WRC, Rali de Monte Carlo 1998: Adruzilo Lopes entre as feras Panizzi e Delecour

Por a 17 Janeiro 2024 11:20

Entre as centenas de ralis que disputou ao longo da sua carreira, nenhum marcou tanto Adruzilo Lopes como o Monte Carlo de 1998, disputado com o Peugeot 306 Maxi oficial. À semelhança de muitos outros, Adruzilo não tem dúvidas: “É o rali mais difícil do mundo. Só participei uma vez em Monte Carlo mas trouxe ‘milhões’ de coisas para contar.” A primeira foi o facto de ter integrado a equipa oficial da Peugeot, liderada por Jean-Pierre Nicholas e que inscrevia na altura os espetaculares 306 Maxi.Como pilotos oficiais, a dupla francesa Gilles Panizzi e François Delecour, que já aí protagonizava uma intensa e visceral rivalidade que Adruzilo pôde acompanhar na ‘primeira fila’. “Aquilo chegava mesmo a ‘chispar’”, conta o piloto de Regilde. “Nesse ano a FIA acabou com os reconhecimentos livres e introduziu três passagens antes de cada troço. Só que o Delecour soube que o Panizzi fazia reconhecimentos ilegais… e o Panizzi acusava-o do mesmo. Nós ficávamos todos no mesmo hotel mas depois de saber aquilo, o Delecour, com o feitio que todos conhecemos, tornou-se insuportável.” As coisas haveriam mesmo de extremar-se dois anos depois, no Rali de San Remo, quando Delecour foi filmado de cabeça perdida a interromper uma reunião entre Nicolas e Panizzi, com o patrão da Peugeot a pedir-lhe para sair dali e Delecour mais tarde a desfazer-se em lágrimas na TV por ser alegadamente preterido face ao compatriota.

“Mas Monte Carlo é realmente incrível pelas mudanças no estado do piso durante o mesmo rali, até durante o mesmo troço”, conta Adruzilo. “Com apenas três passagens nos reconhecimentos – quando as conseguíamos fazer todas! – eu estava perdido sobre as melhores escolhas de pneus. O Jean-Pierre veio ter comigo e perguntou-me que pneus eu queria. ‘Sei lá, não faço a mínima! Por mim levo os mesmos do Delecour’, respondi. Ele disse, ‘Lopes, então vamos apostar no joker. Levas pneus diferentes dos deles. Se acertarmos vais fazer um tempo-canhão, se não acertarmos vais penar como nunca penaste na vida. E foi assim que parti para o troço do Turini com pneus ‘slicks’. No início do troço, tinha de ir com calma para não derreter os pneus. A meio do traço, com gelo e neve, ia ‘parado’. Só depois de passar o Col du Turini, nos últimos 8 quilómetros, a descer, é que pude atacar. Mas era a loucura…”, conta. “Apanhava mais sustos a andar a 20 km/h sobre o gelo, com ravinas de 300 metros ali ao lado, do que a 200 km/h a fundo no asfalto seco!”.

Outro episódio para mais tarde recordar “foi quando perdi três minutos num troço onde fiz um pião. Aquilo era tão estreito que não tinha espaço para dar a volta e regressar ao sentido do troço! Devia ser algo tão normal ali que de repente vejo um miúdo a correr em direção ao carro e a gesticular para o seguirmos. Andamos para aí 100 metros em sentido contrário e o miúdo lá nos mostrou uma pequena entrada onde tínhamos espaço para dar a volta!”. Mas foi na última classificativa que Adruzilo e o navegador Luís Lisboa perceberam o valor da experiência no Monte Carlo. “Não tínhamos nem a noção de como usar os batedores. Quando estávamos parados na entrada para o último troço, numa estância de inverno, começamos a ouvir as comunicações dos batedores da Peugeot para o Delecour. Eles descreviam tudo ao detalhe, tipo ‘Naquela reta de 200 metros tens gelo a começar aos 180 metros, até podes ir a fundo, depois do gelo a travagem está boa’, e assim sucessivamente, em cada parte de cada troço. Quando ouvimos aquele nível de detalhe, eu e o Luís virámos-nos um para o outro e dissemos ‘Somos mesmo ‘patinhos’…”. Ah, e o resultado final? Um quarto lugar entre os duas rodas motrizes (Panizzi foi o primeiro na frente de Delecour e do SEAT de Rovanpera), e o 12º à geral num rali ganho pelo Toyota Corolla WRC de Carlos Sainz.

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