WRC: Os melhores de sempre para Martin Holmes
O WRC.com lembrou-se agora de ir à procura do GOAT (greatest of all times) dos ralis numa votação que não se pode fazer bem sem que todas as gerações votantes conheçam bem os contextos dos candidatos a receber os votos. Para isso, chegaram a uma lista de 20 pilotos, que como todas pode ser sempre alvo de críticas, mas quem escolhe, escolhe e quem quer votar, vota.
Não queremos influenciar ninguém nas votações, e a ajuda que vamos dar é diferente. Fomos pedir ao Martin Holmes, que anda há 45 anos pelo Mundial de Ralis, primeiro como praticante e depois como jornalista, e que há quatro décadas contribui para as reportagens do AutoSport.
Com quase cinco centenas e meia de ralis na bagagem pedimos-lhe para escolher os pilotos mais marcantes das primeiras três décadas. Das últimas duas já sabemos quem foram…
Aqui ficam as palavras de Martin Holmes:
“A única forma de deixar uma marca no desporto, é ser simplesmente o melhor. Por isso, os quatro mais marcantes e influentes pilotos do Campeonato do Mundo de Ralis, eram há 15 anos os mais bem sucedidos da história da modalidade. Todos eles competiram no período de vida do AutoSport que, através das suas reportagens em mais de 500 provas do Mundial, foi testemunha privilegiada das proezas e da carreira do ‘bando dos quatro’. Sendo uma escolha subjetiva, Carlos Sainz foi para mim o maior piloto de ralis de todos os tempos, como o comprovam as estatísticas, até então… e não só. Juntamente com ele, Juha Kankkunen, Colin McRae e Tomi Makkinen foram os pilotos que moldaram a imagem da disciplina nas décadas de 80 e 90.
“El Matador” Com 26 vitórias no “Mundial” e dois títulos no bolso, o percurso de Carlos Sainz está intimamente ligado a Portugal. Um dia, quando o espanhol venceu a primeira etapa do Dakar, recordei-me da vitória na primeira etapa do Rali de Portugal de 1987, na sua estreia em provas do Campeonato do Mundo, no Autódromo do Estoril, no seu potente Ford Sierra Cosworth. Carlos Sainz foi também o grande responsável por colocar os ralis no mapa da popularidade em Espanha e o seu país no mapa do Mundial.
Em 1991, um ano depois de ter vencido os primeiros quatro ralis e o primeiro título mundial, Espanha passava a ter uma prova pontuável para este campeonato e Sainz tornava-se um dos mais populares desportistas do seu país. Dificilmente alguém pode dizer que Carlos Sainz foi um piloto bafejado pela sorte, antes pelo contrário. O seu sucesso deve-se sobretudo à sua impressionante determinação e ao total profissionalismo com que encarava todos os aspetos da competição e que fizeram dele o paradigma do piloto de ralis da era moderna e o modelo a seguir.
Carlos foi apenas duas vezes Campeão do Mundo, mas perdeu outros dois títulos ingloriamente. Recordam-se do RAC 1998?
Lenda britânica
Olhando para as imagens dos destroços mecânicos parecer estranho que coloque Colin McRae como o segundo melhor piloto de ralis de sempre. Mas as estatísticas falam por si. A seguir a Sainz, o britânico era piloto com mais vitórias em provas pontuáveis para o Campeonato do Mundo de Ralis e, tal como Carlos Sainz, venceu por duas vezes o Rali de Portugal. Colin foi o primeiro piloto inglês a vencer um rali do Mundial fora de portas e também o primeiro súbdito de Sua Majestade a sagrar-se Campeão do Mundo de Ralis.
Mas, o grande contributo de Colin McRae para o desporto automóvel foi a forma como foi gerida a sua tremenda popularidade, quer em termos desportivos, quer em termos financeiros.
Ele foi o mais bem pago piloto da história da modalidade e também aquele que emprestou o seu carisma a novos produtos, como o comprova a saga do extremamente bem sucedido jogo de computador, Colin McRae. Ele trouxe também para este desporto uma incrível concentração em resultados e um estilo de condução temerário e aguerrido que manteve, mesmo após o terrível acidente que teve em 2000, como o comprovam as cinco vitórias posteriores à dobragem do milénio.
