F1, Notas AutoSport: Ferrari forte em pista e no desperdício
Pensar em F1 é pensar também na Ferrari. A marca italiana esteve presente desde o início da história do desporto e tem no seu currículo 961 GP, 233 vitórias, 218 poles, 742 pódios. São números que dizem bem da força e da mística da Scuderia, que já passou por altos e baixos. 2017 marcou o regresso à luta pelo título algo que não acontece desde 2008. Os anos que coincidiram com o “reinado” de Fernando Alonso foram de muita luta, mas pouco sucesso, com os carros vermelhos a não terem a capacidade de acompanhar os concorrentes e apenas o talento de Alonso permitiu que essa diferença fosse mitigada. A chegada da era turbo-híbrida coincidiu com uma das fases menos positivas dos últimos tempos, que levou à saída de Alonso, substituído por Sebastian Vettel. Curiosamente, desde a sua chegada a equipa tem vindo a crescer gradualmente, embora 2016 tenha sido um ano menos bom. Vettel afirmou que essa época serviria de base para os sucessos do futuro e 2017 confirmou-o, com uma Ferrari competitiva e capaz de destronar a Mercedes. Os vários erros da Scuderia no final da época ditaram o desfecho vitorioso para a Mercedes, mas ficou a ideia que a Ferrari tinha mostrado capacidade de levar a luta até ao fim e que perdeu o campeonato por culpa própria.
Em 2018 a Ferrari surgiu ainda mais forte, com um chassis aprimorado e uma unidade motriz que vai sendo cada vez mais potente para espanto de muitos. A evolução foi tal que o domínio da Mercedes foi dado como terminado e agora são os monolugares de Maranello os melhores do grid. Isso poderia significar que a Ferrari estaria nesta fase na liderança do campeonato, mas os erros continuaram a aparecer e a Ferrari está em segundo, muito perto da Mercedes, mas ainda assim atrás dos germânicos.
O filme até agora:
Mais uma vez Melbourne foi palco de uma vitória da Ferrari e mais uma vez graças a uma excelente jogada nas boxes. O primeiro stint de Vettel foi fraco e depois da entrada nas boxes de Raikkonen e Hamilton, não conseguiu encurtar distâncias. Assim, o alemão ficou mais tempo com os primeiros pneus e pagou para ver o que acontecia. Compensou e o VSC, aliado à distracção da Mercedes, permitiu que Seb saísse na frente. Depois de passar para a frente… Vettel fez o que sabe melhor. Gerir a corrida e não permitir que o segundo o incomode em demasia. Uma boa corrida do alemão com alguma sorte à mistura. Kimi começou a época mais maldisposto que o normal. Há uma comunicação com o engenheiro de pista em que ele lhe pede para não o lixar (com “F”) pois minutos antes tinha lhe dito para gerir o andamento e depois pediu-lhe para puxar. Kimi deve ter sentido em demasia que estava a ser o número dois e exprimiu o seu desagrado… à sua maneira. No primeiro stint esteve muito bem, mas no segundo baixou, talvez já desapontado com o desfecho.
A qualificação no Bahrein deu motivos para sorrisos na box da Scuderia. A pole de Vettel no fim de semana do seu 200º GP já era motivo de festejo até porque o melhor Mercedes estava em terceiro (Bottas) e Hamilton iria cair mais posições devido a uma penalização. Mas o melhor estava reservado para domingo. Vettel fez daquelas exibições que aborreceram muita gente, mas que lhe valeram quatro títulos mundiais. Largou melhor e manteve-se na frente. Desta vez lutou sozinho pois Raikkonen ficou fora de prova devido ao problema na paragem que lesionou o mecânico da Scuderia. Mas o destaque tem de ir todo para Vettel e para a forma como conseguiu fazer durar os pneus macios além da janela dada pela Pirelli, que era de aproximadamente 25 voltas e na realidade duraram quase 40. Não se atrapalhou quando viu Bottas chegar-se nas últimas voltas e manteve o sangue frio. Uma vitória justa, e conquistada com muita classe.
Se até aqui tinha sido mais forte no plano estratégico, na China, a Ferrari não esteve ao nível das corridas anteriores. A estratégia de Vettel não foi má e a decisão de o trazer para as boxes foi tomada no momento certo. Mas uma sucessão de pequenos erros e um pit stop mais cauteloso deixou Vettel na segunda posição. A Ferrari deixou Kimi na frente da corrida com o intuito de servir de travão a Bottas e assim permitir a Vettel a reaproximação. Uma decisão que colocou Kimi no papel de nº2 mais uma vez. Ficou claramente com a pior estratégia, mas um Safety Car mudou o paradigma da corrida e permitiu ao finlandês trocar de pneus e assim alcançar um terceiro lugar. Vettel por seu lado sofreu de um “Max Attack” que resultou numa queda até ao oitavo posto.
