes, teve um papel muito importante. Desde as reuniões com a FPAK, até às condições que aceitou para termos o rali na estrada. Acordou com o cancelamento da super-especial, importante para a visibilidade dos seus projetos desportivos. Segundo as autoridades policiais, em 2019 estiveram presentes quase 30 mil espectadores nesta classificativa urbana”, explica o presidente da Escuderia, António Sequeira. Além disso, cumpriram as restrições que existiam no parque de assistência, desta edição do Rali de Castelo Branco. “Nesta prova, os pilotos e os responsáveis das equipas concordaram com a diminuição importante de pessoas acreditadas para acederem a esta zona da prova. Foi necessário reduzir o número ao mínimo indispensável. Basicamente, o pessoal técnico tinha autorização para entrar e pouco mais. Os patrocinadores e os familiares, desta vez, não puderam ir à assistência com a aceitação dos pilotos”, explicou António Sequeira.