Anedotas da Fórmula 1: Rir é o melhor remédio

Por a 9 Junho 2024 12:10

A F1 é supostamente um campeonato sério, de gente séria. Na verdade, é mesmo suposto ser o campeonato mais sério do Mundo. Não é à F1 que chamam o topo do desporto automóvel?

Pois bem: desde 1950, a F1 foi palco de muitas ‘estórias’. Muitas delas verdadeiras anedotas. Desde cenas de pugilato, a ‘bâmbis’ que atravessam a pista e… de tudo um pouco sucedeu, para ‘colorir’ ainda mais o ambiente que lá se vive. E que, já de si, é tudo menos cinzento – a exceção, se calhar, será nestes últimos anos, em que uns tais carros…. prateados estão a dominar todos os outros, sem que esses outros consigam reagir.

Mas estas são outras… histórias.

Agora, as ‘estórias’, essas, ainda conseguem oferecer um ar da sua graça, ou de mistério, ou se calhar de loucura saudável, a uma F1 hoje cada vez mais desumana e tecnológica. O que, neste último caso, não vem nenhum mal ao mundo – afinal, não é também a F1 o topo dos topos, em termos de

pesquisa técnica? Bom, mas regressemos às ditas cujas ‘estórias’. Nelas, os principais intervenientes foram os pilotos. Ou melhor, um determinado tipo

de pilotos, género “hoje ninguém se lembra que existiram.” Antes de começarmos a contar essas anedotas, vamos a uma adivinha: sabe que houve um piloto de F1 que foi desclassificado por ser… muito lento? Assim de repente, lembra-se do nome dele?

Philippe Alliot o perfeito idiota

Philippe Alliot esteve na F1 por duas vezes: entre 1984 e 1990 e em 1993/1994. Fez 110 GP e correu em equipas como a RAM, a Lola, a Larrousse, a Ligier e, num único GP, com a McLaren. Fez sete pontos e o seu melhor resultado foi um 5º lugar em San Marino, no ano de 1993. Mas isto pouco interessa para a nossa “estória”. Charmoso e amigo, fora do carro, mal punha um pé lá dentro tornava-se dinamite pura. Em especial, no início da sua carreira, quando granjeou a reputação de ser um especialista a bloquear os… comandantes dos GP.

A sua teimosia em sair da frente era tal, que James Hunt, então comentador da F1 para a BBC, não tinha problemas de lhe chamar um “bloody idiot”. O seu caso mais interessante aconteceu no Estoril, em 1990. Ao volante de um Ligier, Alliott teimou em não sair da frente de Nigel Mansell, que era o líder da corrida, com um Ferrari. De tal forma que o britânico perdeu as estibeiras e, com um toque magistral, atirou-o em pião, a alta velocidade, contra os “rails” de proteção. Alliot teve muita sorte em sair ileso, mas não se livrou dos insultos de toda a gente. Com Hunt no pelotão da frente, é claro!

Al Pease o caracol da História

O nome Al Pease, de seu nome de batismo Victor, pouco ou nada dirá aos indefetíveis de automobilismo. Talvez mesmo só a alguns canadianos – apesar dele ter nascido em Inglaterra e passado as últimas décadas da sua vida nos “States”. Morreu há algumas semanas, aos 92 anos e o seu nome consta no anedotário da F1 – foi o único a ser mandado parar por ser tão lento em pista que era um perigo para os outros pilotos. Aconteceu no GP do Canadá, em 1969. Pease tinha então 47 anos e, para essa corrida em Mosport, alugou um Lola/Chevrolet, com o qual se qualificou, mas a 11s de Jacky Ickx, que fez a “pole”. Na corrida, Pease revelou-se tão lento e desajeitado, que isso começou a causar danos no pelotão: Silvio Moser assustou-se com uma travagem sua e acertou no muro; fechou a porta a Jean-Pierre Beltoise e danificou-lhe o Matra. Mas o pior foi quando decidiu resistir a Jackie Stewart que, no outro Matra, liderava a corrida. E, depois de quase atirar para fora de pista o escocês, Ken Tyrrell, dono da equipa, foi a correr até à direção da prova, a pedir que alguém tirasse da pista Al Pease, antes que provocasse uma tragédia. Foi então mostrada a bandeira preta, que colocou um ponto final na sua trajetória na F1 – e o atirou para o anedotário.

O seu percurso na F1 foi de três GP – e sempre no “seu” GP caseiro. Com o patrocínio da Castrol, alugou em 1967 um Eagle e, na sua prova de estreia passou parte do tempo a andar a pé, até às boxes, para ir buscar uma bateria, voltar ao carro e colocá-la, para regressar à pista. Terminou a 45 voltas do vencedor e, claro está, não se classificou – a sua média foi de 69 km/h! No ano seguinte, nem sequer se qualificou, o que zangou o seu mecenas que lhe retirou o aio. O resto… bom, o resto é “estória”.

