Ayrton Senna, 30 anos: Porsche 956, chegou, viu e deixou marca inesquecível
15 de julho de 1984. Dia dos 1000 Km de Nürburgring, prova válida para o Mundial de Sport-Protótipos. Ayrton Senna queria ficar a conhecer a pista onde, meses mais tarde, iria disputar o GP da Europa de F1. Sem testes previstos ali com a Toleman, pediu ao seu amigo Domingos Piedade, então diretor desportivo da equipa Jöest para o ajudar a encontrar um carro competitivo para aquela prova. Domingos nem hesitou: correu para o dono da equipa, Reinhold Jöst e disse-lhe que tinha ali um novo brasileiro disponível para correr num dos Porsche 956.
“Outro brasileiro? Quanto paga?” – perguntou o alemão. “Não paga e nem o quer fazer. Mas se te indico um novo piloto, é porque ele é bom e podes confiar em mim.” E pronto: ficou logo decidido que Senna iria dividir com Henri Pescarolo e Stefan Johansson o chassis 104, com o número 7 e pintado com amarelo-negro-branco da marca francesa de “jeans” New Man.
No dia da prova, chovia torrencialmente e, nessas condições, Senna detinha a volta mais rápida, mas o carro atrasou-se com problemas diversos e acabou classificado em 8º lugar. Nessa altura, Senna já lá não estava – mal terminou o seu turno, voou para Inglaterra. Mesmo assim, deixou a sua marca: com um carro que nunca tinha guiado antes, “foi exuberante”, conforme disse depois Piedade: “Nas 65 voltas em que pilotou
o carro, foi simplesmente o mais rápido em pista, batendo senhores como [Stefan] Bellof, [Jacky] Ickx, [Jochen] Mass, [Derek] Bell, [Henri] Pescarolo, [Manfred] Winkelhock, [Thierry] Boutsen, [Riccardo] Patrese ou [Bob] Wollek”, que tinham mais de 10 mil quilómetros ao volante do 956. E foi o próprio Wollek quem, ainda estupefato afirmou:
“Quando ele chegou à pista, nem sequer sabíamos quem era. Nunca dele tínhamos ouvido falar. Mas, vendo-o adaptar-se imediatamente a um carro tão pesado, tão difícil de pilotar e de levar ao limite, depressa percebemos que estávamos perante alguém que iria ser muito famoso.”
Até Reinhold Jöest não queria acreditar no que estava a ver, ao olhar para a análise completa e detalhada que Senna lhe deu sobre o comportamento do carro, os seus defeitos e o que era preciso fazer para os corrigir. Chamou de parte Domingos Piedade e disse-lhe: “Este Senna, temos que lhe dar já um contrato, para o pormos a correr neste campeonato [de Protótipos] e na América [no IMSA].” Impávido, o português replicou: “Mas tu não percebes? Nos Protótipos, Senna correu esta vez e nunca mais vai voltar!” E não voltou…
Hélio Rodrigues, In Memoriam