No Azerbaijão vimos os primeiros pontos desperdiçados da Ferrari. Vettel falhou a travagem no recomeço após o segundo Safety Car. O ataque que fez a Bottas teve tanto de inesperado como de arriscado, e acabou por perder a vaga no pódio. Não se pode dizer que tenha feito uma má corrida até ao momento em que fez a sua paragem nas boxes e colocou os macios. A partir daí não conseguiu encurtar o intervalo para Bottas. O incidente entre os Red Bull deixou-o mais perto do finlandês e Vettel tentou arriscar tudo no recomeço, considerando que não teria outra hipótese de passar o piloto Mercedes. Falhou completamente. Kimi Raikkonen viu a sua corrida ficar comprometida desde cedo com o toque com Ocon. Fez uma recuperação interessante, mas nunca conseguiu alcançar os Red Bull que se fartaram de perder tempo na luta entre ambos. Mais uma vez os Safety Car e os incidentes permitiram que o Iceman voltasse ao pódio.
No fim de semana em Barcelona apresentaram melhorias interessante, mas chegaram ao final do dia de domingo com a clara sensação que podiam ter feito mais. Uma corrida onde a estratégia não resultou, com a chamada às boxes de Vettel durante o VSC a correr mal, o que fez o alemão perder muito tempo. O carro esteve parado 5 segundos (muito tempo). O alemão fez o que pôde mas não teve a ajuda das boxes que precisava. Kimi também teve um fim de semana mau, com problemas nos dois motores que usou, um dos quais ditou o abandono na corrida. Kimi estava a mostrar o bom andamento que tem evidenciado ultimamente, mas ficou apeado ainda antes do meio da prova.
A Scuderia foi a única a tentar questionar o domínio dos Bull´s no Mónaco. Em qualificação, chegaram até mostrar mais do que se esperava e deixaram algumas interrogações no ar quanto ao detentor da pole, mas sem materializar a ameaça, e em corrida, Vettel jogou com a paciência, sabendo que Ricciardo estava com problemas. Guardou alguma vida nos seus pneus para o final da prova, mas quando começava o ataque final, o Virtual Safety Car estragou-lhe os planos. No recomeço da corrida, não teve confiança para atacar e deixou escapar Ricciardo. Não foi uma prestação sublime, mas foi o suficiente para encurtar ligeiramente a distância na tabela classificativa para Hamilton. Kimi Raikkonen teve uma corrida algo solitária, sem grandes motivos de registo, mas com um positivo quarto posto.
A Ferrari chegou ao Canadá com uma ligeira vantagem para a concorrência com melhorias no seu motor. Vettel foi o mais forte na qualificação (Bottas ficou apenas a 0.093 seg.), mas na corrida fez o costume quando fica com o primeiro lugar… geriu de forma perfeita os acontecimentos e apresentou um ritmo mais forte que os restantes. Nunca chegou a ser incomodado pela concorrência e foi o justo vencedor. Raikkonen, por seu lado, parecia estar a fazer uma corrida sólida, mas no final acabou por ficar longe do seu colega de equipa. Acabou em sexto, tentando uma estratégia algo diferente, mas a paragem nas boxes não correu da melhor forma e não conseguiu passar Hamilton. A partir daí não teve mais argumentos para incomodar o campeão britânico. Ficou no ar a ideia que poderia ter dado um pouco mais.
Em França assistimos ao segundo desperdício de Vettel. Um candidato tem de evitar este tipo de erros (travagem falhada na primeira curva). Vettel estragou uma possível luta pela vitória, algo que tem vindo a acontecer com uma frequência pouco comum no campeão germânico. Comprometeu a corrida e a liderança do campeonato. Kimi não desperdiçou as oportunidades e aproveitou os azares alheios para subir ao pódio.
A dupla desistência da Mercedes na Áustria foi um doce inesperado para a Scuderia. Kimi foi um dos destaques, com uma excelente largada, manteve-se sempre perto da luta pelo pódio e foi o piloto que melhor conseguiu gerir as borrachas. Um dos melhores fins de semana do finlandês dos últimos tempos. Para Vettel foi novamente uma corrida de recuperação, depois da penalização por atrapalhar Sainz na qualificação. Evidenciou o superior andamento do Ferrari e beneficiou da boa estratégia delineada para galgar posições. Se lhe dissessem antes do arranque que ia terminar em terceiro, talvez tivesse sorrido com a ideia, mas Vettel conseguiu um improvável pódio.
O fim de semana seguinte de Vettel não foi nada fácil, tendo em conta que estava em “território de Hamilton” e teve de lidar com uma lesão inesperada no pescoço, que podia ter condicionado ainda mais a sua prestação, mas chegou ao fim com o muito apetecido troféu. A prestação do alemão em Silverstone foi excelente e aproveitou a boa largada para se colocar em situação privilegiada. Nos Safety Car a Ferrari apostou forte e arriscou na troca de pneus, uma estratégia que se revelou acertada, como seu viu pelo ataque que fez a Bottas, que não teve resposta por parte do finlandês. Vitória justa, merecida e fundamental na corrida para o título. Raikkonen esteve também muito bem e não fosse aquele erro com Hamilton (toque na primeira volta), poderia ter conseguido algo mais. Admitiu o erro, cumpriu a penalização e recuperou até ao terceiro lugar, com o alto patrocínio da estratégia Ferrari. Fez provavelmente uma das melhores exibições do ano, lutou muito e subiu ao pódio pela sexta vez em 2018.