Ben Pon, o atirador olímpico

Ben Pon, holandês, foi um dos poucos pilotos de F1 que tomou parte nos Jogos Olímpicos. Em 1972, fez parte da equipa de tiro nos Jogos de Munique. Mas, cerca de dez anos antes disso, entrou para a história da F1 – e pelos piores motivos. Nessa altura, tinha 26 anos e era um dos lendários pilotos da Porsche, conquistando inúmeras vitórias na classe em oito anos nos Sport Protótipos. Ben Pon – cujo nome próprio era Bernardus Marinus – era filho de um conhecido empresário do ramo automóvel, com o mesmo nome e que foi um dos primeiros a vender VW fora da Alemanha.

Desde 1957, aos 21 anos, que estava na cena dos GP de F1, com a sua própria equipa, a Ecurie Maarsbergen, o nome da sua vila natal. Desde 1961, corria com um Porsche 718 F4 com motor 1.5. Mas nunca tentou correr num GP, até ao da Holanda, de 1962, prova para a qual a sua equipa inscreveu um segundo Porsche, o novo 787 F4.

Ben Pon decidiu então ser ele mesmo a correr com o carro, acreditando que a forma desse carro, que era parecido com os de Sport a que estava habituado, seria uma vantagem.

Nessa altura, os motores pequenos, como o ‘4 cilindros’ dos Porsche, nada podiam fazer contra os poderosos V8. O Porsche mais velho da equipa era, como habitualmente, pilotado pelo exuberante conde Carol Godin de Beaufort. Nos treinos este foi 14º e Pon, 18º, a 8,4s do Lola/Climax de John Surtees, que estava na “pole” e mais lento 3,8s que Beaufort. Na corrida, depressa os dois amigos holandeses se entregaram a uma luta veemente e exuberante, pelo 17º lugar. Até que, na 3ª volta, Pon perdeu o controlo do Porsche no pior sítio possível, capotando no campo a alta velocidade e sendo cuspido do carro. Beaufort acreditou que ele tinha morrido, até o ver aparecer no final da prova, coxeando mas sem um arranhão. Ben Pon nunca mais correu em monolugares, ainda por cima quando percebeu que poderia ter acabado num meritório 7º lugar – atrás de Beaufort, que foi 6º conquistando aí o seu primeiro ponto na F1. Este acabou por morrer num acidente, em Nürburgring, nos treinos para o GP da Alemanha, dois anos mais tarde, ainda e sempre com o velho Porsche 718 F4 da Ecurie Maarsbergen. Foi o fim da equipa e da presença de Pon na F1.

Ricardo Londoño Bridges: o indesejado atrevido

Ricardo Londoño Bridges era colombiano e tinha um sonho: chegar à F1. Mas não era lá muito talentoso. A sua primeira experiência com um F1 foi numa corrida do campeonato Aurora, com um velho Lotus 78, que fora usado uma vez por Mario Andretti e Gunnar Nilsson e desde então, tinha sobrevivido a um par de acidentes feios, com Gianfranco Brancatelli e Desiré Wilson. Londoño teve, é claro, mais um acidente com o carro e foi 11 segundos mais lento que o ‘poleman’ Emilio de Villota mas, na corrida, acabou em 7º após um cerrado duelo com Kim Mather, que então andava na F1.

Esta passou a ser a sua experiência internacional. Em 1980 com problemas de dinheiro, a Ensign decidiu procurar um piloto para substituir Clay Regazzoni. Encontrou então Colin Bennett, que era o dono do tal Lotus 78, que lhe falou num ‘jovem muito promissor’. E claro, com dinheiro – do Café Colômbia e da Pasta Dória. Londoño era um sujeito chamativo, nervoso – mas tinha um problema: não havia forma de a FIA lhe poder dar a superlicença, pois não tinha palmarés para isso. Por isso, falhou a primeira prova da temporada, em Long Beach, sendo substituído por Marc Surer. Então veio o Brasil e a Ensign inscreveu-o na prova, mesmo sem o papelinho mágico. Londoño fez dez voltas nos treinos, com um Ensign NM180B e a sua melhor volta foi em 1m41,77s, cerca de 4s mais lento que Carlos Reutemann. Mas, mesmo assim, mais rápido que Nelson Piquet, René Arnoux, Derek Daly, Bruno Giacomelli e Jean-Pierre Jabouille. O seu estilo era vistoso, agressivo e não queria saber para nada da presença de ouros carros em pista. Para raiva de muita gente – até que Keke Rosberg se chateou a sério e lhe fez um violento ‘brake test’. Surpreendido, o bom do Ricardo não evitou uma forte cacetada na traseira do Fittipaldi do finlandês, afastando de imediato qualquer hipótese de receber o aval da FIA. Mas, como a sua inscrição não foi retirada pela Ensign, Ricardo Londoño tornou-se o primeiro colombiano a conduzir na F1. Foi assassinado em 2009, com 59 anos, num tiroteio à maneira do ‘far west’, em que morreram outros dois homens.

