WRC: Histórias do Rali de Monte Carlo

Por a 24 Janeiro 2020 13:47

São cinco as provas que todos os anos mais interesse suscitam junto dos adeptos dos desportos motorizados: Indy 500, 24 Horas de Le Mans, Dakar – e as duas últimas estão centradas no pequeno Principado do Mónaco – o GP de F1 do Mónaco e o Rali de Monte Carlo.

Este último é um evento mítico, com um glamour próprio, para muitos o melhor rali do Mundo. Pelo menos o mais antigo é, certamente, já que se disputou pela primeira vez em 1911, completando esta edição 102 bonitos anos. Para trás ficaram milhares de histórias de espetáculo, emoção, drama e muita controvérsia. Das muitas que aqui poderiam ser contadas, escolhemos alguns dos momentos que explicam a razão do Rali de Monte Carlo ter a fama que alcançou.

1966: Se não os podes vencer…

Depois de vencerem as edições de 64, com Paddy Hopkirk, e 65, com Timo Makinen, os Cooper S da equipa BMC voltavam a assumir o favoritismo em 1966. E confirmaramno na estrada, chegando ao Mónaco nos três primeiros lugares, com Makinen à cabeça. Mas após as últimas verificações, os comissários decidiram desclassificar os carros da BMC, bem como outros concorrentes, alegando irregularidades nos faróis. Pauli Toivonen, ao volante de um Citroen DS 21, herdava assim os louros da vitória e a notícia da exclusão dos Mini corria o Mundo. Aos franceses, teria sido difícil ‘engolir’ um terceiro triunfo consecutivo dos pequenos carros ingleses, mas a polémica desclassificação conferiu-lhes ainda maior mediatismo e a verdade é que dos carros vermelhos com tejadilho branco se falou muito mais do que se tivessem conquistado a terceira vitória consecutiva em Monte Carlo…

1979: Mistério nunca resolvido

O Rali de Monte Carlo de 1979 permanece na lista de ficheiros secretos do WRC, já que nesse evento sucedeu uma daquelas situações que os ralis não precisam. No final da Etapa Comum, e quando faltava apenas a noite do Turini, dois Ford Escort RS 1800 de Hannu Mikkola e Bjorn Waldegaard lideravam com mais de quatro minutos de avanço. Foi neste momento que os planos da Ford vieram montanha abaixo, já que Mikkola foi penalizado em cinco minutos por excesso de velocidade. Com as condições de estrada a mudar, a Dunlop teve de fazer escolhas de pneus para levar nas carrinhas de assistência (tinha dois tipos de carros diferentes, Escort e Fiesta) e escolheu mal. Darniche pôde levar toda a panóplia e mesmo 6m27s atrás de Waldeggard acreditava poder vencer. Fez vários melhores tempos e a 35 km cronometrados do fim do rali estava a 1m31s de Waldegaard, que conta o que se passou a seguir: “A meio duma ponte estavam quatro enormes pedras, ali colocadas por alguém. Tentei passar por cima, mas uma ficou presa no carro”. Perdeu 1m16s, e passou a liderar por apenas 15s. Mas o sueco não sabia e foi desmotivado para o último troço, perdendo o rali por seis segundos: “Se eu soubesse a diferença teria andado doutra forma…”, disse no final.

1981: Nacionalismos franceses

é o tédio, e por isso, muitas vezes fazem o que não devem enquanto esperam pelos carros. Bebem… ou têm ideias idiotas. Foi o que sucedeu no Rali de Monte Carlo de 1981, quando na sequência de uma interesssante luta pela liderança entre o Porsche 911 de Jean-Luc Therier e o Renault 5 Turbo de Jean Ragnotti, os espectadores decidiram intervir na luta, fazendo pender a balança para um dos lados. Se é verdade que incomodaram um francês em prol de outro, o futuro vencedor corria numa marca francesa, face a um francês num carro alemão. Hannu Mikkola liderou de início, impondo o seu Audi Quattro, mas duas saídas de estrada traíram-no. Na etapa final, foi a vez de Jean Luc Therier liderar da PE11 à PE24, e quando tudo se parecia encaminhar para um triunfo da Porsche, os espectadores assim não o entenderam, colocando neve na estrada, que naturalmente surpreendeu Thérier, que se despistou no local. Uma vitória de grande importância na carreira do piloto ficava afastada pela inconsciencia do público, e seria Jean Ragnotti a receber de mão beijada um triunfo completamente inesperado.

1984: O aluno e o professor

Durante os treinos para o Rali Monte Carlo de 1984, Stig Blomqvist ficara incumbido de partilhar com Walter Röhrl, recém-chegado à Audi, os segredos da condução de um carro de tração integral. Considerado o piloto mais rápido da equipa, o sueco era o principal favorito à vitória no rali e o alemão revelava-se um aluno atento, escutando a voz da experiência em condução na neve. Logo no primeiro troço, Röhrl revelou uma surpreendente adaptação ao Quattro e nas terceira e quarta classificativas – Saint Bonnet le Froid e Le Moulinon, foi mesmo mais rápido que Blomqvist. À medida que a confiança aumentava, Röhrl aproximava-se do seu ‘professor’ e na PEC nº 16, chegou definitivamente ao comando, para não mais o largar, conquistando a quarta vitória na prova monegasca, sempre com carros diferentes. O ‘aluno’ estudara bem a lição…

