Ayrton Senna: 10 momentos que criaram um mito
Ayrton Senna da Silva. Um nome para a eternidade. Uma das maiores estrelas mundiais de sempre, uma das maiores do desporto automóvel. Para muitos, a maior. A 21 de março de 1960, há pouco mais de 64 anos, nascia Ayrton. À sua maneira, com a sua intensidade e talento, conquistou o mundo.
Cumprem-se este ano 30 anos da morte de Ayrton Senna, a 1 de maior de 1994, e do fim de semana mais trágico da história da Fórmula 1, onde morreu também, a 30 de abril, o austríaco Roland Ratzenberger. Ao volante do medíocre Simtek, na volta antes do acidente fatal perdeu parte de uma asa da frente, que se quebrou em definitivo após a passagem pela Tamburello, quando seguia a mais de 300 km/h, com o despiste a dar-se na curva Villeneuve, onde embateu violentamente, até se imobilizar na Tosa. Recordado o austríaco, vamos lembrar 10 momentos que ajudaram a criar o mito Ayrton Senna.
Como conquistar a imortalidade? Gravando na memória de milhões de adeptos pelo mundo inteiro alguns momentos inesquecíveis em pista, onde Ayrton Senna conquistou um estatuto único. A forte personalidade, a propensão mística e as polémicas com Prost ou Piquet construíram também uma aura que não se apagou no dia 1 de Maio de 1994. Muitos outros seriam possíveis, mas escolhemos os momentos e os acontecimentos que guindaram Ayrton Senna da Silva ao Olimpo do desporto. O primeiro deles foi precisamente há 24 anos, 11 de abril de 1993, Donington, dia em que Ayrton Senna da Silva escreveu um dos melhores capítulos da história da F1.
A corrida da sua vida: Donington 93
“Pinta o carro dele de vermelho e branco, dá para mim, e vocês vão ver como o Williams anda na chuva!” com esta simples frase, Ayrton Senna resumia o que foi o GP da Europa de 1993. Uma corrida fabulosa onde ao volante do pouco competitivo McLaren-Ford, humilhou todos os seus adversários, especialmente Alain Prost. Antes disso, na partida, caíra para sexto mas no final da primeira volta já estava no comando, com quatro segundos de vantagem sobre o francês! Para muitos, esta corrida foi uma das melhores prestações individuais da história da F1.
- A rivalidade com Alain Prost na McLaren
Em qualquer livro, filme ou artigo sobre os grandes duelos da Fórmula 1, a rivalidade Ayrton Senna e Alain Prost é sempre referida como aquela que mais efervesceu. A imensa rivalidade entre ambos iniciou-se em 1988 quando foram companheiros de equipa pela primeira vez na McLaren e prolongou-se no tempo, até ao final de 1993, quando francês abandonou a F1. Pelo meio ficaram demasiadas guerras, polémicas, mas acima de tudo corridas memoráveis e um imenso respeito entre ambos. Em poucos meses, a F1 perdeu, por motivos diferentes dois dos seus expoentes máximos, que ainda hoje granjeiam o respeito e a admiração de milhões de fãs.
- A primeira vitória, no GP de Portugal
Pouco faltou para que a primeira vitória de Ayrton Senna tivesse tido lugar no GP do Mónaco em 1984 mas quis o destino que fosse no Estoril, em Portugal, no ano seguinte, após um autêntico bailado à chuva. Numa pista perfeitamente alagada a exibição permitiu-lhe dar uma volta a quase todos os adversários e vencer com mais de um minuto para o segundo classificado. Para muitos foi esse o momento em que Senna entrou definitivamente na galeria dos grandes pilotos de F1.
- O primeiro título mundial em 1988
Após três anos na Lotus com um carro que ficava sempre um degrau abaixo da competitividade necessária, Ayrton Senna foi contratado pela McLaren e não demorou muito a mostrar que não tinha medo do mais experiente Alain Prost. Apesar de alguns erros críticos no Mónaco e em Monza, o piloto brasileiro foi imparável na Bélgica (à chuva) e no Japão (após uma partida falhada), num rasgo de fogosidade que mostrou que um verdadeiro campeão nunca pode ter medo quando está em pista. No seu primeiro ano de McLaren teve a seu lado um ‘monstro’ Alain Prost, com o qual repartiu as vitórias em 15 dos 16 Grandes Prémios desse ano. Numa luta sem quartel, Senna venceu oito corridas contra sete de Prost o que lhe permitiu assegurar no Japão o seu primeiro título. Três pontos apenas separaram os dois pilotos numa época em que as tensões vividas entre os dois extravasaram e muito os limites da pista, numa apaixonante luta que se estendeu aos anos seguintes.