A Alemanha voltou a colocar a nu algumas fragilidades da Ferrari e de Vettel. O fim de semana tinha tudo para ser memorável e, mais que isso, podiam ter dado um golpe tremendo na Mercedes. Na qualificação o seu poderio ficou claro e parecia que a vitória de Vettel carecia apenas de confirmação. E o início da corrida foi também auspicioso, com Vettel a fazer aquilo que sabe fazer muito bem… liderar e gerir tudo ao pormenor. Tudo estava preparado para a festa até aquele erro na curva Sachs que transfigurou a corrida (saída de pista com piso molhado). Um tetra-campeão e candidato ao título, não pode cometer um erro destes. Mas a facilidade com estes erros podem surgir prova que a F1 é verdadeiramente exigente. Já Raikkonen voltou ao pódio pela sétima vez este ano. Foi colocado numa posição difícil a nível estratégico, sendo o primeiro a parar para colocar macios, que teve de fazer durar grande parte da corrida. Foi obrigado a deixar passar Vettel, mas exigiu que lhe dissessem com todas as letras, para que ficasse claro.
No início do fim de semana da Hungria, parecia que a batalha pela vitória seria entre a Ferrari e a Red Bull, mas a chuva no sábado trocou as voltas à Scuderia, que não conseguiu responder ao andamento dos Mercedes em piso molhado. Vettel arrancou muito bem e conseguiu passar Kimi por fora na curva 2 e ainda ameaçou Bottas. Quando foi obrigado a aumentar o ritmo, cometeu alguns erros menores que custaram algum tempo e não teve a sorte do seu lado quando a paragem nas boxes mais demorada o colocou atrás de Bottas. Vettel parecia resignado com o segundo posto e afirmou que não esperava mais desta corrida. Já Kimi usou uma estratégia alternativa que resultou e mais uma vez mostrou um ritmo sólido e subiu ao pódio. Duas paragens menos conseguidas por parte da Ferrari influenciaram o desenrolar da corrida.
Os fantasmas de 2017 começam a pairar sobre a Ferrari. Têm o melhor carro da grelha, o melhor motor, uma dupla ultra-experiente, uma equipa também ela muito experiente e ainda assim não tem conseguido capitalizar todo este potencial. Os erros nas boxes têm-se sucedido e é um problema que já tem causado alguns dissabores. As estratégias usadas têm estado tendencialmente certas, o que é também uma melhoria em relação ao passado. O ritmo de implementação de melhorias é fantástico e as soluções encontradas engenhosas (de tal forma que ainda provocam alguns pontos de interrogação na concorrência). A Ferrari tem tudo para conquistar o título este ano. Claro que a concorrência é forte mas, finalmente, depois de tanto esforço da estrutura, estão numa posição privilegiada como há muito não se via. Este ano não são os “underdogs” mas sim os favoritos. Mas precisam rectificar os erros e não desperdiçar as oportunidades, pois a Mercedes raramente falha.
Vettel Vs Raikkonen
Vettel é por vezes subestimado e se isso acontece a culpa também é dele. O talento do alemão é inquestionável e a capacidade de trabalho fora de pista é também louvável. A Ferrari cresceu muito desde a sua entrada. Mas este ano já cometeu pelo menos três erros graves que custaram pontos preciosos. Azerbaijão, França e principalmente Alemanha. Serão à volta de 40 pontos que desapareceram e que nesta altura fariam toda a diferença. Desde o ano passado que está com um andamento forte, mas tem cometido erros pouco recomendáveis a um candidato. Ainda tem tempo para recuperar, mas não poderá ter mais nenhum deslize. Raikkonen por seu lado tem estado bem, talvez a melhor época desde que regressou à Ferrari em 2014. Não tem mostrado o mesmo andamento de Vettel, mas tem feito o suficiente para ser presença regular no pódio e dar à equipa os pontos necessários. A vitória teima e não aparecer. Em qualificação o alemão domina 9-3 e em corrida o resultado é 7-5 a favor de Vettel. Kimi tem duas desistências sem culpas e Vettel tem uma, por culpa própria.
O que esperar da segunda metade da época?
A Ferrari não vai tirar o pé do acelerador. O ritmo de desenvolvimento irá manter-se até porque a equipa também sente que pode finalmente vencer. Era preciso que o trabalho na boxe fosse rectificado, pois de resto a Ferrari tem-se apresentado com um nível excelente. Vettel terá de colocar toda a sua experiência e talento em jogo e terá de aguentar a pressão de não poder voltar a errar. Kimi está bem e recomenda-se. Em corrida tem estado muito bem e continuará a ajudar a Ferrari e Vettel, que não podia querer melhor “wingman”. Era bom que o Iceman voltasse a vencer antes de dizer adeus à competição, caso a Ferrari não renove com ele.
Notas meio da época
Sebastian Vettel: 9
Kimi Raikkonen: Nota 8
Ferrari: Nota 9
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