Sabia que…

Paolo Barilla era o herdeiro das massas Barilla, quando entrou para a F1. E que, além dele, outros pilotos têm o seu nome ligado a produtos que nada têm a ver com automóveis, como Nanni Galli, cuja família está ligada à moda. E que, depois da sair da F1 Alessandro Nannini lançou a marca de cafés com o seu nome?

John Surtees garantiu, para 1976, o patrocínio da Durex, empresa que fabricava preservativos, salvando a sua equipa, que já estava há mais de uma época sem dinheiro e nesse ano se chamou Durex Team Surtees. Com um TS 19 com o nome Durex bem em evidência, Alan Jones foi 7º no CM, com 15 pontos.

Helmuth Marko perdeu o olho esquerdo ao ser atingido por uma pedra, lançada pelo Lotus de Emerson Fittipaldi, durante o GP de França, em Clermont-Ferrand, no ano de 1972. A pedra acertou-lhe no olho porque usava um capacete aberto e não integral que foram proibidos na F1 a partir de então. Marko nunca mais correu.

Harald Ertl fez 19 GP, de forma esporádica, entre 1975 e 1980, sem nunca pontuar. Mas não foi isso que o tornou conhecido, mas sim o seu enorme bigode tirolês, de pontas elegantemente retorcidas. Morreu em 1982, na queda de um pequeno avião, aos 33 anos.

Bertrand Gachot passou dois meses numa prisão inglesa, depois de ter atacado um taxista londrino com um “spray” tóxico, durante uma altercação no trânsito, em 1991, dias depois de ter assinado a volta mais rápida, no GP da Hungria, com um Jordan. Despedido pelo irlandês, este contratou Michael Schumacher, que se estreou na Bélgica na F1.

Alex Dias Ribeiro foi um medíocre piloto de F1 brasileiro. Na F3 chamavam-lhe “O Terror” mas, na F1, aquilo que o destacou foi a inscrição nas laterais do seu March: “Jesus Saves” que, no capacete, traduziu para “Cristo Salva Alex”. Hoje dirige a organização Atletas de Cristo.

Gregor Foitek, ainda na F3000, provocou um acidente em que atirou contra as barreiras Johnny Herbert. Foi em 1988, em Donington e Herbert ficou com os pés e as pernas quebradas de tal forma que quase acabou com a sua carreira. Mas Foitek era tão mau e brigão, não hesitando em atirar para fora os outros pilotos que, quando chegou à F1, encontrou um Clube dos Inimigos do Foitek, que queriam a todo o custo impedi-lo de correr.

René Arnoux era um rapaz que gostava de tomar uns certos, digamos, estimulantes. O seu ar ‘esgazeado’ dizia tudo. Quando, em 1982, seguiu em frente na Curva Tarzan, em Zandvoort , o seu Renault bateu nos pneus e levantou voo, terminando em cima deles, meio desfeito. Sid Watkins, que era nessa altura o médico da F1, quando lá chegou encontrou o bom do Arnoux impávido e sereno, totalmente imóvel, a olhar fixamente em frente, para o céu. Assustado, Watkins perguntou-lhe se estava bem e ele disse que sim, mas não se mexeu. E só quando o médico perdeu a paciência e, farto de esperar que ele saísse do “cockpit”, lhe deu um berro aos ouvidos, é que Arnoux decidiu fazer alguma coisa, descendo calmamente dos destroços do carro.

Em 1957, Bernie Ecclstone comprou dois Connaught à extinta equipa de F1 com o mesmo nome e pô-los a correr na temporada F1 seguinte. NO GP do Mónaco de 1958, os seus dois pilotos – Paul Emery e Bruce Kessler – não estavam a conseguir tempos para se qualificarem. Irritado, Ecclestone decidiu mostrar como se fazia: sentou-se ele mesmo ao volante do Connaught e foi para a pista. Mas fez ainda pior… e nunca mais voltou a entrar num F1. Hoje, não

nega o sucedido, mas garante que aquela não foi “uma tentativa séria” de se qualificar para a corrida!

Na F1 não houve só o chapéu de Hans Heyer ou o boné de Niki Lauda. Talvez o mais conhecido seja o chapéu “à cowboy” de Arturo Merzario, que o “decorou” de acordo com quem lhe pagava melhor. De tal forma, que essa é ainda hoje a sua imagem e marca…

Andrea Montermini pregou um susto de… morte a toda a gente, quando, nos treinos para o GP de Espanha, se despistou em plena reta da meta de Barcelona e o seu Simtek (onde estava a substituir Ratzenberger) acertou mesmo na esquina da abertura de passagem para as boxes, que havia no muro. O italiano, que fazia a sua primeira prova de F1, magoou-se a sério nos pés e ficou desmaiado dentro do carro. Mas não havia nada de grave, a não ser que ele estava com mais de 40º de febre e que foi por isso que ele teve o acidente. Só que, poucas semanas depois das mortes de Ratzenberger e de Senna e poucos dias depois dos acidentes de Wendlinger, no Mónaco e de Lamy, nuns treinos em Silverstone, todos pensaram que Montermini tinha mesmo morrido no local.

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