1985: Escreveu-se direito por linhas tortas

A fase inicial do Rali de Monte Carlo de 1985 ficou marcada por mais um sinal que os Grupos B precisavam das pessoas mais longe da estrada, quando Ari Vatanen, em Peugeot 205 Turbo 16, teve uma saída de estrada e atropelou vários espectadores. Isso não impediu o finlandês de construir uma vantagem de dois minutos face a Walter Röhrl, em Audi Sport Quattro, no final da 18ª especial, isto depois do alemão ter liderado de início. Depois, o drama. Terry Harryman, navegador de Vatanen, engana-se e controla quatro minutos antes da hora ideal. Um momento de distração foi suficiente para converter uma boa vantagem num atraso de seis minutos, em teoria irrecuperável. Mas não no Monte Carlo, uma prova onde é possível esperar pelas más escolhas de pneus dos adversários. Foi o que sucedeu com Walter Röhrl no Col de St. Raphael, logo ele que não era batido nesta prova desde 1979. Em dois quilómetros de especial já Vatanen tinha ultrapasssado Röhrl no troço, e no final era o novo líder do rali, com 53 segundos de avanço. Terry Harryman podia respirar de alívio e a Peugeot regressava às vitórias no Monte… 53 anos depois.

1987: Em Roma sê romano

A vitória da Lancia no Rali de Monte Carlo 1987 mostrou o poderio da marca naquela época dos ralis, já que em apenas seis meses, logo após a interdição dos Grupo B, a marca escolheu o modelo mais adequado da sua gama, o Lancia Delta HF 4WD, e construiu um carro vencedor. Mas o primeiro rali da nova era do Grupo A o WRC foi polémico. Com Miki Biasion e Juha Kankkunen a lutar metro a metro pela vitória, e os adversários já muito longe, teve de ser Cesare Fiorio, mítico líder da Lancia a intervir, decidindo que o vencedor da especial do Turini deveria ser o vencedor do rali: “Eu queria que a vitória fosse decidida de uma forma desportiva, mas também não queria que arriscassem a cada classificativa. Deu tudo errado”, admitiu Cesare Fiorio. Juha Kankkunen, Campeão do Mundo de 1986, recém recrutado à Peugeot, é que não gostou nada da decisão, e ainda menos quando viu a luz da temperatura do seu Lancia acender-se. Foi um final infeliz para uma notável vitória de Biasion, com Juha Kankkunen a parar o carro já com o final do troço à vista. Começava mal a era pós grupo B.

1993: As derrotas de Delecour

Quando no Rali de Monte Carlo de 1991 a Ford contratou François Delecour, não imaginava que ele obtivesse 11 vitórias em especiais e fosse para a derradeira noite de rali na frente de Carlos Sainz. Só que, no último troço, o Turini, a suspensão traseira do Sierra 4X4 cede e o francês chora, perdendo a vitória. Dois anos depois, na estreia do Ford Escort Cosworth, voltou a realizar um belo Monte Carlo, liderando grande parte da prova, indo para a derradeira noite na frente do rali. Desta feita não teve problemas com o carro, mas a verdade é que não aguentou a pressão de Didier Auriol, que venceu. Até aqui tudo normal, os ralis são mesmo assim. Só que nas cronometragens parciais, os homens da Ford perceberam que os Toyota ganhavam dois segundos por quilómetro nas zonas a subir, algo anormal a este nível. Apesar da felicidade de Ove Andersson, a FISA realizou minunciosas verificações ao Celica. Nada foi descoberto e Delecour adiou por mais dois meses a sua primeira vitória no WRC. Nesse ano, não se voltou a falar da fabulosa performance do motor dos Toyota em Monte Carlo, mas dois anos depois, quando a Toyota foi excluída por irregularidades tecnicas nos seus carros, na Catalunha, muita gente se lembrou do Monte Carlo de 1993…

1995: O gato preto de Carlos Sainz

Carlos Sainz venceu o Rali de Monte Carlo depois de François Delecour perder as hipóteses de triunfar devido à quebra dum amortecedor na última noite da prova. Parece um dejá vu, mas a verdade é que a história foi bem diferente de 1991. Após uma boa luta, o espanhol chegou à última noite com uma pequena vantagem de 12 segundos na frente do Ford Escort Cosworth de François Delecour. O francês deu o máximo, mas teve problemas com os amortecedores do seu carro, ao mesmo tempo que Sainz apanhava um valente susto: “Atravessou-se um gato preto à nossa frente e um quilómetro depois o carro desligou-se!

Voltou a funcionar dez segundos depois, mas o Luis não conseguia ler as notas. Fomos com o coração nas mãos até ao fim do troço, só que o Delecour também tinha tido problemas”, disse Sainz, que terminou a prova com um avanço de 2m25s.

2002/2006: O príncipe do Mónaco

Sébastien Loeb tem um recorde de seis vitórias no Rali de Monte Carlo, mas a verdade é que ele foi o grande protagonista em todas as oito edições que realizou da prova monegasca entre 2002 e 2012, excetuando, claro os anos do IRC. Em 2002, o piloto francês chegou ao final do rali como o mais rápido, só que foi posteriormente penalizado por assistência ilegal, acabando por ser Tommi Makkinen (Subaru) a averbar o seu quarto triunfo consecutivo, com o então jovem francês a ver-se privado daquela que seria a sua primeira vitória no WRC. Em 2006, o vencedor foi Marcus Gronholm, com Loeb entre o pior e o melhor. Despistou-se na última especial do primeiro dia de prova, regressou em ‘Super Rally’ e foi ainda terminar em segundo, a 1m01,8s de Marcus Gronholm (Ford Focus WRC) numa prestação absolutamente fabulosa. Uma placa de gelo e uma troca de pneus traiçoeiras, impediram Loeb de por os pés um degrau mais acma no pódio, o que muito bem poderia ter acontecido em todos os Rali de Monte Carlo após 2002 em que participou.

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