- As polémicas com Nelson Piquet
Quando Senna chegou à Fórmula 1, Nélson Piquet estava no pico da sua carreira, tendo conquistado dois títulos até ali. Naturalmente, o carioca não ficou nada satisfeito por ter que partilhar a atenção da imprensa brasileira quando apareceu um paulista novato. O ódio entre os dois brasileiros cresceu rapidamente e as críticas à pilotagem rapidamente se transformaram em insultos pessoais que ultrapassavam todas as noções de decoro. Por exemplo, a história do “Pergunta para tua mulher…” Quando em 1988 Nelson Piquet insinuou aos jornalistas que o seu compatriota não gostava de mulheres – inflamando boatos sobre a natureza da relação de Ayrton com o amigo Américo Jacoto Júnior, algo que Lilian classificou como “um absurdo de gente que não tem nada para fazer” –, Senna ripostou numa entrevista à Playboy em 1990. “Eu conheci a Katherine (Valentin)”, referiu sobre a companheira belga de Piquet. “Mas conheceu como?”, insistiu o jornalista. “Eu a conheci como mulher…”.
- O Rei do Mónaco
O circuito urbano de Monte Carlo é considerado um dos mais difíceis do mundo, mas Ayrton Senna fez dele o seu ‘circuito-fétiche’ depois um impressionante andamento em 1984 à chuva com o Toleman. A sua primeira vitória no principado ocorreu em 1987 na Lotus, mas um erro infantil custou-lhe o triunfo em 1988 (já na McLaren) quando comandava folgadamente. Foi uma lição porque de 1989 até1993, a última vez que correu nas ruas de Monte Carlo, o brasileiro ganhou todas as corridas no traçado monegasco, Senna sabia exatamente onde extrair cada milésimo de segundo, mesmo com carros inferiores à concorrência. Por isso, ainda hoje, Ayrton Senna continua a ser o Príncipe Perfeito do Mónaco, com um total de seis vitórias, cinco delas consecutivas, um reinado precocemente interrompido naquela tarde fatídica em Imola, duas semanas antes do GP de Mónaco de 1994, onde o brasileiro abdicaria postumamente do seu reinado.
Mas, o mais exigente e mítico circuito de F1 começara a forjar uma lenda chamada Ayrton Senna precisamente dez anos antes, em 1984, ano de estreia na disciplina que o iria imortalizar. Foi a inesquecível primeira “serenata à chuva” de Senna, quando levou o modesto Toleman-Hart ao segundo lugar, depois de partir da sétima fila e galgar lugares, sob intenso temporal, até se colar na traseira de Prost e só não vencer porque Jackie Ickx (director de prova) decidiu dar por terminada a corrida. Para a primeira vitória no Mónaco, Ayrton teria ainda de esperar três anos, já que em 1985 (já na Lotus Renault) o prémio de consolação foi a sua primeira pole position em Monte Carlo (acabou por desistir com o turbo partido), e em 1986 não foi além do último degrau do pódio.
Mónaco: A primeira vitória em 1987
A primeira vitória de Ayrton Senna, simultaneamente a primeira de um brasileiro e de um motor Honda no GP do Mónaco, foi em 1987, num momento em que as relações com Peter Warr e a equipa Lotus Honda já não eram propriamente as melhores, devido à pouca competitividade do chassis Lotus.
Para corrigir as violentas vibrações do motor a Lotus adotou a revolucionária suspensão activa, mas acabou por pagar o preço do pioneirismo com a falta de fiabilidade nas primeiras provas da temporada, onde os Williams de Piquet e Mansell se mostraram superiores. O irascível Mansell (que havia tentado agredir Senna nas boxes em Spa) alcançara a pole position e partindo da frente dominou a seu bel-prazer o primeiro terço da corrida com mais de 10 segundos de vantagem para o brasileiro, mas o coletor de escape do Williams acabou por partir, deixando assim o caminho aberto para Ayrton Senna.
No final, Senna reconhecia que, “foi mais fácil esta vitória, do que o terceiro lugar no ano passado.”
O reinado de Senna no Mónaco conheceu uma breve interrupção no ano seguinte, num Grande Prémio que apesar de tudo marcaria fortemente a carreira do piloto. Já na McLaren-Honda como companheiro de equipa de Alain Prost, o paulista arrancou uma pole position absolutamente impressionante, com uma série de voltas “sobrenaturais”, e dominou por completo a corrida, depois de um mau arranque de Prost. Distendido na liderança, Senna acabou por desconcentrar-se e cometer um erro fatal para as suas aspirações, raspando na parede do interior da curva Poitiers, e indo embater nos rails.