Infelizmente, Colin McRae ficou tão famoso pelas fantásticas vitórias, como pelos aparatosos acidentes. Poucos pilotos terão tido oportunidade de destruir tanto material de alta competição como ele. Não era defeito, era feitio – entrega total e aplicação máxima levavam-no a cometer excessos que se foram tornando menos frequentes à medida que foi amadurecendo – a sua vitória no Rali Safari de 1997 provou que o fogoso inglês já sabia “dominar-se”, e que cultivava uma postura de frieza absoluta que o tornava incólume à pressão, a grande inimiga de qualquer piloto de topo, em qualquer disciplina. Tenho muitas saudades dele…
Maximum attack
O seguinte na minha lista é Tommi Makinen, o mais bem sucedido finlandês da história dos ralis. A tradição diz que os finlandeses são os melhores pilotos do mundo, mas as estatísticas nem sempre corroboram a tradição. Apesar disso, Makinen e o seu compatriota Kankkunen merecem lugar cimeiro na galeria dos notáveis. São eles os dois únicos pilotos a terem colocado por quatro vezes a sua assinatura no livro dos campeões mundiais, Makinen com a particularidade de ter somado quatro títulos consecutivos. Apesar de ter ganho um rali com a Ford e outro com a Subaru, foi a sua longa colaboração com a Mitsubishi que marcou a história deste desporto. Durante o seu período áureo e vitorioso (entre 1995 e 2001), os Mitsubishi nunca foram carros excecionalmente superiores ou performantes.
Tecnicamente conservadores, os engenheiros da marca apostaram na fiabilidade, robustez e no génio de Makinen para assegurar um reinado
ímpar nos ralis. Olhando para trás, e para esse período de ouro da Mitsubishi, é mais fácil perceber que Makinen era de facto um sobredotado, capaz de mobilizar toda uma equipa e ser um verdadeiro chefe-de-fila, interpretando da melhor maneira cada estratégia de corrida rumo ao título
mundial. Ele era o mestre do “last stage attack”, ou seja, desferia o golpe fatal nas últimas especiais.
Já Juha Kankkunen tinha um estilo completamente diferente, mas terrivelmente eficaz. Gravou o seu cunho na década de 80, primeiro com os ‘monstros’ de Grupo B – o Peugeot 205 T16, e mais tarde com a Lancia nos Grupos A. Ele foi o piloto de transição, já que se sagrou Campeão do Mundo nos dois anos que revolucionaram a modalidade e, mais tarde, em 1993 com a Toyota.
Ao contrário de Tommi, que se ‘especializou’ com uma marca, Juha guiava qualquer carro. Péssimo em políticas, desmoralizava facilmente
quando as coisas não lhe corriam de feição e era a antítese do piloto-estrela. Na essência, era um rapaz do campo que se tornou uma estrela
internacional, mas que não perdeu a simplicidade e a pureza que fizeram dele uma das personalidades mais estimadas dos ralis.
Markku Alen: Um lugar no coração
O mundo da competição automóvel está cheio de causas justas e de pilotos injustiçados pela sorte e pela história. No meu coração dois pilotos ocupam um lugar muito especial – Stirling Moss, que nunca ganhou um título mundial de F1 e Markku Alen, que só segurou o ceptro Mundial de Ralis durante onze dias, antes da FIA ordenar a recontagem dos resultados e retirar o título ao finlandês.
Alen venceu pela primeira vez o Rali de Portugal em 1975, e depois assinou a primeira vitória do Fiat 131 Abarth no ano seguinte na Finlândia, prosseguindo então uma carreira recheada de sucessos, primeiro em Grupo 4, e depois em Grupo B e Grupo A, quase sempre ao volante de máquinas italianas. Uma coisa espantosa em Alen era que se podia quase adivinhar o que ia fazer durante um rali, bastando olhar para a sua cara. Sucesso e desapontamento estavam lá estampados e, quando motivado e com um bom carro, Alen era um piloto muito difícil de bater, mesmo nos tempos em que olhando para a lista de inscritos se viam nomes como Walter Rohrl, Miki Biasion, Hannu Mikkola, Ari Vatanen, e em que nunca se sabia quem ia estar no pódio no final. Alen correu sempre com o mesmo prazer com que um adolescente pega num carro desportivo, e essa alegria era transmitida para uma condução tão espetacular como eficaz. Alen só não foi um campeão nas estatísticas”, conclui Martin Holmes.
Martin sera sempre Martin
A sua cronica e de um senhor único na historia do WRC
Eu que comecei a vê-lo nos longínquos anos setenta