Mónaco: Um reinado de cinco anos
A longa soberania de Senna no Mónaco iniciar-se ia no ano seguinte (1989) com uma vitória esclarecedora, num fim-de-semana marcado pelo corte de relações com o seu companheiro de equipa Alain Prost. Em 1990, Senna bisa no Mónaco, recolhendo como habitualmente o seu “dote” monegasco – pole position, vitória e recorde da pista. Uma demonstração de clara superioridade no ano do seu segundo título, o mesmo tónico que marcou a sua 30ª vitória em GP`s, comemorada em 1991 no Mónaco, onde completou também um início de temporada arrasador com quatro vitórias seguidas, que lhe foram preciosas para garantir o seu terceiro título, numa altura em que os Williams-Renault começavam a emergir como a nova potência dominante.
Apesar da nova era, Ayrton Senna manteve inexpugnável o seu reinado em 1992, quando bateu os supersónicos Williams-Renault de Mansell e Patrese, interrompendo uma série de cinco vitórias seguidas de Mansell. A taça de Rainer voltava a fugir das mãos do britânico, quando a dez voltas do fim foi obrigado a parar nas boxes por causa de uma porca mal aparafusada na roda! Nas quatro últimas voltas Senna defendeu-se estoicamente dos ataques do furioso Mansell, erguendo uma magistral barreira defensiva. O reinado de Senna no Mónaco termina em 1993, quando vence, a guiar com um contrato “por grande prémio” com a McLaren-Ford e já de “namoro pegado” com a Williams, (onde vira a sua entrada barrada por Alain Prost). O brasileiro termina com quase um minuto de vantagem sobre o Williams de Damon Hill e bate o recorde de vitórias em Monte Carlo, na posse de Graham Hill desde 1968. Muitos anos passados sobre a sua morte, esse é dos poucos reinados intactos.
- O misticismo de Senna
Uma das facetas mais polémicas e discutidas de Senna era o seu misticismo e fé, que se foi acentuando ao longo da sua carreira. Numa entrevista à Playboy brasileira, Senna explicou a “experiência” no GP do Mónaco de 1990. Lutando contra um McLaren desequilibrado, Senna pediu força a Deus e afirmou ter tido uma visão “Eu podia ver-me fora do carro. Em torno da máquina e de meu corpo havia uma linha branca, uma espécie do auréola, que me proporcionava força e proteção. (…) Entrei em uma outra dimensão. Tive uma paz incrível e certeza de que estava equilibrado, no corpo e na alma.” Esta espiritualidade foi também uma marca forte na personalidade do piloto.
- As 65 pole-positions
A primeira foi no GP de Portugal de 1985 e a última, precisamente no fatídico GP de São Marino de 1994. Ao todo foram 65 pole-positions, o recorde que Michael Schumacher mais tempo levou a bater. A tremenda capacidade de concentração e a precisão milimétrica em qualificação, mesmo com carros menos competitivos, eram uma das marcas de água da pilotagem de Ayrton Senna, celebrado pelas inesquecíveis ‘voltas canhão’ que faziam de qualquer qualificação de um Grande Prémio de F1, um grande espectáculo.
- 1991: O ano do tricampeonato
Nenhum título foi mais difícil para Ayrton Senna que o terceiro. Depois de um bom começo, com vitórias nas quatro primeiras corridas, o brasileiro foi ultrapassado de repente por Nigel Mansell e pelo mais competitivo Williams. Recorrendo à sua força de vontade e superior capacidade de afinação, o brasileiro conseguiu dar a volta à situação com três vitórias consecutivas na Hungria, Bélgica e Itália e arrumou a questão definitivamente na penúltima prova, no Japão.
- Vitória ao milésimo no GP de Espanha de 1986
O que dizer duma corrida de 300 km que se decide ao…centímetro. Ayrton Senna e Nigel Mansell necessitaram de ‘photo-finish’ para saber quem tinha ganho, mas esse foi somente o culminar de uma das corridas mais emocionantes da história da F1. 14 milésimos de segundo, apenas, separaram ambos, de tal forma que o inglês queria ver uma foto que lhe provasse que tinha perdido. Para Senna esta foi apenas a terceira vitória da sua carreira, curiosamente a primeira em que a pista estava totalmente seca.